Articulação do Vaticano pela paz na Ucrânia fica mais fraca, e o Papa pede ajuda a Lula

Atualizado em 3 de junho de 2023 às 20:32
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Papa Francisco. Foto: Reprodução

A rede do Vaticano para facilitar aquele clima entre a Rússia e a Ucrânia necessário para chegar a um cessar-fogo, condição mínima para iniciar de segunda rodada de negociações extremamente difíceis, complexas e previsivelmente longas, com o passar dos dias quase parece perder força, como se a missão anunciada tivesse começado já num beco sem saída, apesar dos enormes esforços e da boa vontade do Papa Francisco.

De Santa Marta se está trabalhando intensamente para fortalecer a mais ampla rede diplomática colateral possível em apoio à tarefa confiada ao Cardeal Matteo Zuppi. Nesse contexto, não faltam contatos diretos com chefes de Estado considerados próximos e amigos. Há três dias o Papa teve uma breve conversa com Sergio Mattarella, antes de receber de suas mãos o prêmio Paulo VI, e ontem à noite houve um longo telefonema com o presidente brasileiro Lula, com quem abordou o tema da paz em Kiev.

Lula teria lhe repassado informações em sua posse obtidas de outros líderes durante o G7 em Pequim, recebendo a bênção de Bergoglio para se tornar um pacificador na área do BRICS, ou seja, exercendo persuasão moral com Índia, Rússia, África do Sul e China.

Afinal, Lula é um dos poucos líderes que tiveram acesso direto a Putin e por isso o Papa Bergoglio confia muito nele ainda que a posição de Lula sobre o conflito ucraniano não seja vista com bons olhos por Kiev, visto que ele considera responsável pela guerra também Zelensky (“ele queria guerra”) e não apenas o Kremlin.

Francisco nesse cenário magmático é como se estivesse pisando em ovos, tentando de mil maneiras manter uma linha de “equiproximidade” com Kiev e Moscou tanto quanto possível. Ainda que Zelensky em entrevista concedida ontem a um jornal argentino tenha dito que o Papa apoia a Ucrânia e os ucranianos.

Também ontem, na Praça São Pedro, o Papa renovou o apelo pela paz, mostrando como é possível viver como irmãos e dando o exemplo dos garotos de uma comunidade na Toscana onde convivem jovens russos e ucranianos. “Que o seu exemplo suscite em todos propósitos de paz, mesmo naqueles que têm responsabilidades políticas. E isso deve nos levar a rezar mais pela martirizada Ucrânia e a estar perto dela”.

Mais de trinta dias se passaram desde o anúncio da missão, mas nenhum passo oficial e público foi dado pelo Vaticano em relação à missão de Zuppi. Os Estados Unidos deram luz verde. “Todos os planos são bem-vindos”, disse o porta-voz para a segurança nacional dos EUA, John Kirby, em uma coletiva de imprensa. “No entanto, toda proposta deve ser considerada crível e sustentável e deve ter o apoio do presidente Volodymyr Zelensky”.

O mesmo se aplica ao chanceler italiano Tajani: “o objetivo é alcançar uma paz justa, que garanta a integridade territorial da Ucrânia”. O que, aliás, foi definitivamente reafirmado pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen: “Deve haver um princípio: nada sobre a Ucrânia sem a Ucrânia. Junto com a Ucrânia queremos uma paz justa, que não premia o agressor. Mas que apoia os princípios da Carta das Nações Unidas e o direito do povo ucraniano de ser dono de seu próprio futuro. O presidente Zelensky é muito claro sobre isso. Um cessar-fogo que resulte em um conflito congelado não trará uma paz duradoura”.

Para o cardeal Matteo Zuppi trata-se de um itinerário cada vez mais complicado e não se sabe se algum dia conseguirá alcançar o objetivo de facilitar um clima favorável à paz, mesmo que muitas figuras de destaque da Igreja Católica e da Igreja Ortodoxa Russa estejam se movendo em seu auxílio. São tentativas bem-intencionadas para sondar o terreno, entender as margens de manobra e criar consenso. Algo que não é de forma alguma garantido nesse contexto.

Publicado no Il Messaggero