“Nós não temos como controlar as pessoas que vêm aqui para quebrar tudo”.
O terceiro ato contra o aumento das tarifas de ônibus do Movimento Passe Livre terminou com um saldo de 20 detidos, barricadas, uma agência do Bradesco e uma estação de metrô depredadas e confrontos com a polícia na Estação da Sé, na Paulista e em alguns outros pontos da cidade.
O Diário acompanhou a manifestação que juntou aproximadamente 5 mil pessoas (as fotos são de autoria de Andrés Vera).
Por que terminou assim? Tem de terminar assim? É útil para a causa do Passe Livre que termine assim? “Nós não temos como controlar as pessoas que vêm aqui só para zoar e quebrar tudo”, me disse um membro do MPL que não quis se identificar. “Nossa ação tenta ser pacífica”.
A concentração na esquina da Paulista com a Consolação era relativamente tranquila na tarde feia paulistana. Em comum, todos estavam atendendo à convocação feita pelo Facebook. “Isso tudo é importante porque mostra como temos poder de mobilização. Tudo pela internet”, disse Thais Lopes, estudante de jornalismo. Os membros do MPL batucavam na Praça do Ciclista, no coração da aglomeração. Usavam camisetas pretas com o símbolo da organização e entoavam gritos de guerra como: “Ô motorista, ô cobrador, me diz aí se seu salário aumentou”; “Mãos ao alto, 3 e 20 é um assalto”.
Em torno deles, a multidão de jovens – muitos deles com lenços cobrindo o nariz e a boca. Faixas estendidas. Havia bandeiras do PSTU, PCO e Juventude Marxista. O MPL era, na verdade, a minoria.
“Nós todos queremos a mesma coisa”, disse Guilherme Kranz, morador de Higienópolis e membro da Juventude Às Ruas. Guilherme distribuía panfletos de sua agremiação. “Há notícias de que até mesmo a Abin (A CIA brasileira) tem se infiltrado e espionado nossos atos e isso num governo de uma ‘ex-combatente’ contra a ditadura”, lia-se.
O homem destacado pelo MPL para falar com a imprensa era Caio Martins. Magro, alto, óculos de aros redondos, Caio mora na Lapa com os pais. “Nós decidimos que eu falaria com vocês numa reunião à tarde. Eu me sinto mais à vontade”, disse. “O movimento é apartidário, mas nós aceitamos todos os partidos que queiram se unir à luta. Em geral, é a polícia que começa a violência”. Caio declarou enxergar uma inspiração no Ocupe e nos protestos em Istambul, na Praça Taksim. “Nós somos um movimento social. Queremos transformar a realidade”.
A passeata seguiu em direção ao centro. A chuva intensa fez com que muitos se refugiassem nas marquises de lojas da Consolação. “Há muitas coisas ruins acontecendo no Brasil. É preciso dar um basta. Gostaria de ver mais famílias aqui”, disse Isadora Lima, de 32 anos, hostess, que aproveitou o dia de folga do trabalho para protestar.
“A USP está engajada, especialmente a FFLECH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas). O transporte tem de ser gratuito”, afirmou Renato Aguilar, morador de uma república e que vai à escola com o circular da USP — o qual, aliás, é gratuito. “Eu não me conformo com essa situação. Sou do coro de maracatu da faculdade e o pessoal do Passe Livre nos convidou a participar”.
A violência teve início na Praça da Sé, com a rotina de gás lacrimogêneo contra pedradas. “Esquecemos o vinagre”, disse Júlio Witer, estudante de geografia, de olhos vermelhos após uma bomba de efeito moral. Muitos levavam lenços embebidos em vinagre para amenizar os efeitos do gás. Sacos de lixo foram usados para acender fogueiras. Mais tarde, grupos se dispersaram e confrontos esparsos prosseguiram por algumas horas. Na Bela Cintra, bexigas com tinta foram atiradas nos policiais. Uma bomba explodiu na estação Brigadeiro do metrô. Os passageiros tiveram de sair por causa da fumaça.
“Não sei se vamos nos isolar. É possível que sim”, disse o estudante Reinaldo Carvalhosa. “Mas, enquanto estivermos irritando a esquerda e a direita, estamos no caminho certo”.
As faces da manifestação: