As reações de personagens que de alguma forma rodeiam o mundo Fifa são extraordinárias.
Del Nero, presidente da CBF, deu o fora da Suíça, em meio ao congresso da Fifa que vai eleger provavelmente Blatter para mais um mandato.
Ele viu o que aconteceu com seu amigo e antecessor Marin, e achou melhor não dar chances para o azar.
Del Nero tem aparecido na mídia, nos últimos tempos, ao lado de mulheres que poderiam ser suas netas.
Para que correr o risco de trocar a companhia delas pela de presidiários, nos últimos anos que lhe restam de vida?
Notável, também, é o comportamento da Globo.
O réu confesso J. Hawilla é apresentado no noticiário das mídias escritas da empresa como “acionista” da TV TEM, uma das afiliadas da Globo.
Isso na última linha, ou nas últimas. É aquele espaço tradicional que você sabe que o leitor não vai alcançar. No jargão dos jornalistas, é o “pé” do texto. “Corta pelo pé” é uma clássica ordem dos editores quando um artigo estoura o espaço previsto.
Você pode imaginar também nos textos aquela ressalva da Reuters que virou histórica. “Podemos tirar, se achar melhor”, estava numa reportagem que tratava da Petrobras.
O repórter colocou aquilo para o editor, e a frase foi inadvertidamente publicada. Tirar, no caso, era uma afirmação de um delator segundo a qual a corrupção na Petrobras começara na gestão FHC.
Vamos colocar as coisas como são: Hawilla é dono de uma das maiores afiliadas da Globo, com imensa penetração no rico interior de São Paulo.
Segundo uma reportagem de algum tempo atrás da Exame, “a TV Tem cobre 318 cidades paulistas numa região com participação de 5,5% do PIB e 2,1 milhões de domicílios com aparelhos de televisão”.
Como afiliado, é sócio da Globo.
Hawilla, mais que tudo, é filho da Globo. Ele foi um dos principais jornalistas esportivos da casa. Chegou a ser apresentador do Globoesporte, e de lá saiu para montar seu próprio negócio.
A Globo foi uma mãe, uma inspiração, uma escola para Hawilla.
Como a Globo, Hawilla fez do futebol brasileiro uma máquina de fazer dinheiro numa relação cruelmente iníqua. Enquanto ele, como a Globo, florescia, o futebol brasileiro mergulhava na miséria conhecida de todos.
Na emissora construiu os contatos com a CBF que lhe trariam uma fortuna escusa tão imponente que ele, no acordo de leniência e delação com as autoridades americanas, devolveu quase meio bilhão de reais.
Num artigo antes do escândalo, quando era tratado como “Dono do Futebol” no Brasil, numa completa injustiça com a Globo, Hawilla afirmou o seguinte ao repórter, que tocou nas controvérsias que cercam seu nome.
“Mesmo que você trabalhe honestamente, com transparência e dignidade, como sempre foi feito aqui, falam de você. Uma meia dúzia de jornalistas esportivos. Acho que é mais inveja e rancor.”
Para usar a expressão de Hawilla, no Brasil falam de você, mas não fazem nada. Quer dizer, a imprensa, a polícia e a justiça tratam pessoas como ele – e Marin, e Ricardo Teixeira, e os Marinhos — como se fossem intocáveis.
Por que Moro, para ficar num caso, não investigou Marin, se queria combater verdadeiramente a corrupção?
As coisas, para os intocáveis, se complicam apenas quando entram em cena coisas sobre as quais não têm domínio.
Por exemplo: a polícia e a justiça dos Estados Unidos.
Com todo o seu poder avassalador no Brasil, nos Estados Unidos a Globo não manda em ninguém.
A casa só caiu para a CBF por causa dos investigadores americanos.
Se eles chegarem à Globo, acontecerá aquilo com que Brizola tanto sonhou: uma praga nacional chegará ao fim.