Até o papel dos jornais e das revistas é subsidiado com dinheiro do povo. Por Paulo Nogueira

Atualizado em 23 de outubro de 2015 às 5:51
O contribuinte banca este papel
O contribuinte banca este papel

Tive uma treta no Twitter, outro dia, com um blogueiro da Veja, Felipe Moura Brasil.

O que mais me chamou a atenção foi a ignorância dele em relação às mamatas – nada capitalistas – concedidas pelo Estado às empresas jornalísticas.

É um desconhecimento brutal que se aplica, aparentemente, aos demais jornalistas das companhias de mídia.

Felipe claramente ignorava coisas como a reserva de mercado de que gozam as empresas.

Isso as livrou da concorrência internacional, o que só foi bom para os seus donos.

E a curto prazo: porque a longo esse tipo de privilégio torna ineficientes as empresas, como crianças mimadas. Não conseguem enfrentar o mundo.

Felipe também demonstrou não ter ideia do copioso fluxo de dinheiro público que vai dar em empresas como aquela para a qual ele trabalha.

Ele acusou o DCM de viver da publicidade do governo. Pausa para dar uma gargalhada.

O DCM, segundo um levantamento feito por Fernando Rodrigues do UOL, teve cerca de 200 mil reais em publicidade em 2014.

Como definir isso se não como migalhas diante da nossa audiência? Em menos de três anos, construímos uma audiência de 3,5 milhões de visitantes únicos mensais – e os números crescem.

Em outubro, estamos já prestes a passar a marca de 10 milhões de acessos.

Nosso público é bem diferente do da mídia tradicional. Este, como você percebe nos comentários, é altamente conservador, retrógrado, preconceituoso.

Nossos leitores são arejados, tolerantes, progressistas.

O dinheiro apontado por Fernando Rodrigues mal dá para manter um site no ar. A hospedagem consome quase tudo aquilo.

Como falar em favorecimento?

Na verdade, o modelo de decisão do destino da propaganda federal beneficia espetacularmente as grandes empresas de mídia – mesmo com as audiências declinantes de todas elas.

Não vou nem falar da Globo, com seu pixuleco de 500 milhões por ano. A vontade é escrever em maiúsculas: MILHÕES.

Fico na Abril de Felipe.

Até recentemente, a Abril levava 50 milhões de reais por ano em publicidade do governo federal.

O dinheiro público jorra de outras fontes também. Um empréstimo do BNDES de quase 30 milhões de reais, poucos anos atrás, foi utilizado pela Abril para atualizar o sistema de informática de seu departamento de assinaturas.

Ora: por que não dinheiro dos Civitas ou da empresa? Não. Dinheiro do povo.

O mesmo BNDES financiou uma gráfica gigante da Globo que hoje é um elefante branco.

Num dos mais infames erros de planejamento, a Globo não viu a internet chegar. E gastou dinheiro do contribuinte, via BNDES, para ter uma gráfica que imprimisse milhões de exemplares de jornais que jamais saíram das previsões otimistas.

Felipe não sabia nada disso.

Também parecia desconhecer que o governo Alckmin compra lotes de assinaturas da Veja destinadas a alunos da rede estadual que simplesmente não as abrem.

Até o papel usado por jornais e revistas é subsidiado pelo povo. É o chamado “papel imune”. Não incorrem sobre ele as taxas habituais.

Jânio Quadros, em sua curta presidência, denunciou isso.

Num livro sobre a renúncia de Jânio, seu assessor de imprensa Carlos Castelo Branco narra um episódio revelador.

“Lembro-me da noite em que, na presença de ministros e auxiliares, [Jânio] falou à nação pela TV. Encomendara-me, uma semana antes, a organização de uma rede de emissoras que abrangesse o país inteiro, pois iria fazer uma comunicação de extrema importância. Não me disse de que se tratava e recomendou-me estrito sigilo até a véspera do discurso. Seria seu primeiro pronunciamento público desde o dia da posse.

(…)

À tarde, quando cheguei ao palácio para instalar o estúdio na Biblioteca do Alvorada, vi sobre a mesa um exemplar de O Estado de S. Paulo, de domingo. Em cima um bilhete do presidente: Não mexam neste jornal. Preciso dele.

Só soube do que se tratava quando Jânio o ergueu na mão para exibi-lo audaciosamente ao país como fruto de privilégios, o esbanjamento de papel comprado com subvenção oficial, pago, portanto, pelo povo.”

Jânio passou. Outros presidentes passaram, gordos, magros, fardados etc.

Só não passaram os indecentes, anticapitalistas privilégios dados às empresas de jornalismo — que colunistas como Felipe Moura Brasil ou ignoram ou, ardilosamente, preferem não citar.