Até quando vai durar este feriado de finados? Por Mário Rocha

Atualizado em 2 de novembro de 2018 às 18:29
Moro

Esqueça suas referências democráticas para interpretar o Brasil de hoje e de amanhã. Quem acompanhou os desmandos do juiz Sergio Moro sabe que ele não liga para esses detalhes. Detalhes do tipo STF, Constituição e “justiça cega, muda, surda”. Quem ouviu as opiniões do presidente eleito também sabe da simpatia dele pela ditadura, pela tortura, pela eliminação daqueles que ele vê como inimigos. Mas por que Moro? Porque ele vai ter super poderes no governo do ex-militar saudoso da ditadura. Moro terá poderes para perseguir inimigos e poupar aliados. Mais ou menos como na Lava-Jato, quando vazou delações e autorizou conduções coercitivas que tiveram implicação direta no processo de impeachment da Dilma, na condenação do Lula e na eleição do candidato que antes da vitória já o havia convidado para o Ministério. A corrupção e o crime só terão um lado. E isso fará dele um homem a ser temido, terrivelmente temido.

Moro comandará a Polícia Federal, o Ministério Público, o Coaf (que tem acesso às movimentações financeiras de pessoas físicas e jurídicas), da CGU (que acessa os recursos financeiros usados pelos gestores públicos). Ele terá o comando das portas das cadeias e das tropas que investigam, prendem e julgam. Ao mesmo tempo, como já vem acontecendo em vários lugares do país, o judiciário se fortalecerá, mas no mau sentido. Os juízes se sentirão empoderados para seguir o exemplo do chefe. A justiça, que já não é grande coisa no nosso país, dará lugar ao arbítrio, um arbítrio autorizado pelo super chefe. As suspeitas de que o Brasil ensaiava uma ditadura do judiciário começam a dar sinais de certeza.

O poder policial do Moro abre espaço para ameaças e chantagens a políticos, governadores, prefeitos, empresários e imprensa para que esses apoiem o governo. O empresariado brasileiro, incluindo aqueles da imprensa tradicional, não é exatamente o tipo que segue as legislações que deveria seguir com relação à Receita, aos acordos trabalhistas, à segurança no trabalho, ao pagamento de horas extras, sem falar do trabalho escravo nas grandes propriedades rurais. O mesmo vale para os congressistas, que sob chantagem e ameaça vão aprovar tudo o que o governo quiser. Alguém vai dizer que isso vai ser bom para colocar o país no trilho anti-corrupção. Esse é o discurso oficial. Esse será o marketing para enganar a população, provavelmente pelo whatsapp. A verdade é que ninguém consegue nada justo por meio de chantagem e ameaça. A verdade é que a Lava-Jato colocou muita gente na cadeia, mas poupou o notoriamente corrupto governo Temer e políticos pegos com a mão na massa, como o Aecio. Quando este era citado nas delações, o então juiz Moro dizia “não vem ao caso”. Ao aceitar o cargo de ministro, ele se comporta como um juiz de futebol que, depois da partida, vai comemorar o resultado com o time vencedor. Mas, repito, esqueça as referências éticas, democráticas, transparentes. Nada disso a partir de agora virá ao caso. As máscaras caíram e ninguém se importa.

Aí entra em cena o economista Paulo Guedes, que auxiliou a ditadura Pinochet no Chile, uma das mais sanguinárias das sanguinárias ditaduras da América Latina. Guedes, a exemplo de Moro, terá todos os poderes na sua área. Na sua cartilha de políticas econômicas neoliberais, apresentará as reformas de interesse dos banqueiros, dos ruralistas, do capital internacional (principalmente ligados aos EUA/Trump) e, com isso, contribuirá para destruir a já cambaleante indústria brasileira. Na sua cartilha está o fim do BNDES, transferindo aos bancos privados o financiamento à produção. Também pretende uma privatização generalizada de tudo o que é estatal, a começar pela maior riqueza do povo brasileiro que é o petróleo e a Petrobras, em seguida virão a água, a Caixa, o Banco do Brasil. Vai fazer reforma da previdência do jeito que o grande capital quer, sucatear o SUS em benefício dos planos de saúde e de hospitais privados, acabar com a educação pública gratuita, vender as florestas pra quem quiser explorá-las do jeito que os compradores quiserem.

Com esses dois super ministros, o papel do presidente, com o apoio da imprensa amiga e da imprensa chantageada, será o de manter a população com medo e com ódio de fantasmas como os comunistas, das esquerdas em geral, do MST, do MTST, da Venezuela, da China, do diabo católico, do diabo das religiões de origem africanas, de gays e lésbicas (“depravados”), dos negros “que não conhecem o seu lugar na sociedade”, dos ambientalistas “anti-desenvolvimentistas”, dos artistas “que vivem da Lei Rouanet”. As forças armadas serão fortalecidas e, em conjunto com as polícias estaduais e com base em legislação anti manifestação que está sendo votada no Congresso, com a força repressora de armamentos provavelmente importados dos EUA e de Israel, estarão prontas para reprimir as manifestações e as organizações sociais contrárias às “políticas patrióticas verde-amarelas do governo eleito pelo voto de 57 milhões de brasileiros com a ajuda de outros 40 milhões que lavaram as mãos”. Sem falar na criação de milícias privadas no campo e nas cidades com o fim do desarmamento. Pra encerrar… não se esqueça do que o Snowden contou pro mundo inteiro e os EUA não querem que você saiba: tudo o que você faz na internet, no whatsapp, no face, no insta, no twitter, nas suas compras com cartão… tudo está sob o olho do controle. Como agora, por exemplo. Ou você já se esqueceu de que a Dilma e a Petrobras estavam sendo grampeadas pelos EUA? Todos os jornais do Brasil e do mundo noticiaram, lembra?

Só me resta desejar que o feriado de finados seja mais curto do que ele enseja ser.

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Mário Rocha é jornalista.