Atuação de procuradores de Curitiba se assemelha ao AI-5, diz Gilmar

Atualizado em 18 de março de 2021 às 12:23

Publicado na ConJur

Gilmar e Moro

Por Tiago Angelo

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, comparou a atuação dos procuradores de Curitiba e do ex-juiz Sergio Moro com o Ato Institucional Nº 5 (AI-5), editado em 1968 e responsável por endurecer ainda mais a ditadura militar brasileira.

A declaração foi feita nesta quinta-feira (18/3) durante o debate O papel do Legislativo na produção da justiça, organizado pela TV ConJur. Também participou do evento o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).

“Se nós olharmos bem o que está acontecendo em Curitiba, poderíamos ter daqui a pouco uma ditadura desenhada por um juiz e alguns promotores. Eles até brincavam que estavam montando um ministério, a partir de métodos que lembram os militares. Vejam, por exemplo, deixar alguém preso para que ele delate. Mandar alguém para uma prisão determinada, porque lá as condições são péssimas e ele [o delator] falará mais rápido. Qualquer semelhança com a ditadura do AI-5 não é mera coincidência”, afirmou Gilmar.

Para o ministro, as conversas entre procurador e Moro, reveladas depois que o hacker Walter Delgatti Neto invadiu celulares de autoridades, mostram que a Justiça Criminal passa por uma crise.

“Estamos vivendo uma grande crise da Justiça Criminal. Todos os fatos revelados mostram isso. Todos os locais em que tivemos esses super juízes, tivemos problemas. Agora aparecem burburinhos com relação à 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro. O uso da Receita como cachorro cheirador, de forma ilegal. Tudo isso precisa ser olhado. Passamos por um processo fundamental, grande, radical, de desinstitucionalização.”

Arthur Lira também comentou a atuação dos procuradores de Curitiba e fez um retrospecto das situações que teriam engrandecido exageradamente a força dos procuradores da extinta “lava jato” do Paraná. Para ele o Congresso teve sua parte de responsabilidade a partir de 2013, quando criou leis com base no clamor popular que veio das ruas.

“Quando o congresso vota leis — principalmente leis penais — em momentos de tensão, de clamor popular, ele faz besteira. Lógico que leis anticorrupção, como a Lei de Delação, Lei de Organização Criminosa, são importantes. Mas as leis, como foram aprovadas em 2013, naquelas manifestações nas ruas, deixam lacunas, fissuras, brechas que não são fáceis de corrigir. Corrigimos [uma lacuna] muito importante em cima da jurisprudência da 2ª Turma do STF, que é a de não poder condenar só com a palavra do delator. Não se recebe denúncia só com a palavra do delator, sem uma mínima prova”, disse.

“Eu sei, todos sabem, que as corrupções precisavam ser sanadas e isso aconteceu. Agora, muito mais aconteceu os excessos, as invasões, o poder absoluto ou um projeto de poder incutido em Curitiba, onde se quebra sigilo sem autorização, há acesso a documentos internacionais sem nenhum tipo de cooperação clara”, prosseguiu.

Lira também afirmou que a Constituição Federal de 1988 deu poderes e uma autonomia exagerada aos membros do Ministério Público, o que precisa ser revisto.

“Penso que saímos de uma ditadura militar para uma ditadura do Ministério Público. Precisamos rever isso urgentemente, para que o MP continue cumprindo o seu papel constitucional de defesa do cidadão, da sociedade. Mas sem querer eleger prefeitos, governadores, presidente da República e assim sucessivamente. Um sistema Jurídico mais amplo não pode cria braços longos que abracem mais do que deviam e cuidem mais do que o necessário.”

O ministro Gilmar concordou com o panorama feito pelo presidente da Câmara e também criticou decisões imediatistas. “Normalmente isso leva a leis improvisadas. Isso já tinha ocorrido com relação à Lei da Ficha Limpa. Eu até brinquei, fazendo troça, dizendo que essa lei parece feita por bêbados. Mas aí uma associação de bêbados me mandou mensagem falando: ‘Nós fazemos outras coisas, mas não leis, então não causamos tanto prejuízo.'”

Veja debate na íntegra: