Começou em Londres o julgamento envolvendo a maior ação civil na história do Reino Unido, e a maior ação ambiental do mundo. Cerca de 620 mil vítimas do desastre ambiental de Mariana (MG) procuram responsabilizar por danos individuais uma das maiores mineradoras do mundo, a anglo-australiana BHP Group.
A ação reclama indenizações a cerca de 600.000 indivíduos afetados, sendo 23.000 deles membros dos povos tradicionais; indígenas Krenak, Tupiniquim, Pataxó e Guarani, além de quilombolas. Também são partes 46 municípios, mais de 1.500 empresas, autarquias e instituições religiosas.
Na entrada do Royal Courts of Justice, vítimas da tragédia distribuíram garrafas com água contaminada da lama tóxica aos advogados da BHP, entre gritos de “e se fosse seu filho, seu pai, sua mãe?”.
Entre elas estava Pamela Fernandes, que perdeu sua filha Emanuelle de 5 anos. Emanuelle foi arrastada pela lama por mais de 5 quilômetros, onde seu corpo foi encontrado. Nicolas, o outro filho de Pamela, que conseguiu sobreviver entrando num carro que flutuava na lama, sofre até hoje as sequelas da ingestão de grandes quantidades de lama tóxica, nove anos após a tragédia. Na época dos fatos Nicolas tinha três anos de idade.
Em entrevista ao DCM, Pamela conta que os moradores de Bento se reuniram diversas vezes com a empresa antes do rompimento, quando a barragem já dava seus primeiros sinais de alerta em forma de intensa poeira.
“Nessas reuniões, a gente queria saber se corríamos algum risco. E eles sempre alegavam que estava tudo bem. Eles sabiam que a gente corria risco, mas pagaram para ver (…) Não havia sirene, não fomos avisados”.
O Cacique Bayara, líder da Aldeia Pataxó Geru-Tucunã, também presente no julgamento, disse ao DCM: “Queremos que essa assassina, a BHP, sente-se nos bancos dos réus por tirar nossas riquezas, destruir nosso país, e que ela pague pelas 800.000 vidas dos povos originários que ela destruiu”. O Cacique redimensiona, em seu depoimento, a intensidade da tragédia sobre os povos originários: “Ela (BHP) matou nosso rio, tirou nossa alimentação, nossa memória foi perdida. Como nossos antepassados, já não podemos colher nossas plantas medicinais. O que a nossa mãe terra deu de seguro para nós, que é a água, foi contaminada”.
O parlamento de Westminster ouvirá amanhã o testemunho de quatro das vítimas em uma audiência para discutir o que os membros do parlamento, Andrew Pakes MP e Jake Richards MP, denominaram como “o maior julgamento na história do Reino Unido e suas implicações para o meio ambiente e direitos humanos na Grã-Bretanha e no mundo”.
O desastre de Mariana ocorreu em 5 de novembro de 2015, quando a barragem de rejeitos de minério de ferro de Fundão rompeu, liberando 44,5 milhões de metros cúbicos de lama tóxica e escoando outros 13 milhões de metros cúbicos nos dias subsequentes. A lama de rejeitos altamente tóxicos atingiu o Rio Doce e foi carregada até o Oceano Atlântico, chegando ao litoral do Espírito Santo e ao sul da Bahia, contaminando 675 quilômetros de rios, matando 11 toneladas de peixes, degradando 800 hectares de mata atlântica, matando 19 pessoas e afetando a vida de 2,2 milhões de pessoas.
A Samarco, empresa diretamente responsável pela operação da barragem de Fundão, é uma joint-venture de propriedade da BHP e da Vale S.A. A defesa da BHP nas cortes, nega que teria qualquer controle ou conhecimento sobre as operações da Samarco.
O processo será julgado na corte inglesa, onde o direito aplicável será o brasileiro, amparado nas legislações ambiental e civil brasileiras. O DCM acompanhará o julgamento até sua conclusão em março.
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