No mundo civilizado, existe a figura do elder statesman, que o dicionário Collins define como “pessoa de idade, experiente e eminente, especialmente um político, cujo conselho é freqüentemente procurado”.
No Brasil, nós temos Fernando Henrique Cardoso, um ex-presidente da República especializado em metralhar opiniões contraditórias de cima do muro, espécie de biruta moral que muda de ideia ao sabor do vento.
Desde meados de maio, ele já sugeriu a renúncia de Temer, depois recuou. Um dia ligou para ele, no outro se encontrou, no seguinte falou que falta legitimidade a seu governo.
Sua posição, na tarde deste sábado, é a seguinte: “Ele podia chamar as forças políticas e antecipar a eleição para daqui a oito, nove meses. Isso para ter legitimidade”.
Amanhã será diferente. Tudo publicado na imprensa, que repercute qualquer coisa de FHC — menos, obviamente, a verdade.
A verdade é que ele não sabe para onde ir. Apoiou o golpe, viu no que deu e agora é um senhor perdido na multidão que tenta se livrar da responsabilidade.
Se não é ouvido e respeitado nem em seu partido, como esperar reação diferente de quem não é colega?
A única manifestação sincera e coerente de Fernando Henrique é com relação a João Doria Junior. Ali o desprezo é figadal, genuíno, sem meias palavras.
O velho nunca escondeu que não gosta de seu menino sessentão, vaidoso como ele. Fez campanha para Andrea Matarazzo, da turma de Serra, que não ganha eleição para síndico, para ser candidato tucano em SP.
“Se você for um gestor, não vai inspirar nada. Tem que ser líder”, declarou há alguns meses.
Numa palestra a empresários da área médica em São Paulo, FCH voltou a carga e lembrou que Doria não fez nada.
“Isto aqui [o celular] está no meu bolso, não na minha alma. O mundo hoje tem isso aqui na alma. O prefeito de São Paulo está fazendo algum sucesso porque ele manipula isso aqui o dia inteiro. Ele mudou alguma coisa? Eu ainda não vi. Mas [mexer] aqui ele sabe”, disse.
Doria, constrangido por ser criticado publicamente por seu ídolo, respondeu no dia seguinte que “ele está precisando sair um pouco de seu apartamento e visitar São Paulo”.
FHC tem toda razão: Doria é uma fraude completa, um marqueteiro que carregou para a prefeitura as práticas nebulosas de sua empresa de lobbies.
Seu grande feito, até agora, foi dispersar a cracolândia. Virou presidenciável porque a direita precisa de um antilula mais limpinho que Bolsonaro.
Mas não é isso que incomoda FHC. Não é o risco que uma empulhação como JD representa para o Brasil.
O problema é que Doria é o espelho dele. É o seu legado. Naqueles litros de botox está estampado seu fracasso. Dói.
Com o trio corrupto Serra-Alckmin-Aécio na draga, sobrou no colo de Fernando Henrique Cardoso um playboy destemperado — e que, o pior, aparece na mídia amiga tanto quanto ele.