Bolsonaro poderá ser denunciado na ONU por crime de extermínio durante a pandemia
Por Pedro Rafael Vilela
Preocupada com a atuação do governo federal no enfrentamento à pandemia de covid-19, organizações da sociedade civil trabalham na identificação, documentação e sistematização de situações de violação do direito humano à saúde no contexto da pandemia no Brasil.
O trabalho, que será formatado em um documento-denúncia, indica que o presidente Jair Bolsonaro pode ser processado por crime de extermínio, diante das provas e evidências de omissão no enfrentamento da pandemia.
“Temos certeza que o conjunto de provas, testemunhos e evidências que coletamos neste dossiê são uma demonstração que o presidente Bolsonaro e seus associados têm que ser chamados à responsabilidade pelos crimes cometidos. Estamos considerando incorporar o crime de extermínio a lista de imputações a ser encaminhada a Corte Penal Internacional, conforme interpretação provida pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia”, diz o médico Flávio Valente, pesquisador encarregado de elaborar o documento.
O levantamento toma como referência os normativos internacionais das quais o Brasil é signatário e os mecanismos disponíveis no sistema global e regional de direitos humanos.
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Uma prévia desse levantamento foi apresentada na última quinta-feira (30) durante atividade paralela no 48º período de sessões do Conselho de Direitos Humanos (CDH) da Organização das Nações Unidas (ONU), realizado em Genebra, na Suíça.
Após ser concluída, a denúncia deve ser apresentada em organismos internacionais como a própria ONU, a Organização dos Estados Americanos (OEA) e o Tribunal Penal Internacional. No Brasil, o trabalho também será apresentado às autoridades, incluindo os senadores integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da pandemia. Uma reunião sobre o assunto está prevista para a próxima terça-feira (5).
“Este documento-denúncia faz uma análise cuidadosa e exaustiva das ações das autoridades sanitárias; diretamente responsáveis pela gestão do enfrentamento da covid-19; bem como das autoridades que colaboraram direta ou indiretamente para que a magnitude da tragédia chegasse ao ponto que chegou; identificando as múltiplas violações dos direitos à saúde e a vida; e direitos humanos correlatos de milhões de seres humanos, pelo estado brasileiro; claramente sob o comando do Presidente da República”, explica Valente.
O trabalho técnico é uma iniciativa da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH) em conjunto com a Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil (AMDH) e como parte de um acordo celebrado com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS).
Os principais interlocutores institucionais do trabalho são o Conselho Nacional de Saúde (CNS) e o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), entidades que também participaram o evento paralelo da ONU.
O levantamento apresentado por Valente durante a sessão na ONU mostra que houve violações a dispositivos nacionais e internacionais de direitos humanos, incluindo, por exemplo, o Pacto Internacional de Direitos Civis.
A omissão do Estado na condução do enfrentamento à pandemia resultou em uma mortalidade de 4 a 5 vezes maior do que a média mundial, o que significa que quatro a cada cinco mortes poderiam ter sido evitadas se o país estivesse na média mundial em termos de combate à doença.
Este trabalho já havia sido feito pelo epidemiologista Pedro Hallal, ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Estima-se que 467.093 mortes poderiam ter sido evitadas no Brasil.
“Ao contrário do esperado; o governo federal, sob a liderança explícita do Presidente da República; não só ignorou a evidência gerada pelo que vinha ocorrendo em outros países; não adotando as medidas necessárias; bem como passou a questionar, contestar e criticar publicamente as informações produzidas pela comunidade científica nacional e internacional; endossadas pela OMS. Além disto, o presidente deixou de exercer a governança antecipatória e desenvolveu uma verdadeira campanha de desinformação; descaracterizando a pandemia como uma ‘gripezinha’ e o uso da máscara como coisa de ‘covardes’ e, pejorativamente, coisa de ‘maricas’. Além de ter promovido uso de medicações não eficazes; como principal ação de enfrentamento”, aponta um trecho do documento apresentado pelas entidades na ONU.