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Por Luís Felipe Miguel
Se a imprensa brasileira seguisse o compromisso sempre alardeado de relatar os fatos a seu público, todas as manchetes começariam com a expressão “Bolsonaro mente”.
Não é “Bolsonaro diz”, “Bolsonaro afirma”, “Bolsonaro declara”, “Bolsonaro opina”. É “Bolsonaro mente”.
A mentira é a base da comunicação de Bolsonaro e de seu governo. Ele mente sobre seus propósitos, mente sobre suas ações e mente também sobre fatos de conhecimento público.
O Brasil está há meses estacionado num patamar muito elevado de contaminações pelo novo coronavírus. Somos vice-campeões mundiais em mortos pela doença e temos uma das mais altas taxas de mortalidade como proporção da população – e Bolsonaro diz somos um dos países que menos sofreram com a pandemia.
O consenso científico é de que o baixo isolamento social é um dos principais fatores responsáveis pelo descontrole da Covid-19 – e Bolsonaro diz que ficar em casa é “conversinha mole”, “para os fracos”.
O fogo devasta o Pantanal, em proporções inéditas e com evidências irrefutáveis de que é obra humana, proposital – mas Bolsonaro diz que o Brasil “está de parabéns” na preservação ambiental.
Bolsonaro e seu governo mentem sobre a reforma administrativa. Mentem sobre as universidades. Mentem sobre as causas da carestia dos gêneros alimentícios. Mentem sobre o auxílio emergencial.
Quando não pode mentir, Bolsonaro omite. E quando é confrontado com aquilo que quer esconder, Bolsonaro agride. Afinal, por que mesmo Michelle recebeu R$ 89 mil de Queiroz?
Bolsonaro não mente por ingenuidade, por equívoco ou por ignorância. Mente de caso pensado. Mentir, promover a mentira e impedir que o debate político seja baseado em fatos – eis a espinha dorsal de sua estratégia política.
Uma estratégia que é a manifestação mais radical da opção da nova extrema-direita (a alt-right dos anglófonos) pelo anti-intelectualismo, teorias conspiratórias e pós-verdade.
Às vezes, a cobertura da imprensa trata as mentiras de Bolsonaro como “opiniões”, portanto como parte legítima da controvérsia política. Às vezes, questiona-as apenas em espaços fora da reportagem factual, como colunas de opinião ou de checagem de dados. Às vezes, os fatos contrastantes são até citados no corpo do texto.
Mas, em todos os casos, fica em segundo plano o que é central: Bolsonaro mente.
Quando Bolsonaro se pronuncia sobre as queimadas, a pandemia ou seja o que for, ele escolhe mentir. Por que mente? A serviço de que interesses mente? O que deseja esconder com suas mentiras?
Se essas perguntas não estão no centro da cobertura, o que se faz apenas é propagar as mentiras de Bolsonaro.
Bolsonaro mente: essa seria a manchete de um jornalismo que não tem medo da verdade.