Publicado originalmente no Balaio do Kotscho:
POR RICARDO KOTSCHO
“Temos que criar boi em terra indígena para reduzir preço da carne, diz Bolsonaro”: título da matéria de Gustavo Uribe, publicada no online da Folha, na manhã desta quinta-feira.
Trata-se do maior crime ambiental contra a humanidade anunciado há pouco pelo presidente da República no cercadinho do Alvorada, como se estivesse falando numa reunião de condomínio nas “Vivendas da Barra Pesada”.
Sem mostrar a menor preocupação com as gravíssimas consequências para o meio ambiente desta nova ofensiva contra a Amazônia, Bolsonaro só queria mudar de assunto.
Os repórteres queriam saber das acusações feitas pelo Ministério Público do Rio contra seu filho Flávio 01 e o amigão Queiroz, envolvidos em lavagem de dinheiro de “rachadinhas”, imóveis comprados com dinheiro vivo, cheques depositados em contas das mulheres do clã e até uma loja de chocolate, fora as relações perigosas com as milícias.
Mas Bolsonaro se limitou a dizer que “não tem nada a ver com isso” e resolveu defender a criação de gado em terras indígenas para diminuir o preço da carne.
Segundo a reportagem, o capitão anunciou que pretende incluir a regulamentação da agricultura e pecuária comerciais em terras indígenas na proposta de liberação da atividade de mineração.
Ou seja, toda a destruição causada na floresta amazônica neste primeiro ano de mandato, que assustou e revoltou o mundo civilizado, é apenas o começo de uma operação de terra arrasada para acabar com as reservas indígenas criadas na Constituinte de 1988.
Cercado de seguranças e ao lado de dois índios que estavam no seu “grupo de apoio”, o presidente defendeu o “direito” de arrendarem suas terras para a criação de gado por terceiros.
“O índio vai poder fazer em sua terra o que o fazendeiro faz na dele, respeitando a legislação nossa”
Nossa de quem, cara pálida? Legislação já existe há muito tempo, só que não é respeitada pelos seguidores do capitão.
Nos primeiros 9 meses de governo, desmatadores, criadores de gado, madeireiros, garimpeiros e plantadores de soja foram liberados para promover 160 invasões em 153 áreas indígenas.
O que Bolsonaro quer fazer agora é legalizar, oficializar e incentivar a ocupação da floresta para a alegria dos novos desbravadores que estarão liberados para matar e desmatar.
Com o cinismo que lhe é peculiar, o capitão ainda justificou assim seus planos insanos e dementes:
“O preço da carne subiu. Nós temos de criar mais bois aqui, para diminuir o preço da carne e eles (os índios) podem criar boi”, afirmou para agradar ao mesmo tempo o “gado bolsonarista” e os consumidores, que deixaram de comer carne em seu governo.
Assim termina 2019, primeiro ato da tragédia anunciada, o ano em que o governo brasileiro decidiu declarar guerra à civilização.
Não é de pouca desgraça que estamos falando: os 900 mil indígenas brasileiros ocupam áreas demarcadas e protegidas por lei no total de 1,1 milhão de quilômetros quadrados, 13,8% do território brasileiro.
É nesse mundão de terra que Bolsonaro quer tacar boi, depois que derrubarem e saquearem a maior floresta tropical do mundo.
E ninguém vai fazer nada?
A ONU não vai se manifestar?
Vamos assistir bestificados a mais essa chacina?
Perto disso, as “rachadinhas” são brincadeiras de criança.
Mas são elas que estão nas manchetes, não a Amazônia ameaçada.
Vida que segue.