Embora os pedantes adorem dizer “não conheço fulaninha”, apenas para afirmarem-se em um universo mais sofisticado, o fato é que quem não ouviu falar de Deolane Bezerra está certamente em um detox de redes sociais, ou apenas mente.
Aliás, tudo que eu fiquei sabendo sobre a vida dela foi involuntário: o algoritmo gritava firmemente que eu precisava saber que Deolane Bezerra brigou com uma blogueira em uma festa, disse desaforo a um funkeiro, etc.
A advogada – e agora influencer – é viúva do funkeiro MC Kevin, que morreu após cair da janela de um hotel. Boatos dão conta que ele tentava fugir do flagrante da esposa, já que estava acompanhado no quarto.
Kevin morreu, Deolane ficou viúva e com fama de corna, mas fez desses limões uma deliciosa limonada: concedeu incontáveis entrevistas, deu festas, aproximou-se de gente famosa e se tornou uma sub-celebridade mais rica do que já era. Surfou na onda e conquistou muitos fãs.
Recentemente ela atacou de DJ e virou meme, depois de cantora e de garota propaganda. Uma péssima DJ e uma péssima cantora, preciso concordar, mas essa não é a questão, a questão é: quantas mulheres podem simplesmente fazer o que sonharam, ou têm coragem pra tanto?
E daí se ela fez de tudo pra se manter na mídia? Ela é uma mulher que faz o que tem vontade. “Nunca perca uma oportunidade de fazer o que não sabe”(pintura no Vale do Capão – BA).
Deolane incomoda porque exala poder e autonomia. Responde por si e assume os próprios desejos. Uma mulher assim, meus amigos, é um perigo em um país conservador.
Aliás, por falar em conservador, Bolsonaro parece não ter gostado nada do encontro da influencer com o futuro Presidente Lula.
Mais uma vez, ele usou desonestamente as redes sociais. Publicou um trecho de entrevista concedida por Deolane ao podcast Papagaio Falante, onde ela diz: “Eu gosto de bandido, eu gosto de advogar pra bandido”, e a legenda escolhida foi: “feitos um para o outro.” [Lula e Deolane]
A piada até poderia finalmente ser engraçada, mas na verdade a única coisa engraçada é a dificuldade cognitiva de Bolsonaro, que não consegue raciocinar sequer para fazer uma boa piada. Deolane é advogada criminalista e ama o que faz. É isso que sua afirmação significa, mas alguém como Bolsonaro não poderia entender. É demais pra ele.
A profissão dela é defender bandido: gente que faz rachadinha, gente que tenta matar a esposa, gente que usa dinheiro público “pra comer gente”, enfim, gente pra todo gosto. Isso sim é bandidagem.
Lula não precisará pagar honorários a Deolane porque não é bandido envolvido com miliciano, é o presidente mais respeitado da história do país. Mas até que Bolsonaro e sua turma aceitem esse fato – ou percam nas urnas –, haja piada ruim nos nossos pobres ouvidos.