Publicado originalmente no Jornalistas pela Democracia:
Por Denise Assis
Já foram melhores as escolas de oficiais do Exército.
Eram e continuam sendo reacionárias, mas ensinavam com capricho a língua pátria.
Não permitiam, por exemplo, que um general ao depor na Câmara dos Deputados, em nome de defender uma ideia ultrapassada por um manancial de livros de estudiosos que, sim, detalham, descrevem e dissecam a ditadura civil-militar (1964/1985), cometesse imprecisão (histórica, como lhes convém) e do mau uso do Português.
O mínimo que se espera de um oficial do Exército Brasileiro que vai a um depoimento se explicar sobre ameaças à democracia e às regras eleitorais, seria o cuidado com as palavras.
Qual o quê.
O general Braga Neto, ministro da Defesa – que em julho assinou nota neste sentido, e mandou recado ao presidente da Câmara, Arthur Lira, dizendo que ou aprovava o voto impresso ou não haveria eleições em 2022 -, não só desmentiu mais uma vez o que disse, como aproveitou para negar a existência da ditadura no Brasil.
“Não considero que tenha havido uma ditadura. Houve um regime forte, cometeram exceções dos dois lados, mas isso tem que ser analisado à época da história”,
De acordo com o dicionário on line, “sinonimos”, o termo exceções – fui buscar o significado ao pé-da-letra, porque me soou deslocado na fala do ministro – quer dizer: exclusão, isenção, reserva, ressalva, restrição. Provavelmente ele gostaria de ter dito “excessos”.
Ainda assim, não conseguiria abarcar tudo o que houve naquele período, com uma palavrinha tão “suave”, digamos assim.
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Braga Netto foi ouvido na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados, na condição de convocado.
O termo Exclusão, poderia ser empregado, mas em apenas um dos quesitos praticados pelo Exército a que Braga Netto serve.
Sim, o Exército excluiu de suas fileiras cerca de sete mil militares, acusados de subversão.
Isenção, foi tudo que os superiores não tiveram na hora de punir e expurgar os seus.
O ex-capitão Ivan Proença, um oficial considerado por seus pares foi punido, expulso, por ter tomado a atitude heroica – título que rejeita até hoje – no episódio do Largo do Caco, em 1º de abril de 1964.
Proença impediu que a tropa invadisse e atirasse contra as alunas do curso de Filosofia, da UFRJ, que naquele dia, comprimidas no interior do saguão da universidade, junto com os colegas da turma do Direito, tentavam sair para respirar.
Lá dentro bombas de gás lacrimogêneo lançadas contra elas já levava algumas ao desmaio.
Virou prisioneiro do regime militar, dedicou-se depois ao magistério, se transformando também em escritor.
Reserva foi para onde foram mandados vários deles, para ato contínuo serem presos e muitos, exilados.
Ressalva é o que precisa ser feita, quando um general, ainda hoje, em pleno século XXI, quase 60 anos depois, insiste não só em negar o que aconteceu, como a passar a limpo este passado, para o bem da sua instituição.
E, pior. Quer repetir.
Restrição é o que todos nós brasileiros devemos ter e demonstrar, contra as ameaças antidemocráticas do general, que teima em exaltar um passado de horror e morte, e tenta trazê-lo de volta com ameaças contra o seu próprio povo.