Por Sergio Takemoto*
O que é possível se fazer com uma “renda” de R$ 400 por mês? Em Florianópolis, por exemplo, o valor não paga nem a cesta básica. De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o custo dos alimentos essenciais chegou a R$ 700,69 na capital catarinense.
Tomando como referência o preço da cesta básica em Florianópolis, o mais alto registrado em outubro, o Dieese calcula que o salário-mínimo necessário para os brasileiros deveria ser equivalente a R$ 5.886,50. O valor atual é R$ 1.100; ou seja, cinco vezes menor que o indicado. Apesar disso e da mais dramática situação econômica vivenciada pelos brasileiros, o governo federal estabeleceu o limite de R$ 400 mensais ao programa que substituirá o Bolsa Família e o auxílio emergencial.
Para piorar ainda mais o cenário, o Executivo já avisou que muitas famílias em situação de pobreza e extrema pobreza poderão receber menos R$ 100 neste mês de novembro por conta da indefinição orçamentária para o pagamento do “novo” Auxílio Brasil. Menos de R$ 100 por mês!
Leia também:
1 – Aluno da UnB é denunciado por gesto supremacista
2 – Saiba por que Guedes tem medo de ir ao supermercado
3 – Moro se arma para a guerrilha digital contra o presidente
Esta indefinição reflete, mais uma vez, a falta de compromisso do atual governo com o social. Mesmo com o avanço da pobreza e a falta de investimentos para a geração sustentável de emprego e renda no país, o Executivo desmonta o Bolsa Família: política de inclusão social criada em 2003, que beneficiou milhões de brasileiros durante quase duas décadas, com a efetiva participação dos empregados da Caixa Econômica Federal, operadora do programa.
Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) sobre o Bolsa Família mostrou que, em 2017, mais de 3,4 milhões de pessoas haviam saído da extrema pobreza por causa do programa. Outros 3,2 milhões de brasileiros haviam superado a linha da pobreza.
O Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) foi uma das instituições a criticar a decisão do governo de extinguir o Bolsa Família: “Fica explícito o caráter eleitoreiro do ‘novo’ programa de transferência de renda, anunciado com ‘promessas de ampliação’ sem sequer ter indicada a fonte fixa de recursos orçamentários para sua execução”.
O Bolsa Família e o auxílio emergencial foram encerrados com a promessa de que o Auxílio Brasil começará a ser pago a partir deste mês e só até dezembro de 2022. Para isso, o governo ainda precisa assegurar a fonte dos recursos e conta com a aprovação, pelo Congresso Nacional, da Proposta de Emenda à Constituição 23 — a chamada “PEC dos Precatórios”.
A proposição foi aprovada pela Câmara dos Deputados. Contudo, ainda depende de votação no Senado, em dois turnos.
Com o fim do auxílio emergencial, cerca de 38 milhões de pessoas que recebiam o benefício deverão ficar totalmente desassistidas, fora do novo programa do governo. Desde o início da pandemia, a Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae) defendia a manutenção do valor do auxílio em no mínimo R$ 600, como inicialmente aprovado pelo Congresso.
Com relação à operacionalização do Auxílio Brasil, ela será estendida a outras instituições financeiras federais, diferentemente do Bolsa Família, em que a Caixa era o agente operador. Essa é mais uma forma do governo promover o esvaziamento do papel social da Caixa Econômica.
No entendimento da Fenae, duas questões são fundamentais: defender que a população em situação de vulnerabilidade receba proteção social digna do Estado e defender também a Caixa como operadora de políticas públicas. Estes são pilares imprescindíveis para a real redução das desigualdades sociais no nosso Brasil.
*Sergio Takemoto é presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal (Fenae)