Uma notícia publicada pela jornalista Daniela Lima na Folha deste sábado, 23, pode ser o fio da meada para levar à constatação de que as instituições brasileiras estão a serviço de grandes corporações financeiras.
Diz Daniela Lima.
O estiramento da relação do governo Jair Bolsonaro com o Congresso explicitou as fragilidades da atual gestão para setores que antes apoiavam o governo incondicionalmente. Pela primeira vez, o presidente foi amplamente criticado por atores importantes do mercado que se posicionaram ao lado do comandante da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na queda de braço entre os Poderes.
Veja só o que vem na sequência.
Para operadores do mercado financeiro, Bolsonaro tem tropeçado nos próprios pés de maneira sistemática, mas agora colocou em risco a votação da reforma da Previdência. A incapacidade do presidente de estabelecer diálogo com o Parlamento fez com que ele fosse chamado por investidores nesta sexta (22) de “Dilma de calças”.
Ou seja, fica claro até aqui, e no que segue a partir das informações publicadas pelo jornal, que o “mercado” se sente suficientemente à vontade para tomar partido entre os Poderes, impor a pauta política do país e, se necessário for, instigar um novo golpe de Estado, defenestrando o atrapalhado capitão da presidência, assim como fez com Dilma Rousseff.
Sintomático, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, saiu tirando casquinha de Bolsonaro e cia, criticando a “falta de agenda”, ameaçando que vai largar mão de carregar o piano da Previdência e falando da incapacidade da turma em se entender com os deputados para cumprir a ordem que vem do andar de cima.
Saltitante, esqueceu de um detalhe: manter as aparências.
Vá lá que seja o escolhido pelas corporações para ser o seu garoto prodígio, mas é conveniente lembrar que, constitucionalmente, foi eleito pela população do Rio de Janeiro. É a ela que deve obrigações.
Como deputado e presidente do Poder que pode mudar para sempre os destinos do país, Rodrigo Maia não tem o direito de se apoiar nos interesses do mundo financeiro, ou de quem for, para manipular congressistas e homens de governo, tripudiar em quem quer que seja ou iludir a opinião pública.
O resultado dessa prática só serve para gerar instabilidade jurídica e institucional e estabelecer um clima de incerteza na população. Se é favor da reforma da Previdência, que use suas prerrogativas constitucionais para fazer valer o seu direito de voto. O que não dá é bancar corpo mole e fazer ameaças em cima de informações veladas publicadas nas entrelinhas da imprensa.
Temos no Brasil um ex-presidente preso a partir de uma farsa jurídica que não só atende os interesses do mercado – lembra do Pato da Paulista? – como de boa parte do mundo político, com o próprio Rodrigo Maia servindo de ‘fiador’ de um governo notoriamente corrupto como o de Michel Temer.
Temos uma ex-presidente deposta a partir de uma tese fajuta comprada por R$ 45 mil por um presidente partidário igualmente corrupto como Aécio Neves, do PSDB – e agora aparece uma nota num dos principais jornais do país dizendo que um mandatário legitimamente eleito pode vir a descer a rampa de saias se não cumprir o que está no script.
Como presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia precisa se manifestar. E de forma urgente.
Deve assegurar primeiro que não é um fora da lei como Eduardo Cunha. E depois garantir que está ali não para compactuar com jogo de poderosos e sim para salvaguardar através do parlamento a soberania nacional e a vontade popular.