A primavera no Brasil surpreendeu especialistas com uma intensidade fora do comum, conforme revelado pela primeira plataforma dedicada a documentar cientificamente supertempestades no país. Dados da Plataforma de Registros e Rede Voluntária de Observadores de Tempestades Severas (Prevots) indicam um aumento de 160% no número destes temporais, envolvendo vendavais, chuva de granizo e tornados, durante setembro, outubro e novembro em comparação à média desde 2018.
Segundo Bruno Zanetti Ribeiro, pesquisador da Universidade de Albany e um dos criadores da Prevots, a estimativa preliminar para o ano de 2023 se aproxima de 10 mil registros, cerca de 4 mil a mais do que a média dos últimos seis anos. O fenômeno, influenciado pelo El Niño, teve sua expressão máxima no Sul do país, mas também atingiu inesperadamente outras regiões, como São Paulo, Rio de Janeiro e Sul de Minas Gerais.
Setembro, outubro e novembro de 2023 acumularam 5.213 notificações de chuvas de gravidade extrema, marcando um aumento significativo em relação à média de 2 mil notificações para o mesmo período nos anos anteriores. Vale destacar que esses dados referem-se à primavera meteorológica, não à primavera astronômica, que encerra na quinta-feira.
Um exemplo marcante dessa primavera intensa foi a tormenta que atingiu Barros Cassal, na Serra Gaúcha, em 3 de outubro. Granizo de 12,4 cm de diâmetro, equivalente a uma chuva de pedras do tamanho de pratos, danificou casas e devastou plantações de uva, trigo e fumo. Eventos como esse são classificados como tempo severo pela Prevots.
Guilherme Touchtenhagen Schild, meteorologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e fundador da Prevots, enfatiza que, embora a intensidade na primavera não seja indicativa do verão, é impossível prever completamente as condições devido às mudanças climáticas. Os estados do Sul, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro e Sul de Minas Gerais são identificados como áreas de risco para tempestades severas.
“Tivemos muitos eventos extremos. Principalmente com granizo grande (pedras de gelo com diâmetro entre 7cm e 10 cm) e gigante (acima de 10 cm de diâmetro)”, disse Schild em entrevista ao jornal O Globo.
A Prevots, iniciativa que reúne especialistas em tempestades, visa documentar, pesquisar e prever esses eventos no Brasil. Ribeiro destaca que, apesar de o país ser considerado o segundo do mundo em tempestades severas, não possui um registro oficial padronizado. A plataforma integra redes de instituições renomadas e recebe registros de voluntários por meio das redes sociais.
Os dados coletados pela Prevots contribuem para prevenir desastres e auxiliar na tomada de decisão em setores como agricultura, geração de energia e engenharia. Além disso, a iniciativa faz parte de uma rede sul-americana que busca padronizar registros de tempo severo na América do Sul, com o objetivo de aprimorar a previsão desses eventos desafiadores.
“Conseguimos determinar quais regiões sofrem mais com granizo, vendaval, tornado. Podemos procurar que regiões são mais vulneráveis a granizo de determinado tamanho ou onde há mais vendavais”, explicou Bruno Ribeiro, também ao jornal O Globo.