Publicado originalmente no ConJur:
Por Sérgio Rodas e Fernanda Valente
Ao ser homenageado nesta sexta-feira (9/10) pelo instituto Alma Premium, o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, reclamou da “perseguição” que sofre por participar de eventos públicos. A entidade que o homenageia tem entre seus principais patrocinadores uma empresa cujo dono o próprio Bretas já mandou prender.
O magistrado participou de um evento da plataforma de conteúdo que promove “conhecimento & networking & business”. Um dos patrocinadores da entidade é a charutaria Esch Café, cujo dono, Carlos Felipe da Costa Almeida de Paiva Nascimento, foi alvo de um mandado de prisão preventiva do juiz em 2018. O empresário está foragido, vivendo em Portugal.
A Alma Premium promove encontros com o objetivo de estreitar laços entre empresários. A plataforma tem um lounge privado no Esch Café.
Bretas recebeu a denúncia e ordenou a prisão preventiva de Nascimento. O Ministério Público Federal o acusou de coordenar um esquema de corrupção na Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) do Rio. De acordo com o MPF, Nascimento, por meio de laranjas, comandava a Iniciativa Primus, uma empresa que fornecia pães às prisões fluminenses.
O empresário, conforme a acusação, pagava propina a funcionários da Seap. Em troca, eles fraudaram uma licitação para que só a Iniciativa Prime cumprisse os requisitos exigidos. A companhia ganhou o contrato e passou a cobrar preços superfaturados ao governo do Rio.
Segundo o MPF, a Seap pagou à Iniciativa Primus cerca de R$ 73 milhões entre agosto de 2010 e dezembro de 2015. Desse total, aproximadamente R$ 44,7 milhões foram desviados por meio de pagamentos feitos à empresa sem a correspondente aquisição de produtos.
Em um desdobramento da operação, o advogado do empresário impetrou Habeas Corpus pedindo a Bretas para substituir a prisão por medidas cautelares. Com a negativa do pedido, o caso foi levado ao Tribunal Regional da 1ª Região, alegando que a ordem de prisão era baseada exclusivamente em declaração de delator, sem que que tenha havido individualização da conduta. Além disso, o advogado reclama da falta de contemporaneidade dos supostos crimes.
Em junho deste ano, o HC foi negado pelo desembargador Abel Gomes, do Tribunal Regional da 1ª Região. O magistrado considerou que “há indícios de envolvimento do empresário no esquema de lavagem de dinheiro, não sendo o primeiro decreto prisional expedido contra ele”.
O relator também considerou que Nascimento parece ter “pleno conhecimento de que é procurado pela justiça brasileira, optando, em tese, por permanecer em Portugal”. Afastou assim o argumento da defesa de que o empresário mora em Portugal desde muito antes da ordem de prisão.
Bretas não é a favor da corrupção
“Não é importante para nós a prisão de alguém, a condenação de alguém”, afirmou Marcelo Bretas no evento. “O importante é expor o problema.”
Em casos da “lava jato” no Rio, Bretas decretou 265 prisões (217 preventivas e 48 temporárias) e condenou 41 pessoas, algumas delas por várias vezes, como o ex-governador Sérgio Cabral (MDB). Os dados, atualizados até 20 de setembro de 2019, são do Ministério Público Federal. Em todos os casos, o “problema” foi “exposto” com grande estardalhaço da mídia, divulgação das acusações e condenações e presença da imprensa durante as operações.
Em relação aos possíveis excessos cometidos durante as ações, o juiz federal disse que tem “uma preocupação muito grande de não cometer nenhum injustiça, não expor ninguém que não tenha envolvimento” com ilícitos. Também declarou que as investigações e condenações não miram nenhum grupo político ou econômico específico.
“Às vezes uma decisão é tomada na primeira instância, confirmada em segunda e terceira instâncias e mudada na quarta instância. Não é nada tão absurdo. Não é por ter sido modificada que houve um abuso ou exagero da primeira instância.”
As decisões de Bretas têm sido constantemente revogadas pelo Supremo Tribunal Federal — a última foi no sábado (3/10), quando o ministro Gilmar Mendes suspendeu o maior ataque contra a advocacia já promovido no Brasil, afirmando que há indicações de que o juiz invadiu a competência do STF ao julgar caso envolvendo ministros de tribunais superiores.