PUBLICADO NO BRASIL DE FATO
POR PEDRO STROPASOLAS
“Eu fui no médico. Ele me passou o remédio e me mandou procurar uma dermatologista. Eu estou usando mais creme, óleo de amêndoa, e evitando o sol. Porque, se eu ficar no sol, mesmo com camisa, arde e começa a sangrar. Tenho que trocar o lençol da minha cama duas, três vezes por semana, de tanto que ele fica manchado de sangue”, conta o caminhoneiro de 57 anos, afastado do trabalho por conta das complicações.
Nove meses após o crime que tirou a vida de 250 pessoas, ele e outros ribeirinhos de 48 municípios aguardam por diagnósticos e exames toxicológicos.
Segundo levantamento realizado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), cerca de 1,3 milhão de pessoas que vivem às margens do rio Paraopeba podem estar contaminadas com metais pesados.
“Um desastre como esse provoca uma grande alteração ambiental. E uma das alterações ambientais mais sérias é exatamente a contaminação dos rios”, ressalta.
Aílton Silva, que vive com a esposa e os três filhos, mudou-se para o bairro Cruzeiro, na Colônia Santana, em 2019. O plano era construir uma vida tranquila ao lado da família, do rio e das árvores frutíferas.
Hoje, o adoecimento das romãs, acerolas e laranjas, que crescem envoltas por uma espécie de ferrugem, evidenciam o cenário de desalento do caminhoneiro, que observa a degradação do leito do Paraopeba.
“Antes dessa destruição, ninguém dependia da Vale. Hoje, todo mundo virou escravo da Vale. Qualquer coisa que vai fazer agora, precisa dela, e ela não tá nem aí pro ser humano. Ela quer pegar a riqueza do nosso Brasil, levar para fora e deixar o brasileiro a se lascar. Eles não precisam de nós. Nós precisamos da natureza, e o que ela fez? Destruiu”, lamenta.
O último boletim, divulgado em outubro pelo Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), revela a presença do minério manganês em diferentes pontos do Paraopeba em níveis acima do permitido. O contato com o metal, por vias aéreas ou por meio da água, pode causar câncer, fraqueza muscular e motora, além de alterações neurológicas.
No município de Esmeraldas, a 60 km de Brumadinho, os níveis de manganês estão entre 1,5 e 3 vezes acima do permitido. No mesmo documento, é possível verificar a presença de ferro dissolvido e alumínio dissolvido também fora dos padrões.
Os resultados apresentados pelo estado de Minas Gerais indicam que a lama da Vale chegou aos limites do reservatório de Retiro Baixo, a cerca de 300 km Brumadinho.