Candidato ao governo do ES, aliado de Bolsonaro foi membro da Scuderie Le Cocq, conhecida como esquadrão da morte

Atualizado em 14 de setembro de 2018 às 19:55
O candidato ao governo do ES pelo PSL, deputado federal Carlos Humberto Mannato

Publicado no blog do Elimar Côrtes

O candidato ao governo do Espírito Santo pelo PSL, deputado federal Carlos Humberto Mannato, o Manato, já integrou os quadros da temida Scuderie Detetive Le Cocq. O registro de filiação de Manato na Le Cocq é o número 687. O candidato afirma ter sido filiado da Le Cocq por três anos.

A Scuderie teve sua extinção confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (Rio/ES) no final de 2005. Para a Justiça, a entidade abrigou e protegeu, por vários anos, pessoas acusadas de pistolagem, tráfico de drogas e roubos a bancos. A Le Cocq foi apontada, entre os anos 80 e parte de 2000, como o braço armado do crime organizado capixaba.

Embora não seja prerrogativa de um governador de Estado apresentar projetos de lei sobre os temas, as principais propostas de Manato nesta campanha eleitoral para o governo capixaba é a redução da maioridade penal para 16 anos e a liberação do porte de armas para cidadãos comuns. Manato, que já está em seu quarto mandato como deputado federal, defende a revisão do Estatuto do Desarmamento.

Quando entrou para a Scuderie Le Cocq em 1992, Manato era médico do Hospital Evangélico. Ele, ao preencher a ficha de filiação, colocou a esposa e a filha como dependentes. Manato teve três padrinhos para entrar na Le Cocq: dois delegados de Polícia e um investigador. Todos já estão aposentados.

Manato entrou na vida política em 1994, quando se filiou ao PSDB. Depois, em 2001, ingressou no PDT. Iniciou sua vida no setor público assumindo a Secretaria Municipal de Serviços da Prefeitura Municipal de Serra, entre os anos de 2001-2002. Na eleição de 2002, foi eleito pela primeira vez a exercer um mandato na Câmara dos Deputados. Foi reeleito em 2006, 2010 e 2014.

Carlos Manato desistiu do legislativo este ano para ser candidato ao governo do Espírito Santo, com o objetivo maior de dar palanque ao candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro, que se encontra internado, em São Paulo, depois de ser vítima de um atentado na quinta-feira (06/09), em Juiz de Fora, Minas. Bolsonaro foi esfaqueado pelo militante do Psol Adélio Bispo de Oliveira, de 40 anos, que foi preso em flagrante e indiciado pela Lei de Segurança Nacional.

Candidato diz em nota que foi convidado por policiais amigos e que pessoas de renome faziam parte da Scuderie

Em nota enviada ao Blog do Elimar Côrtes na tarde de sábado (08/09), a Assessoria de Imprensa do candidato Manato confirmou que ele já integrou os quadros da Le Cocq, mas que desconhecia o envolvimento da entidade e ou de associados com a prática de crimes.

“Em 1991, Carlos Manato, na época médico, concluiu o curso da Escola Superior de Guerra (ESG), vindo a integrar a Associação dos Diplomados na Escola Superior de Guerra (ADESG).Durante o curso, alguns amigos policiais o convidaram para também fazer parte da Le Cocq, que, segundo eles, seguia as mesmas linhas da ESG. Manato participou de algumas reuniões e não se identificou com os temas, achou que era bem mais restrito ao meio militar e não voltou às reuniões. A desfiliação só ocorreu cerca de três anos depois, pois encontrou certa dificuldade devido a mudança de endereço da sede da organização”.

Prossegue a nota: “É importante frisar que Manato não teve acesso, nem conhecimento de nenhuma prática criminosa que, por ventura, tenha sido imputada à organização enquanto participou das reuniões. É importante ressaltar também que, à época, pessoas de renome e conhecidos amigos faziam parte da Le Cocq o que dava credibilidade e uma aparente segurança para que Manato também participasse dessas poucas reuniões”.

A Scuderie Detetive Le Cocq, que era inscrita como Pessoa Jurídica na condição de entidade filantrópica, foi extinta depois de ser acusada pelo Ministério Público Federal de abrigar e proteger grupos de extermínio, traficantes e assaltantes.

Em dezembro de 2005, o desembargador federal Guilherme Calmon, do TRF-2, manteve a decisão do juiz Alexandre Miguel, da 12ª Vara Federal no Espírito Santo, que extinguiu a Scuderie Le Cocq. A decisão que extinguiu a Le Cocq proibiu também a utilização dos símbolos da entidade em bonés, camisas, chaveiros, adesivos e outros objetos.

Uma das vítimas de policiais militares ligados à Le Cocq foi o menino Jean Alves Cunha, 14 anos, assassinado a tiros na cabeça no Morro das Torres de TV, depois de ter sido sequestrado na avenida General Osório, no Centro de Vitória. Jean foi executado uma semana antes de representar o Espírito Santo no Encontro Nacional de Meninos e Meninas de Rua, em Brasília.

No Espírito Santo, entidade teria sido responsável por mais de 1.500 assassinatos, diz MPF

A Scuderie foi oficialmente fundada no Espírito Santo em 24 de outubro de 1984, pautada para “aperfeiçoar a moral e servir à coletividade”. Ao pedir a Justiça Federal a extinção da Le Cocq, a Procuradoria Regional da República apontou que a entidade teria sido responsável por pelo menos 30 assassinatos de políticos capixabas cometidos em 18 anos e quase 1.500 homicídios anuais que transformaram o Espírito Santo no segundo Estado mais violento do Brasil, naqueles anos compreendidos entre 1990 e início de 2000, quando se deu início o processo de  extinção.

A organização surgiu no Rio de Janeiro, em 1965, quando um grupo de policiais decidiu vingar a morte do detetive Milton Le Cocq. Cara de Cavalo, o bandido que matou Le Cocq, foi exterminado com mais de 100 tiros e seu corpo coberto com o cartaz de uma caveira.

A ficha de Mannato na Scuderie Le Cocq

Em 1998, o Congresso Nacional abriu a Comissão Parlamentar de Inquéritos (CPI) do Narcotráfico para apurar diversos crimes País afora, inclusive a atuação da Scuderie Detetive Le Cocq no Espírito Santo. A CPI Nacional do Narcotráfico teve como presidente o então deputado federal Magno Malta, hoje senador da República pelo Espírito Santo e candidato à reeleição na mesma coligação encabeçada por Carlos Manato. Magno Malta é o presidente do Partido Republicano no Estado e é também aliado de outros fortes candidatos à Câmara Federal, como Gilsinho Lopes, Lauriete (esposa do senador), Rodney Miranda e Amaro Neto.

A CPI do Narcotráfico, presidida por Magno Malta, chegou a indiciar diversas autoridades capixabas por suposta ligação com a Le Cocq. Eram pessoas filiadas à Scuderie Le Cocq e acusadas de crimes que variavam da receptação de carros roubados à organização de assaltos a banco, passando por assassinatos e tráfico internacional de drogas.

Ao acolher pedido do Ministério Público Federal para extinguir a Le Cocq, a Justiça Federal alegou também que a Scuderie “tem natureza paramilitar e persegue objetivos ilícitos em detrimento de órgãos e interesses da União”. Além disso, a Scuderie “intervém na apuração de crimes em que supostos associados estariam envolvidos, para assegurar-lhes impunidade”.

No Espírito Santo, entre a sua criação e até o início de 2002, a Scuderie chegou a ser formada por mais de mil associados, entre jornalistas, policiais civis, militares, advogados, delegados de Polícia, magistrados, coronéis, políticos, médicos, engenheiros, bicheiros, dentre outros.

Em maio de 2002, a Anistia Internacional divulgou um relatório em que o Espírito Santo era citado como um Estado em que os “defensores dos direitos humanos sofriam ameaças crescentes” e classificou a Scuderie Detetive le Cocq como “uma estrutura paramilitar”, “com poderosos grupos econômicos e políticos no Estado, incluindo membros dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário”. (…)