Em entrevista ao Conjur, o deputado estadual Fernando Capez, ex-presidente da Assembleia Legislativa, expõe sua angústia diante da manipulação a que, segundo ele, foi submetido num processo em que, de um lado, a imprensa fez uma cobertura tendenciosa e, de outro, a polícia e o Ministério Público coagiram testemunhas.
Capez talvez tenha provado do próprio veneno.
Ele é promotor de justiça e se destacou em ações contra torcidas organizadas que tinham sempre alta exposição na mídia. Com a popularidade, se elegeu. Já como político, também se destacou como manifestante pelo impeachment de Dilma, ecoando na avenida Paulista o que diziam a polícia e o Ministério Público (vídeo abaixo).
Dilma não cometeu crime de responsabilidade e o ambiente criado para que ela fosse deposta foi fruto da aliança entre Ministério Público, Judiciário e mídia.
Capez certamente tudo isso bonito, até o direito punitivista bater em sua porta.
Ele era cotado para disputar o governo do Estado pelo PSDB. Foi abatido em pleno voo, depois de se eleger presidente da Assembleia Legislativa, o passo mais largo que deu em sua trajetória.
Ele não diz publicamente, mas, nos bastidores, atribui a uma movimentação no seio do seu partido para que fosse alvo das denúncias.
Cita desembargadores do Tribunal de Justiça de São Paulo que contribuíram para destruir a imagem pública dele.
O fato é que houve desvio na merenda, mas, como em todo escândalo, os bagrinhos pagarão por desvios de dinheiro público.
A segunda turma do Supremo Tribunal Federal trancou a ação, por não ver no processo provas que pudessem levar Capez ao banco dos réus.
Só quem viu o processo pode dizer se isso é verdade. Mas, nisso tudo, fica a lição para Capez: aparelho do Estado, como Ministério Público e polícia, tem sido usado para perseguição política.
Enquanto o alvo são os petistas, muitos se calam, mas que ninguém se engane: num ambiente punitivista, começa num grupo e depois atinge a quase todos.
Capez, assim como Aécio e outros tucanos, não chegou a ser preso. Tucano não vai para a cadeia no Brasil. Mas Capez terá dificuldade de levar adiante o discurso de que a corrupção está na casa do vizinho.
Segue trecho da entrevista:
ConJur — Poderia nos falar sobre o momento que está vivendo agora e sobre as acusações que o senhor recebeu?
Fernando Capez — Faz dois anos e meio que a minha imagem vem sendo destruída. A versão dos fatos que é passada para a população não é a que consta nos autos. Isso por causa de uma cobertura assimétrica e tendenciosa da imprensa sobre o escândalo da merenda. A maneira como as matérias foram montadas, com os tipos e chamadas totalmente direcionados, combinadas com vazamentos seletivos de trechos específicos dos depoimentos e com reportagens sendo veiculadas no dia específico de determinados julgamentos ou decisões, acabou formatando na opinião pública uma imagem que não corresponde à realidade dos fatos.
Agora estou vendo que o processo está se transformando em um processo Kafikaniano, no qual estão fazendo a mentira prevalecer sobre a verdade. A maneira como tem sido feita a atuação em parceria com alguns organismos de imprensa têm levado não só a uma má informação da população como uma pressão enorme sobre o Poder Judiciário.
ConJur — Deputado, sinteticamente, no caso concreto, onde o senhor vê erro da acusação?
Fernando Capez — Em primeiro lugar, a população não foi informada de que as testemunhas que foram ouvidas no dia da prisão, em janeiro de 2016, foram todas coagidas a falar o meu nome. A coação foi confessada e delatada por todas estas testemunhas. Uma delas inclusive, que foi denunciada, chegou a gravar em áudio toda a coação feita nos fundos da delegacia de Bebedouro [município de São Paulo]. Àquela época, enquanto eu estava viajando em férias com as minhas filhas, aqui no Brasil estavam numa delegacia da cidade pegando testemunhas de ouvir dizer, que não tiveram nenhum contato comigo, não me viram ou conversaram comigo, apontando o meu nome como envolvido.
ConJur — A coação foi feita pelo Ministério Público ou pela Polícia?
Fernando Capez — Por ambos. Uma testemunha que foi presa, por exemplo, retratou ao desembargador do Tribunal de Justiça o seguinte diálogo com o delegado de polícia naquele dia em janeiro de 2016: “eu quero falar para você o seguinte, a corda vai estourar para o lado mais fraco, você vai ser ouvido hoje após o almoço, que que você cite o nome dos grandões, quero que você fale do senhor Fernando Capez”. O delegado induziu a testemunha a falar o meu nome e nisso ela respondeu: “doutor, eu não coloco um ponto e não tiro uma vírgula do que eu sei, porém não vou falar inverdades”. Mesmo a testemunha informando que eu não estou envolvido, o delegado, então, vira e diz: “você tem filhos, quer dormir na sua casa com seus filhos? Você fale o que a gente quer ouvir”.
O vídeo do gavião da merenda: