Convenhamos que é preciso considerar que ele foi eleito na bacia das almas com 17 anos, disputando com a própria mãe, e vive na penumbra do baixo clero, sem ser incomodado, desde 2001 – está no quinto mandato de vereador na cidade do Rio de Janeiro.
Mas agora o cenário mudou para Carlos Bolsonaro.
Ele não é mais o filho disfuncional que o pai enfiou na vida pública como meio de vida, aliás como já havia feito com a ex-mulher e mãe do rapaz, que Jair também colocou na vereança para evitar o pagamento da pensão alimentícia.
Carlos Bolsonaro é vereador num dos parlamentos mais importantes do país e, nesta condição, age como se fosse dono do próprio nariz. Não é. Ele deve satisfações aos seus eleitores, obrigações administrativas na câmara e portanto incorre em grossa imoralidade quando fica em Brasília, ou em qualquer parte do Brasil e do mundo, acompanhando a agenda do presidente e perturbando Deus e o mundo via Twitter.
Carlos Bolsonaro precisa trabalhar – e ele ganha muito bem para isso.
Caso queira, pode renunciar ao mandato, pedir licença e assumir um posto no governo federal – neste caso, é preciso saber se o próprio Jair teria interesse em tê-lo em tempo integral ao seu lado.
Sei que não é simples entender, afinal a esculhambação sempre foi a marca da imensa maioria dos mandatários brasileiros, mas é sempre bom relembrar as funções de um vereador.
Em linhas gerais, é papel dele manter contato diário e direto com a população. Deve estar na comunidade, no bairro, ouvindo o povo que o escolheu como representante por quatro anos.
Cabe ao vereador fiscalizar, auxiliar e cobrar as ações do poder Executivo.
Outra função importante é legislar. Ou seja, o parlamentar deve elaborar projetos de leis e atuar nas comissões temáticas das câmaras municipais, analisando, relatando e votando matérias que em última instância vão mudar, para melhor ou para pior, a vida das pessoas.
Vereador mais votado do Rio em 2016, com 106.657 votos, Carlos é o parlamentar que menos vezes subiu à tribuna nos últimos anos. Também é econômico na produção legislativa: não apresentou um único projeto de lei em 2018. Nem em 2017.
Em Brasília, porém, vira um tigre.
Foi só o pai embarcar para Washington, onde se apresentará feito uma foca amestrada diante de Trump nesta terça, para Carlos se sentir à vontade para realizar conversas, de acordo com ele próprio sob orientação de Bolsonaro.
Sua presença em Brasília, nesta segunda, não constava na agenda de nenhum dos ministros do Palácio do Planalto, tampouco do presidente em exercício, Hamilton Mourão.
O vereador se sentiu à vontade para ir ao Twitter dizer que discutiu a “reforma da Previdência e outros assuntos”.
Com quem, e com qual objetivo?
A pergunta ganha relevância à medida em que ninguém do primeiro escalão, ou mesmo do segundo, ou do terceiro, ou do quarto, como queira, confirmou ter-se encontrado com o filho do presidente para falar sobre esse ou qualquer tema relevante.
Carlos sempre poderá alegar que às segundas não há sessão plenária na câmara dos vereadores do Rio, assim como não há às sextas-feiras.
Isso não justifica ele aparecer por lá apenas às terças, quartas e quintas, pois os debates em plenário, como já dissemos acima, constituem uma pequena parte do muito trabalho que se espera de qualquer vereador minimamente decente.
No célebre discurso que fez no dia da sua chegada aos Estados Unidos, ao lado de Steve Bannon e do guru Olavo de Carvalho, Jair disse que sua chegada à Presidência aconteceu meio que por acaso. “Nem a minha mulher acreditava”, falou, em tom de sinceridade.
Isto está obvio para mim, para você e para o Urubu do mercado do Ver o Peso em Belém do Pará.
Mas Carlos não precisa exagerar. Ele não é mais o vereador obscuro que usa o parlamento carioca “como meio de vida”. Ele agora, além de filho, é o mentor e estrategista sênior do pai que virou o mandatário número 1 do país.
Precisa se cuidar mais, preservar um decoro mínimo, manter ao menos as aparências. Sob o risco de cair junto com Jair.