Cármen Lúcia, no STF, atropela o CNJ que também preside. Por Marcelo Auler

Atualizado em 28 de fevereiro de 2018 às 12:08

Publicado no blog do jornalista Marcelo Auler.

Sepúlveda Pertence (à esq.) – que indicou Cármen Lúcia para o STF -, como advogado de Lula não conseguiu espaço na agenda da presidente do STF. (Foto: Ascom/STF)

Ao deixar sem resposta o pedido de audiência protocolado no último dia 22 de fevereiro pelo ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal (STF), Sepúlveda Pertence, a ministra Cármen Lúcia, que preside aquela corte, desrespeita uma recentíssima decisão – de 20 de fevereiro – do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que ela também preside. No mínimo Pertence deverá estar se questionando: a quem recorrer?

Pela decisão do CNJ, adotada por unanimidade acolhendo o voto da relatora Daldice Maria Santana de Almeida, no Pedido de Providências (nº 0004620-26.2016.2.00.0000), magistrados devem atender aos advogados, independentemente de estarem ou não agendados. O Conselho entendeu que isso é uma garantia legal, prevista no Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e na própria Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN).

Curiosamente o pedido de audiência de Pertence, recém-contratado para reforçar a defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos tribunais superiores de Brasília, foi protocolado dois dias depois da decisão do CNJ. Do encontro deverão participar ainda os dois tradicionais defensores do ex-presidente, José Roberto Batochio e Cristiano Zanin Martins.

Os três visitam os ministros do STF para a entrega de “memorial”.  Um documento em que as partes de um processo relacionam as teses que defendem na causa. No caso trata-se de um Habeas Corpus preventivo – HC 152.752 – para evitar que Lula venha a ser preso, se confirmada a decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). O Tribunal do Sul, como se sabe, não só confirmou a condenação decretada por Sérgio Moro como ainda aumentou a pena para 12 anos e 1 mês de forma a não beneficiar o condenado com a prescrição.

A decisão do CNJ atendeu a uma reclamação da seccional da OAB no Ceará onde duas juízas de Varas Cíveis estariam criando empecilhos  para o atendimento dos advogados. Acatando o voto da relatora, o plenário deixou claro que a limitação do atendimento a alguns dias da semana viola a prerrogativa profissional do advogado.

Apesar disso, a ministra Cármen deixou o ministro aposentado sem qualquer resposta desde o dia 22, ou seja, há uma semana.

Verdade que os ministros do Supremo não estão subordinados às decisões do CNJ. Mas, ainda assim, soa mal, a presidente do Conselho não cumprir o que ele decidiu.

Para Cármen o caso de Lula é bastante emblemático justamente por conta do ingresso de Pertence na causa. Afinal, os dois são amigos desde o tempo em que Cármen atuava como procuradora do Estado de Minas Gerais. O ex-ministro do STF foi o responsável pela indicação dela para a cadeira do Supremo quando da aposentadoria do ministro Nelson Jobim, em 2006.

No cargo de ministra, como noticiamos aqui no Blog em “Lula terá salvo conduto do STF”. Será?, ela tem se considerada impedida de julgar processos em que Pertence apareça como parte. Poderá adotar a mesma medida na apreciação do HC preventivo impetrado pela defesa de Lula. Com isso, Dias Toffoli assumiria a presidência da sessão.

Há ainda a possibilidade de ela estar aguardando o julgamento de um Habeas Corpus parecido – HC 434.766 – no Superior Tribunal de Justiça. Ali, a liminar foi negada pelo ministro Humberto Martins, vice-presidente no exercício da presidência do tribunal, durante o recesso de janeiro. Este julgamento está marcado para quinta-feira (01/03).

Ali, o relator dos casos da Lava Jato é o ministro Félix Fischer, oriundo do Paraná. Segundo informam advogados que atuam nos muitos processos da Operação, o atendimento aos seus pedidos têm sido negados invariavelmente, não apenas pelo relator como pela 5ª Turma. Além de Fischer, participarão da votação Jorge Mussi, Reynaldo Soares da Fonseca, Marcelo Navarro Ribeiro Dantas e Joel Ilan Paciornik.

A perspectiva, segundo advogados que acompanham os casos da Lava Jato, é que a 5ª Turma, mesmo tendo alguns ministros considerados “ponderados”, eles não queiram modificar o entendimento já manifesto pelo próprio STJ, em consonância com a decisão do STF, de 2016.

O próprio vice-presidente do STJ, ao negar a liminar no recesso do judiciário, deixou claro seu entendimento favorável à prisão dos condenados em segunda instância. Logo, dificilmente no julgamento desta quinta-feira haverá uma mudança de posição naquela corte. O caso ficará mesmo para ser decidido no Supremo, com todas as dificuldades que isso possa trazer à sua presidente.

Ali, a pressão dos ministros têm sido grande. Já houve uma manifestação expressa, pública, do decano da corte, ministro Celso de Mello, e dos ministros Ricardo Lewandowski e Edson Fachin ao deixarem de apreciar dois pedidos de Habeas Corpus, na 2ª Turma, remetendo-os à apreciação do plenário.

O mesmo ocorreu quando Fachin apreciou o HC preventivo de Lula. Para negar a liminar, deu uma explicação técnica, de que o Supremo não costuma examinar liminarmente um caso antes de o mérito ser julgado no STJ. Mas, na decisão, ele fez questão de registrar que o assunto merece ser visto no plenário e não na turma, por tratar-se de uma questão de constitucionalidade da medida adotada em 2016 pelo próprio STF, quando autorizou a prisão após condenação em segunda instância. Foi um placar apertado, de 6 a 5.

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