Caro Noblat: desde quando ‘conquistar’ Marcela faz de Temer um guerreiro? Por Nathalí Macedo

Atualizado em 28 de novembro de 2016 às 18:27

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No jornalismo de guerra da Rede Globo, desonestidade intelectual é tão comum que já não indigna ninguém. O país já compreendeu a serviço de que(m) o jornalismo global trabalha, e quem tinha de boicotar a emissora já o fez, a começar pelos seus próprios funcionários (Alô, Mônica Iozzi!)

Devemos, porém, ressalvar: Ser intelectualmente desonesto é uma coisa. Expor-se ao ridículo, outra.

Ricardo Noblat, aparentemente, faz os dois.

Foi dele a mais patética pergunta da mais patética edição do Programa Roda Viva, da TV Cultura (que, nada mais justo, deixará de usar a vinheta do ilustríssimo Chico Buarque, por vontade do próprio artista):

“Como o senhor conheceu a Marcela?”

Depois, no Twitter, Noblat fez questão de ratificar a vergonha: “Com todo respeito: Quem conquistou dona Marcela não se deixa abater por nenhuma dificuldade.”

O jornalista já dera sinais, também no Twitter, de seu apreço indisfarçável pela família Temer.

“Uma coisa que eu jamais observara: como Temer é um senhor elegante. Quase diria bonito. A senhora dele, também.”

Precisava?

Bem, quem vai resolver a paixão reprimida de Noblat por Michel Temer eu não sei, mas, por ora, deem-me licença para a “patrulha feminista” nossa de cada dia: mulher não é território conquistado e não pode – ao menos não no século XXI – servir como demonstração de bravura do homem que a “conquista.”

A Globo e o próprio governo tratam Marcela Temer como um objeto apaziguador, aquela que trará a ternura e a suavidade a um governo macabro, de tão terrível, mas, por incrível que pareça, ela ainda é um ser humano. Uma mulher.

Na maioria das guerras, mulheres são espólio. O sujeito de guerra é o homem – a quem cabe toda a bravura e a quem pertence todo o poder – e o objeto, o prêmio, o espólio, é a mulher.

Parece ser esta, então, a lógica que segue Noblat ao dizer que quem “conquistou” Marcela não se deixa abater por nenhuma dificuldade”, numa tentativa atabalhoada de limpar a barra do chefe.

Receio, entretanto, que nem a isso sirva o vergonhoso tweet de Noblat: a imagem pusilânime de Temer não pode ser quebrada tão facilmente. Não depois daquela carta cheia de termos em latim. Não depois de um golpe tão covarde. Não depois da fala medrosa na abertura das Olimpíadas. Não (mesmo) depois que tantos artistas brasileiros retrataram a ele e aos seus aliados como ratos.

O comentário infeliz (e desnecessário) de Noblat serviu apenas à perpetuação do que há de mais antiquado e desrespeitoso no tocante à luta de gêneros: a nossa velha conhecida objetificação, a mulher vista, como sempre foi, como troféu para os homens.

Lamentável, é verdade, mas nós estamos falando de um jornalista direitista da globo (perdão pela redundância), e, de quem se presta a tal papel, não se pode esperar nada além de atraso e vergonha alheia.