Casa Civil, de Braga Netto, coordena oficialmente grupo para propor ações de governo. Por Eduardo Maretti

Atualizado em 14 de abril de 2020 às 21:52
Os ministros da Saúde, Luiz Henrique Mandetta e da Casa Civil, Braga Netto, participam da coletiva de imprensa no Palácio do Planalto, sobre as ações de enfrentamento no combate ao coronavírus

Publicado originalmente no Brasil de Fato

Por Eduardo Maretti

Diante da incapacidade de liderança e articulação do presidente Jair Bolsonaro, escancarada pela sua postura frente à pandemia do novo coronavírus, a influência do general Walter Braga Netto já ultrapassa oficialmente suas funções de ministro chefe da Casa Civil, exercendo, cada vez mais, as atribuições de “presidente operacional”. O Diário Oficial da União desta terça-feira (14) publicou uma resolução pela qual cria um grupo de trabalho interministerial que irá coordenar ações de recuperação da economia, integrado por membros de 15 ministérios e a Advocacia Geral da União.

Leia a resolução aqui.

O “Grupo de Trabalho para a Coordenação de Ações Estruturantes e Estratégicas para Recuperação, Crescimento e Desenvolvimento do País”, como é denominado, deverá apresentar a Braga Netto relatórios parciais de suas atividades a cada 15 dias.

O grupo – claro esvaziamento dos poderes do “superministro” da Economia, Paulo Guedes – atuará por até 90 dias, segundo prevê a resolução. Ao final desse prazo deverá apresentar ao ministro Braga Netto um Plano de Trabalho com “proposta de ações estratégicas para recuperação e retomada do crescimento econômico”.

Entre as atribuições do grupo de trabalho está a de “propor diretrizes para a destinação de emendas parlamentares por meio de articulação com o Congresso Nacional”.

Outras competências são propor “ações estruturantes para a retomada das atividades afetadas pela covid-19 em âmbito nacional” e fazer a articulação com estados, municípios, Distrito Federal e empresas públicas e privadas de ações coordenadas para a retomada.

O cientista político e ex-presidente do PSB Roberto Amaral vê uma crise institucional já instalada no país. “Temos uma presidência maluca e um governo de front. Não se sabe se a ponta do governo é o Bolsonaro, se é o general chefe da Casa Civil (Braga Netto), se é o ministério da Saúde. E o governo sem políticas sanitárias e de desenvolvimento. Ou seja, um governo perdido.”

Para ele, o horizonte é nebuloso. “Entre o final de maio e o mês de junho, o Brasil assistirá ao encontro, no alto, de duas curvas: a da pandemia de coronavírus, com suas consequências, e a curva da recessão, da parada da economia. E o fundo dessas duas crises é outra crise, a institucional” diz.

Em sua opinião, a esse quadro caótico, se avizinha para o segundo semestre outra grave crise, a social. “Qualquer que seja o governo vigente em julho, porque nós não sabemos, será um governo sem força, sem legitimidade, institucionalmente fraco e sem liderança nacional.”

Os fatores econômicos são claros. Cálculos do Fundo Monetário Internacional (FMI) dão conta de que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro sofrerá uma brutal retração de 5,3% em 2020. A expectativa de janeiro, na análise do fundo, era de expansão de 2,2% em 2020.

Já na questão do emprego, depois de quatro anos de crescimento fraco e uma expansão “pífia” de 1,1% do PIB em 2019, o cenário é igualmente preocupante. Segundo cálculos do Dieese, os desempregados devem passar dos 17 milhões e podem chegar a 20 milhões de desempregados nos próximos meses.

Na opinião de Amaral, a esquerda brasileira não está devidamente esclarecida sobre o que está por vir. “Não estou vendo a gente se preparar para essa grande crise social do segundo semestre. Estamos nos perdendo na análise do aqui e agora, nas aparências e superficialidades. Por exemplo, se (o ministro da Saúde Luiz Henrique) Mandetta cai ou não cai, se o ‘capitão’ foi à padaria, se não foi, quando a coisa é mais profunda.”

Do lado do comando do país, no momento de uma crise inédita que abarca todos os setores, o país precisaria de um governo que o liderasse, considerando inclusive o modelo de regime  presidencialista vigente. “Não há nenhuma condição do Bolsonaro liderar o país, até porque ele tem demonstrado que não está interessado nisso, mas em liderar uma facção.”

Roberto Amaral mora no Rio de Janeiro e diz à reportagem que está seguindo a quarentena rigorosamente. “Porque tenho 80 anos. Minha filha faz as compras e deixa na portaria. É muito complicado”, diz.

Os números oficiais mais recentes da pandemia de coronavírus, divulgados nesta terça, avançam no país, que registrou 204 mortos nas últimas 24 horas, chegando a um total de 1.532 óbito, com o número de casos chegando a 25.262.  O estado de São Paulo registrou 9.371 casos confirmados e 695 mortos, dos quais 87 nas últimas 24 horas, recorde até o momento.