Celso Russomanno pede à Justiça Eleitoral para fechar o DCM e perde a liminar

Atualizado em 8 de outubro de 2020 às 23:05
Celso Russomanno. Foto: Reprodução/DCM

O candidato do Republicanos à Prefeitura de São Paulo, Celso Russomanno, pediu ao titular da 2a. Zona Eleitoral de São Paulo a retirada do Diário do Centro do Mundo (DCM) do ar.

O pedido, que viola a liberdade de expressão e a de imprensa protegidas pela Constituição, foi feito em razão de um artigo de minha autoria, que o DCM publicou em 2012, quando Russomanno foi candidato a prefeito de São Paulo pela primeira vez.

O artigo, “As duas faces do Celso Russomanno que eu conheci em 1992”, é, em resumo, a atualização do perfil do político que realizei e que foi publicado pela revista Veja em 1994, quando ele foi o deputado federal mais votado no Estado de São Paulo.

O ano de 1992 é uma referência à primeira vez que o encontrei, para uma entrevista sobre o assassinato do governador do Acre Edmundo Pinto no hotel Della Volpi, em São Paulo, para o qual Russomanno fazia assessoria de imprensa.

Em 1994, para escrever o perfil, passei o dia todo com Celso Russomanno, oportunidade em que, além da entrevista, pude descrever sua rotina. Nada diferente do que se faz com todas figuras públicas — com a presença do repórter, é claro, consentida por estas.

Todas as informações publicadas naquele artigo foram colhidas junto ao então deputado eleito. E as denúncias lhe foram apresentadas para que tivesse a oportunidade de se manifestar, o que ele fez, e foi registrado no artigo, tanto o original quanto o de  atualização.

Em ambas as publicações, o interesse jornalístico era evidente. Em 1994, o cidadão tinha o direito de saber quem era o deputado mais votado por São Paulo. Em 2012, a mesma coisa. Quem quer governar uma das maiores cidades do mundo deve ser conhecido pelo público.

Evidentemente, nem tudo o que o jornalista publica agrada ao perfilado. Por isso, é jornalismo. Do contrário, seria propaganda.

Além da retirada do site do ar, Celso Russomanno fez dois pedidos alternativos: que a matéria seja excluída da rede e que o DCM seja proibido de voltar a publicá-la.

O juiz Guilherme Silva e Souza negou o pedido, com o argumento de que a reportagem foi publicada em 2012 e que, portanto, não há fato novo que justifique a medida.

“No caso dos autos, sem adentrar ao mérito da demanda, a matéria jornalística ora questionada foi veiculada pelo site de notícias no remoto ano de 2012, o que, por si só, afasta qualquer urgência à medida judicial reclamada no caso concreto”, escreveu.

Os advogados de Russomanno também alegaram que a reportagem já estaria sendo compartilhada por grupos de WhatsApp. O juiz lembrou que o candidato não apresentou nenhuma evidência que sustente essa afirmação.

Ainda que fosse verdade, como o DCM pode controlar o que é publicado em grupo de WhatsApp? Disse o juiz:

“Sopesada a condição atual do representante, candidato na eleição majoritária da capital paulista, inexiste nos autos qualquer prova da pretensa circulação do conteúdo através de aplicativos de mensagens iniciada em data recente, provável divulgação anterior da matéria com amplitude, inalterada a situação fática a partir da candidatura, mais uma circunstância a corroborar o entendimento ora adotado”.

A reportagem, como é sabido, foi publicada pela primeira vez em 1994, quando eu era subeditor de Veja, e se encontra disponível no site da revista.

Por que Russomanno não pediu a exclusão da reportagem da revista? Por que não teve a mesma repercussão? Talvez.

Mas o fato que esta não é a primeira vez que o candidato tenta silenciar este jornalista.

Em 2012, logo depois que o artigo foi publicado pelo DCM, com as atualizações necessárias, fui procurado por um assessor da campanha de Russomanno, com quem eu havia trabalhado na revista.

Ele dizia falar em nome de Russomanno e propôs que eu fosse trabalhar na campanha. Russomanno era, na época, o líder das pesquisas.

Obviamente, rejeitei, sobretudo por razões éticas. Pareceu-me evidente que o objetivo dele era comprar o meu silêncio.

Agora, ele tenta o silêncio pela via judicial, com a tentativa de fechar o site e, para isso, se apegou a uma falta de atualização cadastral.

Explica-se: o DCM foi um blog criado pelo jornalista Paulo Nogueira, quando ele ainda era correspondente da editora Globo em Londres.

Quando deixou a empresa, Paulo Nogueira registrou o domínio em seu nome e, em 2012, se associou ao irmão, Kiko Nogueira, para transformá-lo em um portal, como é hoje.

Em junho de 2017, Paulo Nogueira faleceu, mas, no provedor, o domínio continuou em nome da pessoa física dele, embora o DCM já fosse propriedade de uma pessoa jurídica que tinha os dois como principais acionistas.

Para os advogados de Russomanno, essa desatualização cadastral seria motivo suficiente para fechar o DCM. Um absurdo tão grande que, em seu despacho, o juiz nem menciona esse pedido.

O DCM continuará a praticar jornalismo de qualidade, seguindo uma linha editorial que é pública desde sua fundação, a defesa do Brasil escandinavo, ou seja, contribuir para a promoção da equidade, princípio que pode ser traduzido em uma frase:

“Unir as pessoas em torno da ideia de um país justo”.

O fechamento de um veículo de comunicação ou a censura de uma reportagem não são próprios desse país que buscamos.

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O escritório Francisco Ramos Advogados Associados, que defende o DCM, emitiu a seguinte nota:

Na nossa atuação cotidiana, estamos percebendo que a Justiça Paulista tem se incomodado bastante com a postura tacanha de alguns candidatos. A justiça não é palanque: é pilar.

Associada aos Poderes Executivo e Legislativo, compõe aquilo que alguns insistem em não compreender como Estado Democrático de Direito. A utilização do processo judicial como mecanismo de promoção pessoal, além de vergonhosa, é suicida.

O direito existe pra ser reivindicado. Aguardar oito anos para a supressão de uma suposta inverdade revela o oportunismo existente por trás da demanda: Russomano não busca um direito, mas sim parece querer tomar carona em um dos mais importantes veículos de informação e opinião da mídia atual.

Essa postura lembra muito o caso do helicoca quando o Zezé Perrella quis sumir com esses registros justamente em ano eleitoral. E não conseguiu.

Além do Direito, temos a verdade como aliada.

Estamos confiantes que o indeferimento liminar será confirmada em juízo de cognição exauriente.

O absurdo até tenta se sustentar. Contudo a física é implacável e a gravidade inevitável e assim como o direito, todos estamos sujeitos à essas forças, esteja você a direita, a esquerda ou no centrão.