Por Leonardo Sakamoto
O vereador Carlos Bolsonaro, filho 02 do ex-presidente Jair Bolsonaro, é alvo de uma operação da Polícia Federal, nesta segunda (29), sobre pessoas que teriam sido destinatárias de informações produzidas por espionagem ilegal durante o governo de seu pai. Dessa forma, a Abin Paralela se encontra com o Gabinete do Ódio.
Agentes da PF realizaram mandados de busca e apreensão na residência do vereador (no mesmo condomínio Vivendas da Barra, onde seu pai também tem casa) e no seu gabinete, na Câmara do Rio. É difícil imaginar que a paranoia de Carluxo manteria material ilegal em sua casa ou trabalho, mas sua equipe pode não ter sido tão cuidadosa.
Comentei aqui logo após a operação que teve como alvo o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência, o deputado federal Alexandre Ramagem, na semana passada, que a óbvia conexão surgiria mais cedo ou mais tarde. Afinal, o governo Bolsonaro não ficaria satisfeito em espionar seus desafetos apenas para proteção pessoal. Eles usariam as informações como munição de forma sistemática.
Rodrigo Maia deu elementos para confirmar essa suspeita quando afirmou ao UOL que desconfiava estar sendo monitorado quando presidente da Câmara dos Deputados, uma vez que suas reuniões eram alvo de ataques de bolsonaristas radicais nas redes sociais tão logo aconteciam. O que aponta que tanto ele quanto os seus interlocutores eram monitorados.
A PF vem revelando como funcionava a máquina de espionagem de Jair Bolsonaro entre 2019 e 2022. Pelas informações até o momento, já podemos dizer que esse é um dos maiores escândalos desde o fim da ditadura militar. E estamos apenas no começo, porque essa investigação é apenas sobre o software israelense First Mile, usado para monitorar o deslocamento.
E grampos em celulares? E a espionagem usando órgão públicos, como a Receita Federal?
Bolsonaro já havia instalado o Gabinete do Ódio nas dependências do Palácio do Planalto, com pessoas pagas pelo erário para atacar adversários políticos, partidos, juízes, jornalistas, como apontaram depoimentos na CPMI das Fake News. Atribuiu-se a Carlos Bolsonaro a responsabilidade pela montagem e coordenação do tal gabinete, mesmo que não tivesse cargo oficial no governo de seu pai.
Em sua delação premiada, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-faz-tudo de Jair, confirmou que três assessores presidenciais usavam essa estrutura no Planalto para produzir conteúdo difundido pelo bolsonarismo nas redes sociais e aplicativos de mensagens para atacar instituições.
O Gabinete do Ódio, segundo ele, era formado por Tércio Arnaud Tomaz, José Matheus Sales Gomes e Mateus Matos Diniz subordinados a Carlos Bolsonaro, que ditava o que deveria ser produzido.
A PF pode mostrar como a estrutura de ataque a pessoas vistas como entraves aos planos do bolsonarismo era abastecida por outra estrutura que atropelava garantias constitucionais e liberdades individuais, esvaziando a privacidade e fazendo arapongagem na vida pessoal e profissional de milhares de brasileiros.
Isso comprovaria, mais uma vez, que vivemos sob um governo de características autoritárias, que vigiava a todos e, ao primeiro sinal de algo que poderia ir contra seus interesses, acionava suas milícias digitais visando a neutralizar a “ameaça” a fim de garantir a sua perpetuação no poder.
Essa constatação não é exatamente surpreendente. Quando ele ainda era candidato à Presidência da República, em 2018, os que tinham apreço pela democracia avisaram que ele dobraria as leis e as instituições do Estado brasileiro às suas próprias necessidades.
Na fatídica reunião ministerial de 22 de abril de 2020, isso ficou explícito. “Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira”, disse ele.
Ele falava sério quando disse “não estamos aqui pra brincadeira”. Ao longo de seu mandato, enfraqueceu ou sequestrou instituições públicas do Poder Executivo voltadas ao monitoramento e controle. Pior: dobrou órgãos à sua vontade, como a Polícia Rodoviária Federal – que ajudou em ações golpistas ao dificultar a votação de eleitores de Lula e fazer vistas grossas ao golpismo nas estradas.
É conhecida a preocupação de Jair com o filho 02, estrategista de suas redes digitais e que não conta com foro privilegiado ao contrários dos irmãos Flávio e Eduardo. Essa preocupação deve ter subido um pouco mais nesta segunda. Com isso, os aliados do ex-presidente devem dobrar a artilharia contra a PF, o MPF e o STF. Exercem, dessa forma, seu direito de espernear diante da percepção de que o cerco da lei está se fechando.
Originalmente publicado no Uol
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