Não é de hoje que o Supremo Tribunal Federal vem se transformando num grande circo onde o centro do picadeiro serve de palco para os mais escatológicos episódios da vida política nacional.
Numa contradição em si mesma, a mais alta Corte do poder judiciário brasileiro vem abdicando de suas prerrogativas constitucionais para ingressar de cabeça numa seara eminentemente partidária.
Como absurdo pouco é bobagem, essa investida segue na exata contramão ao que alguém poderia imaginar como uma tentativa, tão ingênua quanto inócua, de fortalecer e estreitar as relações institucionais entre os poderes com a devida atenção à manutenção da sua imprescindível independência.
Muito pelo contrário, o STF não só se diminui como garantidor e mantenedor da legalidade constitucional nos eternos conflitos republicanos, como se prosta voluntariamente como um mero vassalo do que de pior já foi produzido no nosso combalido sistema político.
Não é fácil determinar com exatidão o estrago que a gestão da ministra Cármen Lúcia causou na imagem da casa enquanto esteve na sua presidência. Mas o certo é que hoje (13), exatos dois meses após a sua posse, Dias Toffoli já provou que o acovardamento de seus pares não é só uma questão de estado de espírito, é, sobretudo, uma vergonhosa vocação.
De tão inútil, chega a ser patético o incômodo que a fala do comandante do exército, general Eduardo Villas-Bôas, causou nos ministros do STF ao admitir que pressionou publicamente os ministros da Corte ao não concederem o Habeas Corpus ao ex-presidente Lula quando assim exigia o Código do Processo Penal e a Constituição Federal.
Ao terem cedido à pressão, mostraram que no Brasil quem conduz o direito não são as leis, mas sim o calendário político. E, portanto, muito mais do que juízes, atuam como meros tabeliães de interesses escusos.
Por si só já seria a desmoralização última do que algum dia representou a última barreira contra o completo estado de desordem de uma nação. Mas como nossa realidade não cansa de demonstrar, sempre encontramos formas de piorar o que já é terrível.
Consumado o triste episódio em que um cidadão brasileiro, por acaso eleito democrática e soberanamente presidente dessa República por dois mandatos, foi privado de seus mais básicos direitos em função de um único twitter de um militar, Toffoli ainda teve a brilhante ideia de trazer para a Suprema Corte mais um general a assessorá-lo (ou comandá-lo).
Numa época em que uma reedição de 64 nunca esteve tão em moda, conceder um gabinete no STF a mais um velho de verde-oliva poderia parecer para o mais humilde dos seres pensantes uma ideia das mais inoportunas e estapafúrdias.
Mas eis que os pontos uma hora se ligam.
Decisivo para o resultado das eleições, o STF, por assim dizer, agora assume de fato uma cadeira de ministro no Poder Executivo nacional.
A indicação do general Fernando Azevedo e Silva para o Ministério da Defesa, o mesmíssimo cidadão que ajudou a formular propostas para a campanha de Bolsonaro e a quem Toffoli abarcou no STF, sela o que uma mente não necessariamente muita esperta já poderia supor como um, digamos, “grande acordo nacional”.
A patacoada não estaria completa se, em nota, Dias Toffoli não tivesse informado oficialmente que foi previamente consultado pelo presidente eleito e dado sua bênção como uma “excelente escolha”.
Como podemos ver, Eduardo Bolsonaro não estava brincando quando afirmou que bastariam um soldado e um cabo para fechar o STF.
Mas o fato é que “tamanho esforço” só faria sentido se realmente existisse alguma força contrária a combater.
Como contrapor a barbárie e o estado de exceção que se ergue sob o comando de um desequilibrado é tarefa digna demais para os atuais membros do Supremo Tribunal Federal, nada mais natural do que seguir o que o atual presidente uma vez disse num de seus noturnos e “republicanos” encontros na garagem do Palácio do Jaburu:
“Tem que manter isso aí, viu? ”
Definitivamente, claro está, não tem porque Bolsonaro fechar o STF. A Suprema Corte já faz parte de sua cozinha e os ministros, seus leais serviçais.