O desabafo de uma advogada que perdeu tudo na enchente sintetiza os crimes ambientais por trás de calamidades como as que atingem o Espírito Santo ou as tragédias de Mariana e Brumadinho.
Desde o dia 17 de janeiro o estado é atingido por chuvas que já deixaram mais de 8 mil pessoas desabrigadas ou desalojadas, nove mortas e três desaparecidas.
Cidades do interior foram destruídas pela força das águas, comparadas a um “tsunami de água doce” pelo porta-voz do Corpo de Bombeiros.
A advogada Carla Joana Magnago, moradora da cidade de Alfredo Chaves, foi uma das vítimas. Seu post no Facebook vai direto ao ponto.
Aborda o que muitos gestores públicos desprezam, ao operar comprometidos apenas com os lucros do empresariado e a perpetuação do poder político.
“O que sobrou da minha casa. Meu Grau de Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo.
Alfredo Chaves, 19 de janeiro de 2020, na maior enchente da história do Município, fruto da ganância de empreiteiros que socaram prédios numa cidade de cultura histórica, derrubando casas com séculos de história viva pra subir prédios sem vagas nas garagens para os carros que superlotam as ruas da cidade estacionados e impedem também qualquer chance de turismo local.
De pecuaristas que comeram as matas pra criar gado. De empresários que só pensam no próprio bolso e estão acabando com o Plano Urbano e Arquitetônico de nossa cidade enfiando aterros, condomínios e loteamentos.
Fruto de obras claramente irregulares. Fruto de crimes ambientais de todo tipo que prescrevem!
Fruto de construções desenfreadas que atendem a uma parcela muito bem definida de privilegiados locais. Fruto de descaso, de negligência. Fruto de irresponsabilidade e corrupção.
Fruto da inércia dos órgãos fiscalizadores. Fruto do profundo despreparo de gente que não sabe planejar a cidade, mas que é encarregado de fazê-lo.
Fruto da ausência de uma economia sustentável. Fruto da abertura desenfreada de estradas por gente que se pudesse defecaria no próximo.
Fruto de diversas alterações irregulares do curso do nosso rio. Fruto da total ausência de contenção e contingência de uma tragédia anunciada.
Fruto de um plano de ação mesquinho, egoísta e burro para a especulação imobiliária milionária que em dez anos contribuiu para a ocorrência de duas catástrofes de enormes proporções com vítimas fatais. Fruto de alterações climáticas que a ganância provocou.
Em poucos anos a natureza que vem sendo pisoteada pelo nosso município levará a nossa cidade do mapa. A natureza cobra. Aí ficarão meia dúzia de herdeiros construindo prédios pra ninguém morar, porque até lá terão matado todo mundo.
Comam dinheiro e bebam lama, vocês venceram”.