Você conhece a obra de Judith Butler? Nem eu. Mea culpa.
Aos 61 anos, nascida em Cleveland, Ohio, a filósofa pós-estruturalista é o principal nome da teoria queer.
Céli Regina Jardim Pinto, professora titular do Departamento de História da UFRGS, explica a importância dela num artigo no Sul21.
Mas não é sobre Judith Butler e seu trabalho que eu queria falar.
Butler, por óbvio, não é um tremendo sucesso de público — ou não era, até que as milícias direitistas brasileiras a transformassem numa celebridade, num acontecimento.
Sua palestra no Sesc Pompeia, em São Paulo, no seminário “Os Fins da Democracia”, esgotou em tempo recorde, para surpresa dos organizadores. Mesma coisa aconteceu no Rio.
Ela já esteve por aqui em outras ocasiões, mas agora é um estouro. Seus livros estão sendo mais procurados. Seus vídeos no YouTube ganharam acessos.
Tudo graças à imbecilidade coletiva de extremistas que resolveram empreender uma caça às bruxas com ela, perigosa agente disseminadora da ideologia de gênero, a encarnação do diabo para todo débil mental falso moralista.
Mais de 300 mil pessoas que nunca chegaram perto de um livro de Judith Butler participaram de um abaixo assinado contra sua apresentação.
O negócio está no site CitizenGo, que se define como uma plataforma que, “partindo de uma visão cristã do ser humano e da ordem social”, quer “oferecer a todos os cidadãos uma ferramenta de participação e aprimoramento de nossa sociedade”.
O sujeito assina a petição afirmando que “sua presença em nosso país num simpósio comunista (sic), pago com o dinheiro de uma fundação internacional, não é desejada pela esmagadora maioria da população nacional.”
Além de se colocar como porta vozes de uma suposta maioria, os fascistas querem PROIBIR que a mulher fale. Ora, não era mais fácil fazer um “simpósio” próprio?
Não, porque a lógico desse obscurantismo é o veto, o cala boca. Esse raciocínio vagabundo provoca o efeito contrário. Faz com que a exposição Histórias da Sexualidade, no Masp, por exemplo, outro alvo das milícias, esteja bombando.
De acordo com a assessoria de imprensa do museu, houve 18 mil visitantes em dez dias (até o domingo, 29). Isso representa 80% a mais que no mesmo período do ano passado. Até Polenguinho vende mais graças a eles.
O MBL, como de hábito, puxa a carroça da censura contra Judith Butler.
Atrás dos kataguiris, vêm baluartes da ética e dos bons costumes como o ex-ator pornô Alexandre Frota e o pastor deputado Marco Feliciano (que, num vídeo, demonstrou não saber sequer o nome de sua inimiga).
O padre Paulo Ricardo, o Malafaia da Igreja Católica, olavete de carteirinha, garante que “ideólogos” como Butler “objetivam agora atingir o sistema educacional cooptando as crianças desde mais tenra idade, pois assim fica mais fácil moldá-las”.
Segundo o velho PR, “desejam educá-las para escolha do seu objeto de satisfação sexual, não importando qual, pois todos são possíveis. Querem, em última análise, formar uma sociedade sexualmente versátil. Pode parecer loucura, absurdo, mas é a realidade. Já está sendo implantada aqui mesmo no Brasil. Não se engane. Trata-se de uma estratégia demolidora, revolucionária cujo objetivo maior é destruir a família”.
Bolsonaro ainda não se manifestou, mas até Roberto Jefferson, ladrão rematado, preso por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, denunciou Judith por “corromper os valores da sociedade”.
Em entrevista ao Jornal Extra Classe, ela declarou que seus detratores a consideram “um fantasma”: “Eles pensam que talvez eu seja um pesadelo vindo para a cidade”.
O Brasil emburreceu — e ganhou uma cambada de degenerados fazendo propaganda reversa com sua degenerescência mental.
Obrigado Feliciano estamos juntos pic.twitter.com/bITonhOg0G
— Alexandre Frota (@alefrotabrasil) October 31, 2017