Como Bolsonaro, Hitler e Mussolini tinham “aversão instintiva” a entrevistas

Atualizado em 30 de agosto de 2022 às 16:29
Jair Bolsonaro e Adolf Hitler
Jair Bolsonaro e Adolf Hitler. (Crédito: AFP/Hulton Deutsch)

Bolsonaro deixou nesta terça-feira 30 uma coletiva após ser questionado sobre sua relação com o Centrão. 

Ele conversava com jornalistas sobre a necessidade de “aprovar projetos” e, para isso, levar em conta os 513 deputados. Um repórter mencionou o apelido “tchutchuca do Centrão” e o sujeito estrilou. 

“Você não tem classe para fazer uma pergunta? Quem é tchutchuca do Centrão? Me apontem ministérios entregues para políticos”, respondeu.

Um jornalista, então, perguntou-lhe se o Ministério da Cidadania não teria sido entregue ao Centrão, com João Roma (ex-Republicanos, hoje no PL). Um outro lembrou da indicação do Republicanos para a Cidadania. 

“Não dá para conversar com vocês”, reclamou Bolsonaro, puxando o carro. No domingo, dia 28, ele atacou Vera Magalhães após um questionamento sobre vacina. Sua campanha decidiu que ele não deve mais participar de sabatinas e debates.

Bolsonaro não sabe ser questionado. Em quatro anos, acostumeu-se à atmosfera bovina do cercadinho.

No Washington Post, Federico Finchelstein, autor de “Uma Breve História das Mentiras Fascistas”, escreveu sobre Trump e como canalhas autoritários lidam com questões incômodas. Alguns trechos:

Adolf Hitler entendeu a centralidade da propaganda – e, portanto, do controle sobre a imprensa – para alcançar e manter um poder político permanente. Em “Mein Kampf”, escreveu ele, “a propaganda deve ser ajustada às grandes massas em conteúdo e forma, e sua solidez deve ser medida exclusivamente por seu resultado efetivo”. É por isso que ele também argumentou que o Estado “deve exercer particularmente um controle estrito sobre a imprensa. Não deve se deixar confundir pela baboseira sobre a chamada ‘liberdade de imprensa’”. (…)

Em 1932, um dos poucos jornalistas americanos a entrevistar Hitler, Hans Kaltenborn, explicou que “Adolf Hitler tem uma intensa aversão instintiva a entrevistas. Esse homem, cujos ‘palpites’ sobre o que fazer e cuja estranha noção de quando fazê-lo surpreendem o mundo, pensa melhor e decide com mais astúcia quando está sozinho. Ele não gosta de falar com estranhos porque eles o intimidam. Ele compensa sua timidez com uma auto-afirmação rouca na presença deles. Em vez de responder às perguntas de um entrevistador, ele faz discursos entusiasmados, procurando assim criar para si mesmo a atmosfera de reunião pública que faz com que se sinta em casa.”

Kaltenborn esperava que a entrevista esclarecesse as operações nazistas, particularmente a mentalidade racista e antidemocrática de seus líderes. Mas suas perguntas sobre o antissemitismo de Hitler e suas visões da ditadura entraram em conflito com um elemento central da cartilha fascista: “fuhrerprinzip”, a ideia de que os líderes estão corretos o tempo todo, e o resto de nós, jornalistas incluídos, devemos aceitar sua explicação sem perguntas. .

É por isso que, como Kaltenborn explicou: “Desde o início de sua carreira pública, Hitler evitou contato pessoal com homens que discordam dele. Ele está tão ciente de sua incapacidade de persuadir os indivíduos quanto de sua habilidade em atrair as massas. Não mais de uma dúzia de jornalistas estrangeiros tiveram acesso individual a ele em tantos anos.”

Kaltenborn sentiu que era capaz de fazer perguntas críticas a Hitler. Insatisfeito com o questionamento, porém, Hitler apenas afirmou seu antissemitismo, sua identificação fascista com Mussolini e sua vocação ditatorial. Em outras palavras, ele apenas se concentrou em repetir suas grandes mentiras.

É por isso que ditadores como Hitler preferiam fazer entrevistas com aqueles que os idolatravam – não jornalistas independentes e profissionais – para que pudessem estender seu culto ao evitar perguntas críticas.