Luiz Henrique Mandetta virou, para uma parte da mídia, um exemplo de competência no meio de jagunços analfabetos.
Isso não se ampara em fatos, mas na opinião de Elio Gaspari, colunista da Folha e do Globo que no último dia 4 chamou Mandetta de “êxito” e “bem-sucedido” num pendant com Tereza Cristina, da Agricultura.
Gaspari aponta o dedo e os coleguinhas o seguem.
“Pode-se discordar de algumas de suas ideias, ou mesmo de todas, mas deve-se reconhecer que fazem seus serviços”, disse o jornalista, acaciano.
Quais serviços, exatamente?
Segundo o jornalista, Mandetta “coordenou com clareza as ações do seu ministério e valorizou os profissionais dos estados. Além disso, passou mais tempo diante das câmeras falando do coronavírus do que o general da reserva Augusto Heleno e o doutor Paulo Guedes em todas as suas vidas”.
Realmente incrível.
Viu-se a competência do ministro da Saúde no show de horrores da coletiva do coronavírus.
Após chamar Bolsonaro de “grande timoneiro”, justificou a irresponsabilidade do chefe no dia 15 e passou vexame tentando explicar o uso incorreto de máscaras cirúrgicas na entrevista.
Passageiros do exterior estão entrando no país sem qualquer triagem nos aeroportos.
“A biografia e o comportamento de Tereza Cristina e Mandetta são uma aula de política e de administração”, afirmou Elio Gaspari.
Essa biografia tem uma passagem que os novos fãs de Mandetta estão sonegando: em 2015, ele esteve num ataque de fazendeiros que resultou na morte de um indígena.
Renan Antunes de Oliveira contou a história no DCM:
Escolhido para ministro da Saúde da gestão Bolsonaro, o deputado federal do DEM (MS) Luiz Henrique Mandetta foi apresentado aos brasileiros hoje como “ortopedista” e “pediatra”, com credenciais como médico brilhante com formação nos Estados Unidos – sem nenhuma menção que ele faz parte do núcleo duro dos parlamentares que detestam os indígenas.
No seu currículo na Wikipedia Mandetta expurgou sua participação numa volante de fazendeiros e jagunços contra os índios guarani-caiovás da reserva Marangatu, em 2015, que resultou na morte de um indígena, Simão Vilhalva (foto), na cidade de Antonio João (MS).
(…) Antes do ministério cair no colo dele, seu maior destaque como deputado federal foi participar de uma grande escaramuça contra os guarani-caiovas em Antônio João.
A área em disputa era a reserva Marangatu, que a Funai reconhece como indígena mas que espera demarcação na Justiça desde 1999.
Em agosto de 2015, um bando de 40 índios, a maioria mulheres e crianças, anunciou que marcharia de sua reserva para ocupar uma área contigua, a sede da fazenda da presidente do Sindicato Rural de Antonio João, Roseli Ruiz.
Combativa, ela conclamou os vizinhos para atacar os guaranis, impedir a invasão ou retomar o imóvel, qualquer das opções valendo.
Mandetta participava da reunião preparatória ao ataque aos caiovás, no Sindicato Rural, na manhã do sábado 29 de agosto. A reunião tinha cerca de 60 fazendeiros.
Durante o encontro veio a notícia de que a casa de Ruiz era o alvo da marcha e que seria ocupada por índios que estariam se dirigindo para lá.
Armados, tripulando uma frota de camionetes fora de estrada, os fazendeiros e seus jagunços foram enfrentar os supostos invasores.
O confronto foi rápido e os índios debandaram, com um morto e alguns feridos. Do lado dos brancos, não houve vítimas. O futuro ministro participou do entrevero, ao lado dos fazendeiros.
Não foi possível comprovar se ele estava armado ou se disparou contra os índios, mas mesmo assim ele teve um papel importante no embate: foi a maior autoridade a servir de testemunha em favor dos fazendeiros.
Nos dias seguintes à escaramuça, Mandetta disse que o índio morto “não estava flácido” o suficiente para ter sido morto na hora do confronto – inocentando os fazendeiros.
Usando sua expertise médica, ele afirmou que o corpo do índio que os guaranis carregavam como vítima do confronto da fazenda estaria duro demais, indicando que teria sido morto pelos próprios índios, que usaram o cadáver como instrumento de propaganda de sua causa.
Para dar seu testemunho, já na Câmara Federal, o médico Mandetta disse que viu o corpo a “uns 20 ou 25 metros de distância”.
Simão Villhalva está enterrado a 100 metros da sede da fazenda, em área indígena.
Até hoje a polícia não identificou o autor do crime.
O impasse continua na Justiça.