Ao criar o espetáculo em 1984, Guy Laliberté resgatou uma indústria então em franco declínio.
Você, leitor, tem vontade de ir ao circo?
Sentado aqui na redação do DCM, com meu laptop no colo e uma garrafinha d’água na mão, enquanto um jogo da Premier League passa na televisão, não tenho como saber a sua resposta. Talvez depois, se você postá-la na sessão dos comentários. Agora, não. Mas fiz essa pergunta, ao longo do dia, para todos os meus colegas de trabalho. O resultado? Sete “nãos”, um “se fosse de graça” e apenas um “sim”.
Então mudei a pergunta:
E ao Cirque du Soleil, você tem vontade de ir?
A resposta positiva só não foi unânime porque um mais sovina respondeu “se fosse de graça” novamente.
Esta pequena amostragem que fiz com meus colegas de redação, por menor que seja, é o suficiente para dar uma dimensão da popularidade do “Circo do Sol”, como seria o nome da companhia em português, e de seu criador Guy Laliberté, um ex-artista de rua canadense.
Quando Laliberté fundou o Cirque du Soleil, em 1984, para celebrar os 450 anos da província de Quebec, no Canadá, a indústria circense estava em franco declínio. Essa decadência começou após o fim da II Guerra Mundial, quando novas formas de entretenimento — como a televisão e o cinema — se popularizaram pelo mundo.
Perto dos blockbusters de Hollywood e dos megashows de artistas pop como Michael Jackson e Madonna, os circos estavam reduzidos a um papel coadjuvante na indústria do entretenimento. Além disso, a partir da década de 60, eles passaram a receber críticas fortíssimas de ativistas por usar animais em seus shows. E ser inimigo da turma do politicamente correto nunca é bom para os negócios.
Foi nesta situação que Guy Laliberté criou o Cirque du Soleil, que 27 anos depois já teria mais de 50 países carimbados em seu passaporte e um público acumulado superior a 100 milhões de pessoas. É o equivalente às populações de Argentina, Colômbia e Chile somadas. Eu poderia me estender mais um pouco na criação do Cirque du Soleil, na vida de Laliberté ou em dados da indústria circense. Mas meu ponto, acredito, já está feito.
Logo, posso partir para a novidade: foi anunciado que um novo espetáculo da companhia, Corteo, estreará no Brasil em março de 2013. Ele ficará no país até fevereiro de 2014 e passará por seis cidades: São Paulo, Brasília, Curitiba, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Porto Alegre. Os ingressos custarão entre R$ 190 e R$ 450.
O DCM foi convidado pelo Cirque do Soleil para assistir a uma prévia do show. A briga foi grande para decidir qual de nós iríamos. Mas após uma vitória épica num campeonato de palitinho, conquistei o direito.
Chegando ao evento, recebi um bom release com números da empresa e do espetáculo em questão. Mas eu não estava lá para fazer contabilidade — minha intenção era tentar descobrir o que o Cirque tinha de diferente dos circos tradicionais. Afinal, a fórmula básica é a mesma: uma mistura de atos cômicos e acrobáticos. Mas havia algum ingrediente secreto de Guy Laliberté, por menor que fosse, que o separava dos demais. Por influência do próprio Cirque, é claro, muitas companhias adotariam a sua fórmula depois. Mas na década de 80, o seu espetáculo era absolutamente inovador.
E, nessa minha procura, encontrei não um — mas alguns elementos.
O primeiro que chamou a minha atenção? A trilha sonora. Em vez um tema infantil, o que tocava nas caixas de som enquanto meia-dúzia de equilibristas dançavam com um bambolê gigante era uma música profunda e densa, que intercalava momentos de tensão e alívio. Percebi que o clímax dos atos, aliado a essa trilha, causava arrepios — literalmente — em quem estava assistindo. E não estou falando só de mim. Pude reparar isso também em muitos jornalistas ao meu lado.
Outro diferencial é o seguinte: o show tem um tema. Em vez de diversos atos independentes, o Cirque do Soleil faz espetáculos que giram em torno de uma história. Há uma forte ligação entre as apresentações dos palhaços, equilibristas ou seja lá quem for. E todos realizados, note-se bem, por profissionais de altíssimo nível. Muitos dos quais ex-atletas olímpicos, não famílias de viajantes que fazem isso por amor à causa.
E há, ainda, um último detalhe. Ele pode até parecer pequeno, mas me chamou a atenção: a linguagem utilizada pelos artistas. Eles misturam inglês, francês, espanhol, português e grunhidos (às vezes tudo numa mesma frase) no palco para se comunicar com o público. Isso me fez sentir num mundo à parte; dentro daquela tenda não parecia que eu estava no Canadá, no México ou no Brasil — mas, sim, no Cirque du Soleil, como se este fosse uma pátria nômade e muito divertida.