Afilhado de Michel Temer, o deputado federal Baleia Rossi disse à Folha de S. Paulo que não tem nenhum compromisso de abrir processo de impeachment.
“Não há nenhum compromisso, como muitos falam, de abertura de impeachment. É uma mentira”, disse.
Em seguida, explicou suas razões:
“Não é o caminho, não é bom para o Brasil. O impeachment é o extremo do extremo do extremo que está na nossa Constituição. Precisamos hoje de estabilidade. E reafirmo que não houve compromisso de abertura de impeachment”, afirmou.
Baleia Rossi, efetivamente, não assumiu com a oposição o compromisso de abrir processo de impeachment, mas existe uma fresta.
O deputado do MDB não divulgou nenhum acordo escrito, mas a oposição, na última última segunda-feira, deu publicidade a uma carta em que afirma que ele assumiu alguns compromissos, entre eles o que está registrado no item 3.6:
Utilizar todos os instrumentos constitucionais destinados a assegurar o respeito à Constituição, às leis e à democracia, como as CPIs, convocação de autoridades e decretos legislativos, inclusive a análise e resposta institucional sobre crimes, por ação ou omissão, que afetem a vida do povo, imputados a autoridades do Poder Executivo.
Por “análise e resposta institucional sobre crimes, por ação ou omissão”, pode-se interpretar como abertura de processo de impeachment.
Porém, Michel Temer telefonou um dia depois a Bolsonaro, segundo registrou a imprensa, para dizer que Baleia não lhe fará oposição.
É uma forma de garantir que abertura de processo de impeachment não está sendo cogitada.
Temer é cotado para ser o chanceler de Bolsonaro no lugar de Ernesto Araújo, mas o cargo só lhe será entregue se o titular do Planalto entender que não há outra saída.
E é aí que o PT entra como um valor a ser negociado por Baleia Rossi e Temer.
O afilhado de Temer tentará convencer o PT de que deve ficar com a primeira vice-presidência da Câmara, na chapa que ele deve liderar.
Assim, jamais encaminhará o processo de impeachment, honrando a palavra que supostamente Temer deu a Bolsonaro.
Mas, como é comum na política, ele pode se licenciar da presidência, por razões de saúde (o que é mais difícil) ou numa viagem internacional (o que é mais comum).
Assim, a abertura do processo de impeachment seria encaminhada pelo PT, e ele poderá dizer que não descumpriu a palavra.
O PT será uma espada que Baleia Rossi colocará sobre a cabeça de Bolsonaro.
Esse é o modus operandi de Temer. Age pela mão do gato.
Como Eduardo Cunha deve contar em seu livro, Temer participou ativamente da conspiração que levou ao golpe contra Dilma Rousseff.
Mas, publicamente, ele não apareceu.
Fernando Henrique Cardoso sugere, no seu “Diários da Presidência”, que Temer usava Geddel Vieira Lima, o do apartamento com R$ 51 milhões, para extorquir vantagens do governo.
“O PMDB entrou no nível de chantagem (…) Michel Temer um pouco atordoado, mas também participando, parece que ele quer nomear esse rapaz, Padilha, por quem tenho simpatia, mas parece está havendo aí um lobby muito forte, e isso já torna a nomeação mais perigosa”, escreveu.
E contou:
“O Sérgio Motta (PSDB) foi a uma reunião na casa do Michel Temer, numa festa, e lá o Geddel, o líder do PMDB [na Câmara], dizia que se o Sérgio quisesse [aprovar] o FEF [Fundo de Estabilização Fiscal] tinha que nomear logo o ministro, tem que ser o Eliseu Padilha, uma coisa explícita. Eu já tinha decidido que não vou nomear Eliseu Padilha, (…) porque esta pressão está cheirando mal. Até tenho simpatia pelo Eliseu, mas do jeito que as coisas estão se colocando isso está mau”
Desabafa:
“É o fim desse sistema político corroído. Se ele não está corrompido, está corroído”.
Mas, depois disso, sem saída, entregou a fatura e nomeou Padilha para o Ministério dos Transportes. Logo depois, o partido queria mais dinheiro.
“Tive uma reunião com Padilha para discutirmos o orçamento do ministério (…). Ficou bem claro que o PMDB não digo que se condicione, mas se motivará na votação da CPMF [que FHC tentava aprovar] (…) se houver uma aprovação neste tributo que garanta recursos ao ministério dos Transportes”, afirmou.
E não foi só, como relata FHC:
“O Geddel e o PMDB fizerem uma espécie de imposição: ou se nomeava o diretor do DNER [Departamento Nacional de Estradas de Rodagem] de Minas ou não me dariam os votos. A coisa de sempre”.
O PT não deve se iludir. Além dos votos da bancada, Baleia quer usar o partido para fazer esse jogo de poder com Bolsonaro. E são bons nisso.
Afinal, a turma de Temer está de olho é no cofre público. Sempre.
Depois da cobrança de Gleisi Hoffmann, Baleia fez uma postagem ambígua em seu Twitter.
“Falei com a presidente Gleisi agora há pouco. Ressaltei que vou honrar cada compromisso firmado com os partidos de oposição, o que inclui usar todos instrumentos constitucionais em defesa da democracia. Antecipar juízos agora não ajuda. Isso é o que disse à Folha”, escreveu.
A Folha deveria mostrar a gravação da entrevista. Baleia, como Temer, maneja bem as palavras, para iludir o público. Os políticos experientes, porém, não devem cair na lábia dos dois.
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Para acessar a carta em que a oposição diz ser o compromisso de Baleia Rossi, clique aqui.