Como um “filho enjeitado de Jânio” trava a apuração da máfia da merenda em SP. Por José Cássio

Atualizado em 19 de abril de 2016 às 21:21
capez e alckmin
Eles

 

Sem oferecer nenhuma explicação, o deputado Campos Machado cancelou a reunião agendada para esta quarta-feira, dia 20, para a formação do Conselho de Ética da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. 

Num flagrante desrespeito ao Regimento Interno, o Conselho ainda não foi constituído após um ano e cinco meses do início da legislatura.

O Conselho de Ética é responsável por averiguar irregularidades cometidas por parlamentares da Casa, que podem sofrer condenação criminal e perda de mandato caso seja comprovado um crime. 

A ideia dos deputados é, através do Conselho, apurar as irregularidades apontadas no escândalo da merenda, como ficaram conhecidas as investigações da Operação Alba Branca, da Polícia Civil e do Ministério Público, que desbaratou um esquema de contratos superfaturados na compra de alimentos para merendas escolares no estado.

O presidente da Assembléia, Fernando Capez, é um dos envolvidos no esquema. 

Ele é citado como beneficiário da propina por Marcel Ferreira Júlio, detido no dia 31 e liberado na terça-feira (5/4) após fechar acordo de delação premiada.

A relação de Capez com a máfia da merenda já havia se estabelecido quando grampos mencionaram pagamentos feitos ao seu ex-assessor, Jéter Rodrigues.

O deputado João Paulo Rillo (PT) lamentou o cancelamento da reunião. A Assembléia vive o caos”, disse ele na tarde desta terça, 19. 

O parlamento que andava devagar agora está obsoleto. As sessões em plenário são sistematicamente suspensas, projetos não são debatidos e apreciados e agora mais essa: sem nenhuma justificativa a sessão de instalação do Conselho de Ética, convocada com 17 meses de atraso, é suspensa”. 

O Conselho de Ética, no seu primeiro encontro, é convocado pelo deputado Campos Machado, o mais velho da Casa. É ele que vem comandando a paralisia na qual a Assembléia se envolveu desde o surgimento do escândalo da merenda. 

Advogado criminalista, Machado fez carreira como uma espécie de “filho enjeitado” de Jânio Quadros. 

Sem nunca ter tido grandes intimidades com o ex-presidente e ex-prefeito de São Paulo, conseguiu a vaga de vice chapa de Marco Antônio Mastrobuono, genro de Jânio, na eleição municipal de 1988, vencida por Luiza Erundina. 

Jânio, então prefeito e sem ânimo para assinar despachos do dia a dia (quem se ocupava desta tarefa era Cláudio Lembo) não moveu uma palha pela candidatura, mas a participação rendeu a Machado a chance de se “vender” posteriormente como o herdeiro do janismo na cidade. 

Desde então vem se elegendo sucessivamente deputado estadual. 

Tornou-se uma espécie de dono da Assembléia, com contatos no governo, na polícia e no baixo clero da vida cultural e política. 

Em 2008, estimulou a candidatura de um sósia da dançarina Lacraia sem esclarecer a verdadeira identidade do rapaz na propaganda da TV. 

MC Serginho e Marco Aurélio Silva da Rosa, a verdadeira Lacraia, entraram com representação no Tribunal Eleitoral de São Paulo para suspender a candidatura.

Provinciano e do tempo em que a política era feita através de jornais de bairro – Jânio comprava a Capa de dezenas deles quando queria comunicar algo importante -, Campos Machado tem a sorte de reinar numa instituição igualmente demodê como a Alesp.

Só não percebeu que as coisas estão mudando. 

Nesta terça, 17, com mais um adiamento por falta de quórum e pedido de vistas aos requerimentos sobre o escândalo da máfia da merenda, a Comissão de Educação também foi suspensa. 

Das 10 reuniões programadas para este ano, apenas uma teve quórum suficiente. A Casa é uma hipocrisia onde nada acontece”, comenta João Paulo Rillo. 

“A Assembleia não legisla, não fiscaliza e não representa a população. É um ‘puxadinho’ do Palácio dos Bandeirantes, sede do governo estadual”, complementa o deputado Carlos Giannazi (PSOL).

A pergunta que se ouve nos corredores do Palácio Nove de Julho, principalmente dos jovens, já virou mantra: até quando?