Como um governo que só fala em cortes pode aumentar os gastos com publicidade para beneficiar as empresas de mídia? Por Paulo Nogueira

Atualizado em 5 de outubro de 2016 às 19:07
O que o Banco do Brasil estava fazendo no Faustão?
O que o Banco do Brasil estava fazendo no Faustão?

Nada conta melhor o que acontece no país do que a contradição entre o discurso de ajuste fiscal do governo e as verbas publicitárias federais.

A ordem é cortar custos, incluídos os sociais. É só o que a equipe econômica fala e faz.

Qual o sentido, diante disso, em aumentar o dinheiro público canalizado para as grandes empresas de mídia, como mostrou num levantamento notável o site Cafezinho, de Miguel de Rosário?

Nenhum. Você economiza com uma mão e gasta com a outra.

Isso mostra o caráter do governo Temer e das corporações jornalísticas. Temer está comprando um tratamento amigo de jornais, revistas e por aí vai. E as empresas de jornalismo, como sempre, enriquecem ainda mais à custa do contribuinte.

É uma tragédia brasileira.

Na Era Digital, há formas infinitamente mais baratas e mais eficientes para um governo comunicar as coisas que julgue relevantes à sociedade.

Mas sempre a escolha recai em mídias caríssimas e antigas, como TV, revista, jornal e coisas do gênero.

Em sociedades avançadas, o gasto publicitário dos governos com mídia é o menor possível. Apenas campanhas de real interesse público — notadamente saúde — são veiculadas.

No Brasil, é uma farra. O cidadão perde e só quem ganha é a mídia plutocrática com seus grandes e pequenos barões. (A Caviar de Dória foi obsequiada com dinheiro do cidadão paulista pelas mãos de Alckmin.)

O Cafezinho mostrou isso com requintes. A Caras recebeu de Temer uma bolada. Para quê? Provavelmente você vai ver capas com o casal Marcela-Michel em doses industriais nos próximos meses.

E há um outro fator, ainda mais importante: a Caras é da família Civita, em consórcio com um grupo argentino. Isso quer dizer que é dinheiro na veia dos Civitas.

Dadas as circunstâncias, fica óbvio o que motivou a explosão de Fausto Silva ao vivo. Ele disse que este governo não sabe se comunicar.

Comunicar-se, para FS, só pode significar anunciar. Porque é obrigação de empresas como a Globo dele noticiar as coisas importantes que o governo faz.

Ou seja: o problema da comunicação estaria não no governo — mas nas corporações jornalísticas.

Não ficarei surpreso, definitivamente, se algum grande anunciante federal aportar no programa de FS.

Repito: nada retrata melhor a hipocrisia nacional do que um governo que à luz do sol fala em ajuste fiscal e nas sombras torra dinheiro público com Globo, Folha, Abril — e até Caras.