Como você pega um talento digital e o estraga? É só colocá-lo na mídia tradicional.
É exemplar o caso do carioca Felipe Neto, 22 anos. Felipe estourou no YouTube com vídeos simples, divertidos, críticos e inteligentemente provocadores. O título é autoexplicativo: “Não Faz Sentido”.
O conteúdo é tão bom que Felipe superou dois obstáculos: primeiro, o do tempo. Vídeos no YouTube que fazem sucesso costumam ser breves, coisa de dois, três minutos. Segundo, o fortíssimo sotaque carioca. (Devolvo a Nelson Rodrigues uma tirada sobre os paulistas: a pior forma de solidão é a companhia de um carioca. Calma. Brincadeira.)
Ele tem uma audiência elevadíssima no YouTube, pela qual provavelmente esteja recebendo um bom dinheiro. Seus vídeos batem facilmente em 2 ou 3 milhões de exibições. Se no Brasil a língua fosse o inglês, você poderia multiplicar isso por cinco ou dez. O português limita o alcance de Felipe.
Bem, um obstáculo ele não teve forças para superar: a televisão tradicional e sua fórmula altamente desinspirada e desinspiradora. Felipe acabou no Multishow, da Globo, onde faz um rascunho sem graça do que criou no YouTube. O mesmo garoto brilhante do YouTube parece um bocó no Multishow. É uma pequena grande amostra da diferença entre o conteúdo da mídia tradicional e o conteúdo da mídia digital. No YouTube ele é ele, solto, arrojado. No Multishow, é um canastrão.
Seu emprego no Multishow já começa a atrapalhar sua obra no YouTube. O vídeo em que ele analisa o programa do SBT sobre o Maior Brasileiro de Todos os Tempos é particularmente revelador. Um internauta notou que ele criticou Edir Macedo, mas foi generoso com Roberto Marinho.
Os números gritam. Os vídeos com Felipe em seu programa no Multishow têm uma fração da audiência da série Não Faz Sentido. São 100, 200 vezes menores.
Tentei ver um e sucumbi depois de alguns minutos. Vi um comentário que diz tudo: “Volta pro YouTube.”