Um Tinder focado no público de esquerda. Por que não?
Essa foi a ideia da advogada e escritora Maria Goretti Nagime com a professora e escritora Elika Takimoto. A informação foi divulgada na coluna Mônica Bergamo na Folha de S.Paulo na última quarta-feira, 25 de setembro.
O assunto foi parar nos Trending Topics do Twitter. E nem estava claro, de fato, o que era o aplicativo.
Era um programa como o Tinder? Apenas uma ideia? O que seria?
O DCM entrevistou Elika Takimoto.
Diário do Centro do Mundo: Como está a repercussão do PTinder?
Elika Takimoto: A repercussão do PTinder está em jornais impressos e já rompeu fronteiras. Tem sites na Itália divulgando. A gente não esperava essa repercussão toda. Imaginávamos que a galera iria se interessar, fizemos por conta disso.
DCM: Algumas pessoas apontaram que criar um aplicativo para paquera no campo da esquerda poderia estimular roubo de dados e até armadilhas de bolsonaristas. Como evitar isso?
ET: Sinceramente, essas pessoas que apontam que esse aplicativo pode roubar dados deveriam apontar todos os demais aplicativos. Andei observando muito as pessoas que criticaram. As principais pessoas eram homens de esquerda, o famoso esquerdomacho. Diziam que era absurdo um aplicativo desses porque vai “incentivar o feminicídio”. São duas mulheres feministas criando isso, promovendo esses encontros. Tem muita gente deprimida e tem muita gente cansada com o que está acontecendo.
Teve um artigo bom da Eliane Brum, “Doente de Brasil”, mostrando como tem tanta coisa que não dá pra gente confiar e como estamos ficando doentes com isso.
A gente promove um aplicativo que tira as pessoas de casa, tenta mudar um pouco isso, e somos diretamente criticadas por “expor as mulheres”. Bom, por que esse pessoal não critica o Facebook, o Twitter, o Uber, qualquer outro aplicativo?
É óbvio que todas as medidas de segurança que a gente puder tomar, vamos tomar sim.
DCM: Como as pessoas podem baixar o PTinder? Quem está usando?
ET: O PTinder na verdade ainda está sendo feito. Foi assim que anunciamos. Ele não está pronto.
Primeiro vamos colocá-lo no Instagram. Vamos reunir a galera lá. Vamos falar sobre quem é o “Partidão de Esquerda”, vamos entrevistar famosos e vamos fazer vídeos. Eu e Maria Goretti vamos fazer isso já.
Vai ter muita brincadeira e muita brincadeira séria. Já o PTinder aplicativo está em fase de testes e já está ficando muito legal. Estamos priorizando o conteúdo.
No Tinder convencional, as pessoas colocam fotos. Nesse, estamos pensando em colocar foto, o último livro que leu, em quem votou pra presidente, deputado, esse tipo de coisa.
DCM: Como a ideia foi desenvolvida?
ET: A ideia partiu primeiro da Maria Goretti Nagime, por conta de ter apresentado o amigo dela. O que mais chamou atenção no perfil dele é justamente o fato dele ser de esquerda. Paralelamente, eu fiz isso com outro amigo meu. Botei ele no Instagram, disse que é solteiro e “Lula livre”.
Ela me ligou, perguntando para fazer e topamos. A ideia é lançar um aplicativo, uma plataforma, para pessoas de esquerda se relacionem. E é para além do sexo. É pra se reunir num bar, numa livraria, numa palestra. Esse tipo de app iria promover algo desse tipo.
Muita gente pergunta se a gente não está criando outra bolha. A bolha já está criada. Ninguém tá querendo se relacionar sexualmente na esquerda com quem apoia Bolsonaro. É o que se caracteriza hoje como uma pessoa fascista, misógina. A pessoa não quer sair de casa e correr o risco de encontrar alguém assim.
O aplicativo também não funciona somente no aspecto amoroso. Até pra reuniões em manifestações ele serve, sim. Palestras e lançamentos em livrarias também são outros pontos. Promover livros de esquerda, enfim. Ele vai pra além do encontro casual, convidando a pessoa a sair de casa e de repente ir pro bar com uma pessoa bacana.
DCM: Vocês afirmaram que o app vai perguntar sobre terraplanismo? E sobre Olavo de Carvalho? Quais serão os perfis que definitivamente não vão poder usar?
ET: É claro que, quando a gente coloca que vamos perguntar se a Terra é plana, ou sobre Olavo de Carvalho, está claro que o objetivo é tirar essas pessoas do app. Não vamos conseguir proibir ninguém, mas a gente espera que quem baixe ou promova a brincadeira no Instagram sejam as pessoas que não gostam do Olavo, não acreditem em terraplanismo. Que sejam pessoas que acreditem na Terra no formato esférico, que tomem vacina, acreditem na ciência e na pesquisa no Brasil. Pessoas que acreditam que 90% das pesquisas acontecem nas universidades desse país. Queremos quem acredita que devemos valorizar professores e professoras, além de cientistas. E, na necessidade de valorizar também a ciência, porque graças a ela somos o décimo terceiro país que mais publica artigos científicos.
Então, se aparece uma pessoa defendendo Terra plana, anticiência e tudo mais, a gente quer mesmo distância dela neste momento. Não significa que a gente não queira dialogar em algum momento. No momento de lazer, no entanto, você não quer entrar em um embate sério com essa pessoa.
DCM: Gostaria de acrescentar algo?
ET: Como tudo na vida, temos críticas positivas e negativas. Fui acusada de ser “esquerda cirandeira” e de “idiota” por um homem de esquerda. Essa pessoa, ao invés de perder a energia dela criticando Bolsonaro, prefere atacar duas mulheres por uma “brincadeira” – que deve ser levada a sério contra a depressão – e mostra que é limitada.
Maria Goretti está com mestrado, tem participação em oito livros e eu estou lançando meu oitavo livro, “Nós Somos A Tempestade”, que fala sobre empoderamento feminino na política contando um pouco da minha história como candidata do PT. Coloquei minha cara a tapa, como professora do Cefet, e fiquei contra o Future-se.
De homem de direita a gente já espera esse tipo de ataque. Mas de homens de esquerda, isso só mostra que eles não fazem metade da metade que eu e Goretti fazemos individualmente. Quanto mais juntas.
Essas críticas nós recebemos com risadas e isso não fez nem cócegas. Estamos montando textos e vídeos para começar o PTinder em uma semana no Instagram, mostrando as belezas que estão ficando escassas.
Obrigado pela oportunidade de fala.