Cuca no Corinthians apresenta reflexões sobre clube que o torcedor quer. Por Luan Araújo

Atualizado em 22 de abril de 2023 às 15:16
Cuca durante apresentação no Corinthians. (Foto: Reprodução)

Na sexta-feira (21), o Corinthians apresentou seu novo técnico. Alex Stival, o Cuca, é ex-jogador de futebol que atuou como meia em grandes clubes, como Grêmio, Santos e Palmeiras. Após encerrar sua carreira como atleta, ele emendou com a de treinador, área em que atua há mais de duas décadas.

Dos 12 grandes clubes do Brasil, já comandou 10 (além do Corinthians, ele já dirigiu Palmeiras, Santos, São Paulo, Flamengo, Botafogo, Fluminense, Atlético-MG, Cruzeiro e Grêmio). Foi vitorioso em alguns deles, tendo como principais títulos dois Brasileiros e uma Copa Libertadores. Um currículo parrudo, diria. Só que tudo isso pouco importa quando vamos falar do contexto pessoal de Cuca.

Como homem hétero, obviamente eu já errei em condutas com mulheres. Me arrependo muito disso, aliás e tento me desconstruir diariamente. Mas na coletiva de apresentação, Cuca se pronunciou sobre uma condenação de estupro coletivo cometido na Suíça no ano de 1987, quando, aos 23 anos, ele estava em uma excursão com o Grêmio, em que atuava. Ele diz que não fez nada na ocasião, e estava acompanhado por três colegas de equipe: o goleiro Eduardo Hamester, o atacante Fernando Castoldi e o zagueiro Henrique Etges (sobre este, falarei ao longo do texto). Os quatro foram condenados pela justiça suíça por violação contra uma menina de 13 anos, sem consentimento.

O fato de Cuca dizer que lamenta e se arrepende e falar que o fato de apenas ter observado o ato não o torna culpado, mas mostra que, na verdade, o tempo não o fez se arrepender. Quando cometemos atos assim, a reflexão para que não repitamos é constante. E, como falei, é uma luta diária e necessária para todos nós, homens, que estamos sujeitos a errar na conduta com mulheres diariamente. O que nos resta é aprender e não repetir estes erros.

E mesmo no caso de Cuca, parece não ser exatamente assim. De acordo com o relatório forense da Polícia de Berna (SUI), foram encontrados vestígios de esperma de Cuca e Eduardo dentro do corpo da menina. No entanto, ele admite que, sim, foi condenado, mas apenas pelo fato de não ter dinheiro para ir para a Suíça e se defender no julgamento.

Aí entramos no lado corintiano da história. O clube paulista, do qual eu sou torcedor, nasceu para ser popular e representante do povo na cidade de São Paulo (e, posteriormente, no resto do país). Na década de 1980, o clube ganhou projeção nacional com a Democracia Corinthiana, movimento que pregava uma liberação maior de direitos no próprio time e que, com o tempo, lutou pela própria redemocratização do País. Hoje em dia, o time feminino do alvinegro é o mais forte da América Latina, orgulho de sua torcida e objeto de propagandas do clube com o mote “Respeita as Minas”.

Observando tudo isso, fica meio incoerente o Corinthians contratar alguém como Cuca. O não arrependimento dele no caso vai totalmente contra o que o clube planeja vender para o público externo. O próprio zagueiro Henrique, condenado junto com Cuca em 1987, atuou pelo Corinthians, entre 1992 e 1997. Foi vitorioso e capitão do clube. Era uma outra época. Jocosamente, ele recebeu o apelido de “Paiakan”, em referência a um líder indígena, falecido em 2020, acusado de estupro no ano em que Henrique chegou ao Corinthians.

Recentemente, o clube parabenizou o ex-zagueiro pelo seu aniversário em sua rede social e torcedoras recordaram do caso. Com isso, o clube apagou a postagem em seu perfil no Twitter. Agora, fica a dúvida: o que mudou para que Cuca assinasse com o clube? O ano eleitoral fez Duílio Monteiro Alves tomar uma medida tão desesperada, que ela mesmo feriu os princípios morais que o próprio clube trouxe para si nos últimos anos?

Cuca mentiu sobre muitos aspectos deste episódio em sua vida. Segundo apuração de Raul Moura, do portal GOAL, Duílio, filho de Adílson Monteiro Alves, dirigente que foi o autor intelectual da Democracia Corinthiana, ouviu de Cuca a exata versão que o treinador passou na coletiva desta sexta. E tratou como verdade absoluta. O presidente alvinegro, no mínimo, se calou e não questionou mais. Achou que era o bastante para que a contratação fosse concretizada (em tempo recorde aliás, menos de 16 horas após a derrota do Corinthians para o Argentinos Jrs., que marcou o fim do comando de Fernando Lázaro no time).

Cuca trabalhou durante estes quase 40 anos normalmente, como jogador e treinador. O que nos leva a questionar como andamos como sociedade neste tempo. Há dois anos, este mesmo técnico era campeão brasileiro e da Copa do Brasil pelo Atlético. E cotado a dirigir a Seleção Brasileira, que já sabia que Tite não seguiria após o Mundial do Catar. Poucos na imprensa apontaram esse caso na época.

Agora, Cuca está no segundo clube mais popular do Brasil (já comandou o primeiro, em uma época em que o caso era muito menos comentado). Isso acarreta questionamentos inevitáveis e uma necessidade de melhor apuração sobre o que aconteceu na época. É a função social do jornalista esmiuçar este caso com toda a seriedade, para que nenhuma aresta fique para trás. Os torcedores do Corinthians e toda a sociedade merecem esclarecimentos.

Cuca, ao que tudo indica, comandará o Corinthians na partida contra o Goiás, neste domingo (23), dia de São Jorge, o padroeiro do clube. Mas acho que o padroeiro não conseguirá proteger o clube de justíssimos questionamentos.

Participe de nosso grupo no WhatsApp, clique neste link
Entre em nosso canal no Telegram, clique neste link