Não é coincidência que Neymar e Robinho tenham saído do Santos Futebol Clube. A torcida do time e a própria cidade estão acostumadas a passar a mão na cabeça deles desde muito novos.
Morei em Santos entre 2013 e o começo de 2015 e trabalhava em um escritório com muitos jovens. A maioria dos meus estagiários tinha alguma história de proximidade com Neymar ou Robinho, desde “já peguei praia com ele” até “ele já ficou com minha prima”. Nas boas fases, todos se achavam até amigos deles, o que gerava um sentimento de defesa de seus atos.
Acostumada historicamente ao protagonismo conquistado em campo nos tempos de Pelé, a cidade estava disposta a fechar os olhos para todos os excessos de seus jovens, desde que eles, em campo, devolvessem as passadas de pano sob forma de vitórias e títulos.
O time dos “Meninos da Vila” deu ao clube a fama de revelador de craques, com Ailton Lira, João Paulo, Pita e Juary no título paulista de 1978, o primeiro conquistado sem o Rei do Futebol, que havia encerrado sua passagem pelo clube quatro anos antes. Ali estabeleceu-se o caso de amor dos santistas com as suas pratas da casa.
No início dos anos 2000, veio a geração de Diego e Robinho, que devolveu ao clube um título nacional e, 10 anos depois, surgiu Neymar, cujo desempenho já era acompanhado desde as divisões de base e que, em campo, devolveu ao time o domínio no futebol sul-americano com o título da Libertadores da América de 2011.
Quem ousasse destoar do coro favorável ao então promissor atleta era massacrado até pela mídia, e não só a local, uma das mais bairristas do país. O técnico René Simões, em 2010, já reclamava do comportamento do “menino Ney”: “Poucas vezes vi alguém tão mal-educado desportivamente quanto esse rapaz Neymar. Estamos criando um monstro no futebol brasileiro”, disse Simões. “Ele é um senhor todo-poderoso dentro de campo”.
Em 2010, Renê Simões já projetava o futuro de Neymala. pic.twitter.com/wx8MFEcMBg
— NESTOR CAVALCANTE FILHO (@NestorCavalcan4) June 1, 2024
Ouvido recentemente sobre o assunto, o ex-técnico foi taxativo: “Não mudaria uma palavra”.
Tanto Neymar quanto Robinho saíram do Santos com a certeza de que seriam brevemente eleitos os melhores do mundo. Ambos fracassaram. Enquanto um amarga um fim melancólico, comportando-se como subcelebridade nas redes sociais, aparecendo mais por seus sempre conturbados relacionamentos, por seu posicionamento político invariavelmente equivocado ou, como mais recentemente, defendendo o projeto de privatização das praias e, por isso, brigando com Luana Piovani, o outro cumpre pena na prisão por estupro no presídio de Tremembé.
Ambos pagam o preço de não terem sido tratados como profissionais desde o início de suas carreiras.