A defesa de Lula reafirmou o pedido ao relator da Lava Jato no STF, Edson Fachin, para concessão de HC ao ex-presidente por parcialidade dos procuradores da operação em Curitiba.
Ontem, os advogados juntaram cópia dos diálogos secretos publicados domingo pela Folha de S. Paulo, entre eles o de Januário Paludo e Julio Noronha, em que falam da busca de informações fiscais sigilosas de Marlene Araújo, nora de Lula.
Diz Paludo, em 18 de janeiro de 2016: “Estou pedindo para Roberto Leonel verificar se o aluguel é pago para Marlene Araújo pelo restaurante. Já pedi todos os registros do terminal 3 de Guarulhos.”
Roberto Leonel era o chefe do setor de inteligência da Receita Federal em Curitiba, um tentáculo da Lava Jato.
Quando virou ministro e teve o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) incorporado à sua pasta, Sergio Moro nomeou Leonel presidente do órgão.
Com a volta do Coaf para o Ministério da Economia, Leonel foi mantido no cargo. Agora, no entanto, está ameaçado de demissão, depois que foi revelado esse comportamento tido pelos críticos como “promíscuo” com a Lava Jato.
O Coaf será transferido para o Banco Central.
A reportagem sobre o vazamento não explica a razão que levaram os procuradores a suspeitarem da empresa e da nora de Lula.
Na parte não tarjada do diálogo publicado, há uma pista sobre a empresa suspeita: a data de sua abertura, 6/11/2013.
No piso 1, do terminal 3, funciona o Restaurante Ráscal, mantido por uma empresa aberta nesta data, 6/11/2013, a Cepheus Restaurantes Ltda, que mantém o restaurante Ráscal.
O dono é Roberto Bielawski, empresário celebrado na mídia. Pelo diálogo, não é possível saber o que Januário Paludo e Júlio Noronha procuravam.
Marlene Araújo, por sua vez, não era era suspeita de nada nem nunca teve o sigilo formalmente quebrado.
Estava ocorrendo uma devassa na vida dos parentes e das pessoas próximas de Lula, com o claro objetivo de tentar encontrar algo que implicasse o ex-presidente.
Nessa época, em outro tiro furado dado pela Lava Jato, o procurador Roberson Pozzobon comentou com Dallagnol qual era a estratégia do grupo.
“Quero pedir via Leonel para não dar muito na cara, tipo pescador de pesque e pague rsrsrs”. Isto é, joga o anzol e depois confere o que vem.
Em 15 de fevereiro do mesmo ano, Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, conversa com Júlio Noronha sobre outra quebra ilegal de sigilo, a do caseiro do sítio de Atibaia, Élcio Pereira Vieira, o Maradona:
“Vocês chegaram o IR de Maradona? Não me surpreenderia se ele fosse funcionário fantasma de algum órgão público”.
Noronha responde: “Não olhamos… Vou colocar na lista de pendências.”
Dallagnol orienta: “Pede pro Roberto Leonel dar uma olhada informal.”
Maradona, o caseiro, nunca foi funcionário público nem teve movimentação atípica em suas contas. A invasão de seu sigilo lembra o que o então ministro Antônio Palocci fez em relação ao jardineiro Francenildo Costa, anos atrás.
Quando a quebra informal de seu sigilo foi revelada, Palocci caiu.
Em relação aos procuradores da Lava Jato, prevalece a impunidade.
Os procuradores estavam pescando, como contou Pozzobon, com a conivência de um alto funcionário da Receita. Não estavam investigando fatos, mas pessoas, especialmente uma pessoa, Lula.
Queriam algum indício que pudesse implicar o ex-presidente. Em outro diálogo, procuradores discutem outro pedido a Roberto Leonel, para verificar se os seguranças tinham comprado geladeira e fogão para o triplex do Guarujá.
Quem comprou foi a OAS, sem nenhum pedido da família do ex-presidente, que nunca foi proprietária do imóvel.
A Lava Jato, no entanto, tinha suas teorias, no caso de Lula furadas. Os procuradores de Curitiba, além de tudo, se revelaram péssimos investigadores.
Fachin ainda não decidiu sobre o HC. Em casos assim, normalmente ele nega liminar e remete o caso para julgamento da 2a. Turma.
Em um caso, o do HC sobre segunda instância, que teria evitado a prisão de Lula, Fachin atropelou o princípio do juízo natural e passou por cima da segunda turma, com a remessa da ação diretamente para o plenário do STF.
Se permanecesse na segunda turma, o HC seria concedido. No plenário, havia uma chance de ser negado, como acabou ocorrendo, com o voto surpreendente de Rosa Weber, contrário à própria consciência.
Desde então, abril do ano passado, muita coisa mudou. A Lava Jato perdeu credibilidade, e Fachin já deu declarações sobre os erros do Ministério Público.
Foi em discurso no Tribunal Regional Eleitoral de Curitiba, no dia 8 de julho deste anos, depois que o The Intercept vazou o diálogo em que Deltan Dallagnol comemorou o resultado de uma conversa com o ministro do STF, no auge da Lava Jato:
“Aha, uhu, o Fachin é nosso”.
Disse o ministro, no evento público:
“Juízes também cometem ilícitos e também devem ser punidos, mas as instituições devem ser preservadas. E assim se aplica a todos os atores dos Poderes e das instituições brasileiras, incluindo o Ministério Público e a administração pública. Ninguém está acima da lei, nem mesmo o legislador, nem o julgador, muito menos o acusador”.
Está na hora de mostrar que essas palavras não foram vazias.