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Desde que o golpe foi delineado, a possibilidade de que ele chegasse a um momento militar foi sistematicamente minimizada pelos analistas políticos – mesmo à esquerda.
Villas-Bôas era incensado como a voz da ponderação e do respeito às regras, nunca entendi bem o porquê. Parecia que alguma força sobrenatural garantiria que as forças armadas não interviriam na política.
Só o sobrenatural para explicar, mesmo. A primeira ação dos novos donos do poder, após o golpe de 1964, foi limpar o oficialato de todos seus componentes progressistas e legalistas. Desde então, temos nas forças armadas brasileiras uma visão de mundo praticamente unânime – e fortemente à direita.
A redemocratização simplesmente não tocou nisso. A indisciplina de chefes militares diante do comando civil nunca foi punida. A doutrina da Escola Superior de Guerra continuou praticamente intacta. A autocrítica da ditadura nunca foi feita, pelo contrário. Nas academias militares, a mesma mentalidade autoritária e elitista continua sendo transmitida.
Há tempos, existem sinais de que a ampliação do protagonismo militar no golpe em curso é uma possibilidade em aberto – as declarações de Villas-Bôas sobre o julgamento da prisão de Lula, a própria intervenção no Rio.
Agora, temos vários fatos simultâneos de enorme gravidade: a entrevista de Villas-Bôas afirmando que a facada em Bolsonaro (mas não a perseguição a Lula, vejam só) põe em risco a legitimidade do resultado da eleição e a defesa, por Mourão, da instauração de uma ditadura aberta (“autogolpe” militar do Executivo, na entrevista da GloboNews, e ontem a imposição de uma nova Constituição). E, o mais grave de todos, a indicação pelo novo presidente do STF, Dias Toffoli, de um general de exército para assessorá-lo – apontando para a sacramentação da dobradinha toga/farda.
Estava na hora das lideranças do campo democrático, a começar pelos candidatos, buscarem uma ação conjunta para barrar esse risco. Isso é bem mais importante do que nossas divergências.