Publicado originalmente no blog do autor
Um alcaguete amador, que tenha estudado iniciação à deduragem por correspondência (o antigo ensino à distância), deve estar alarmado com a precariedade das acusações de Sergio Moro contra Bolsonaro.
Se Moro pretendia sair atirando, para denunciar o chefe e reafirmar sua imagem de justiceiro, por que não preparou armadilhas para ter provas contra o sujeito?
É surpreendente que Moro, com sua reputação de magistrado esperto, tenha preparado sua saída do governo, como parece que preparou, sem ter nada de consistente.
Se estava decidido a sair e se sabia dos movimentos de Bolsonaro para obter o controle de toda a Polícia Federal, deveria ter prolongado a permanência, até atrair o indivíduo para conversas comprometedoras que pudessem ficar registradas.
São fortes do ponto de vista político as denúncias contra Bolsonaro. Ninguém duvida das informações do ex-juiz, até porque todos os indícios apresentados reafirmam que Bolsonaro governa para proteger a família.
Mas onde estão as provas inquestionáveis de que Bolsonaro já tentava mandar na Polícia Federal e se preparava para assumir seu controle absoluto, com o objetivo de proteger os filhos?
As oito horas do depoimento de Moro à Polícia Federal em Curitiba produziram uma polvadeira. Moro tem agora o seu PowerPoint, inspirado no desenhado feito por Deltan Dallagnol contra Lula, mas na versão falada. O powerpoint de Moro também não vale nada.
Até a frase, que todos os jornais transformaram em manchete online ontem à tarde, e que seria a prova da interferência política, não existe como prova.
A frase seria de um texto de WhastApp enviado por Bolsonaro no começo de março. No depoimento, Moro diz que “a mensagem tinha mais ou menos o seguinte teor”:
“Moro, você tem 27 superintendências e eu quero apenas uma: a do Rio de Janeiro”.
Se o teor era “mais ou menos” esse, Moro não tem mais o registro da mensagem no celular. A principal prova de todo o depoimento não existe como prova, é uma nuvem que se foi.
Pelo conjunto da sua obra na Lava-Jato, pelo histórico da adesão suspeita ao bolsonarismo, pelas entrevistas vacilantes que deu, pelas biografias que diz ter lido, por tudo isso Sergio Moro pode ser considerado um caçador seletivo de corruptos que deu certo, sob o ponto de vista da direita, mas que deu errado como ministro da Justiça e como ex-futuro ministro do Supremo, sob o ponto de vista da extrema direita.
Moro foi o juiz que, por ter estagiado antes em Brasília, como assessor da ministra Rosa Weber no STF, abriu portas para chefiar a Lava-Jato. Mas era um bom tarefeiro, com grande capacidade de trabalho, comandando uma equipe só dele.
O juiz tinha seu grupo, suas tarefas específicas, tinha a imprensa, era paparicado e ainda mandava na turma de Deltan Dallagnol no Ministério Público.
Moro era poderoso, prendia pelo tempo que quisesse, forçava delações, condenava sem provas. Mas, no antro do bolsonarismo, não teve lastro para aguentar o tranco, até a indicação para o Supremo.
Moro enganou sua torcida como um juiz que parecia ser brilhante pelo empenho para caçar e encarcerar Lula. Agora, está diante de uma montanha de provas contra ele mesmo.
Está provado que Moro é apenas um sujeito simplório tomado pela fama de juiz símbolo da justiça da direita, mas incapaz de gerir a transição do mundo tucano e bacana do lavajatismo para o pântano miliciano do bolsonarismo.
LEIA MAIS – Aras diz que depoimento de Moro foi fraco e descarta denúncia contra Bolsonaro