Depois de Moro e do golpe, Cármen Lúcia quer a “pacificação” do país. Tarde demais. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 5 de dezembro de 2016 às 16:28
Carmen Lúcia e Michel Temer
Carmen Lúcia e Michel Temer

 

É curioso, para não dizer outra coisa, que a presidente do STF Cármen Lúcia use o mesmo termo empregado por Michel Temer para definir o remédio de que o país necessita atualmente.

Em seu discurso de abertura do encontro anual do Tribunal Superior Eleitoral, Cármen pediu união entre os juízes em hora de “extrema dificuldade”, para que eles elaborem metas e políticas públicas  “não com parcialidade, mas com os valores da democracia”.

“O Estado tem sido nossa única opção. Ou é a democracia ou a guerra. E o papel da Justiça é justamente de pacificar” falou. “Portanto, temos um compromisso direto de sermos responsáveis por trazer sugestões, propostas, projetos, fluxogramas, para que nós consigamos proporcionar um pouco de sossego ao povo brasileiro, no que seja nossa competência”.

Não se pode deixar que os cidadãos, por descrença, passem a praticar “justiça pelas próprias mãos, que nada mais é que exercer a vingança, que é a negativa da civilização, a não civilização”.

Muito pouco, tarde demais.

Não se ouviu nada parecido diante de violências institucionais, notadamente o impeachment. O que a ministra fez, assim que assumiu, foi uma blague, de resto completamente equivocada, sobre não querer ser chamada de “presidenta” do Supremo — uma maldade com Dilma quando esta já estava no chão.

Não se ouviu e não se ouve, também, esse tipo de admoestação enquanto o juiz Sérgio Moro e os herois da Lava Jato convocam para manifestações, atacando os outros poderes da República.

O nome de Moro foi gritado por milícias fascistas que invadiram a Câmara pleiteando “intervenção militar”. Bonecos com sua figura enfeitam protestos em que apresentadores de TV assumidamente jabazeiros instigam um público carregado de ódio a agredir políticos em restaurantes. (Em caso de dúvida, me refiro a Otávio Mesquita na Paulista).

Enquanto Moro vazava documentos, se manifestava fora dos autos, ministros eram presos em hospitais, Cármen ficou calada.

O STF e a Procuradoria Geral da República não mexeram um fio de cabelo para poupar Dilma, uma mandatária sabidamente honesta, julgada numa farsa por uma quadrilha.

O ex-colega de Cármen, Joaquim Barbosa, foi mais preciso e, por que não, justo: “Essa desestabilização empoderou essa gente numa Presidência sem legitimidade unida a um Congresso com motivações espúrias. E esse grupo se sente legitimado a praticar as maiores barbáries institucionais contra o País”.

A pacificação possível do Brasil, hoje distante, virá com a democracia — ela mesma, tão maltratada pela “Justiça”.