Nossos últimos dias em Melgaço foram um pouco prejudicados por uma diarréia forte em toda a equipe.
Primeiro foi o Thiago Carvalhaes, nosso camêra, que ficou mal, passou dois dias de cama, vomitando e com diarréia. Depois foi o Thiago de Luccia, mesmos sintomas. Aí eu que comecei a me sentir mal. Mesmo tomando muito cuidado com a água e com o que comíamos, não conseguimos nos manter bem de saúde até o fim.
No sábado, resolvemos voltar para Belém.
Nos despedimos dos amigos que fizemos, das pessoas que conhecemos e nos ajudaram, e pegamos uma lancha até Breves, onde esperamos três horas pelo navio da Amazon Star que nos levaria a Belém.
Breves é a “cidade grande” mais próxima. É para lá que os pacientes com problemas de saúde graves, que precisam de cirurgia ou exames mais específicos, são mandados quando o hospital de Melgaço não pode resolver.
Nós sentimos diferença no ritmo da cidade. Já estávamos habituados à calma de Melgaço. Breves tem carros, ruas asfaltadas, comércios maiores, crianças pedindo dinheiro nas ruas, o que não vimos por lá.
O navio estava lotado. Três andares com redes, mercadorias e até carros. Mas encontramos lugares para estender nossas redes.
Durante a noite foi complicado. Chovia muito, a água molhava as pessoas e também as malas no chão.
Os vizinhos de rede foram nos ajudando a passar o tempo. Ao nosso lado, havia dois irmãos com cerca de 60 anos, de Palmas (TO). Vinham de Roraima, onde tinham ido visitar um irmão que não viam há 54 anos.
Conhecemos também um argentino de 30 e poucos anos. Ele estava fazia quatro meses viajando de mochilão pela América Latina, e pretendia chegar a Natal. Gringos, indígenas punks, empresários, famílias voltando de férias, uma diversidade incrível de pessoas e histórias.
No meio da noite, a segurança nos acordou porque procurava homens que estavam roubando no navio e deviam estar escondidos em alguma rede. Eu estava deitada na minha rede com o computador e os HD’s, mas meu celular tinha deixado na mochila, logo embaixo. Fui checar e ele não estava lá. Vacilo de quem estava há sete dias imerso em Melgaço.
A cidade com o pior IDH do Brasil, talvez por ser toda pobre, não tem as características habituais das cidades maiores, como roubo, furto ou violência. Não vimos ninguém pedindo esmola.
A cidade tem dois mendigos, um homem e uma mulher, que estão sempre pela cidade, e só.
Os moradores comparavam Melgaço a outras cidades que eles vêem na TV, e acreditam que por ser pobre tem uma série de qualidades que as cidades mais ricas não tem. Segurança, por exemplo.
Mal chegamos a Belém, começamos o processo de decupagem do que filmamos.
Em breve o documentário estará pronto, e tenho certeza que será um material rico para a discussão com relação ao Programa Mais Médicos.
Agradeço aos colaboradores e leitores que acompanharam este diário. Agora é trabalhar na montagem do filme, para compartilhar com vocês essa experiência de descoberta que vivi ao me deslocar para Melgaço.