Sempre me impressionou uma passagem da vida de Dostoievski: a simulação de fuzilamento a que ele foi submetido pelo regime czarista da Rússia quando tinha cerca de trinta anos, em meados do século XIX.
Essa cena tenebrosa apareceria depois na obra de Dostoievski em dois romances: O Idiota e Recordações da Casa dos Mortos.
Dostoievski não era um revolucionário. Mas, jovenzinho, fazia parte – como coadjvante — de um círculo de intelectuais que queria reformar a velha Rússia.
Foi o suficiente para ele ser preso e ficar um ano numa prisão — a “casa dos mortos” — em que tudo que podia ler era a Bíblia.
Pensei em Dostoievski ao ler, hoje, que Dilma foi, como ele, vítima de uma encenação de fuzilamento. É uma demonstração de extrema força mental ela ter seguido adiante e chegar aonde está hoje, depois de ter torturas como o fuzilamento que ela não sabia que era de mentira.
E lembrei também de Jorge Escosteguy, um excelente jornalista que conheci no começo da carreira na Veja. Scot, como era tratado pelos amigos, chamava o comecinho da manhã – 6, 6 e meia – de “hora do fuzilamento”. Scot dizia, não sei com que grau de acuidade, que era naquela hora que os militares fuzilavam os “subversivos”.
Boêmio, bonitão com sua barba negra como uma jabuticaba, Scot uma vez estava indo dormir depois de uma noitada quando encontrou um amigo que já estava saindo para trabalhar. “Que é isso, já dando duro na hora do fuzilamento?”, perguntou. Foi esse amigo que me contou a história. Gostei tanto que incorporei a mim a expressão “hora do fuzilamento”.
Grande Scot, fuzilado na casa dos 50 por um coração que não suportou tanta extravagância e tanta generosidade.