José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil durante o primeiro governo Lula, comentou sobre o papel de Pablo Marçal nas eleições para a Prefeitura de São Paulo. Em entrevista à Folha, Dirceu afirmou que o ex-coach representa “um problema muito maior para a direita do que para a esquerda”. O ex-ministro também discutiu o surgimento de uma “nova direita”, que, segundo ele, se baseia no “fundamentalismo neopentecostal”.
Há dez anos, as forças de esquerda no Brasil venciam a sua quarta eleição presidencial seguida. Apesar do desgaste do mensalão e da Operação Lava Jato, elas pareciam invencíveis nas urnas. Hoje é a direita que parece ter essa força avassaladora. Ela veio para ficar?
Se você observa as eleições na França, nos EUA, na Alemanha, vê que o capitalismo vive hoje uma disputa entre as soluções da extrema direita e da direita. E isso está se desenhando no Brasil também.
Mas eu não creio que a direita veio para ficar.
A esquerda ressurgiu na França [nas eleições deste ano] e houve reação à violência da extrema direita na Grã-Bretanha também.
A liderança do Lula, que no fundo representa as forças políticas de esquerda no país, se expandiu [em duas décadas]. Nós vencemos cinco eleições [2002, 2006, 2010, 2014 e 2022], o que é um fato histórico mundial.
Só não vencemos a sexta [em 2018] porque o Lula estava preso em um processo político de exceção.
Mas a votação do [hoje ministro Fernando] Haddad [em 2018], que teve 32 milhões de votos naquelas condições, me deu a segurança de que havia ainda um período sob a liderança do Lula e, de certa forma, sob a hegemonia do PT.
Isso se confirmou em 2022.
Eu estou assistindo de camarote. O Marçal é um problema muito maior para a extrema direita do que para nós
Mas Lula só se elegeu em 2022 após formar uma frente muito ampla, que incluiu setores conservadores sem os quais não seria possível vencer a direta considerada mais radical.
Vamos lembrar que a extrema direita sempre teve expressão no país.
O crescimento do capitalismo brasileiro criou uma classe trabalhadora progressista, que votou no PTB de 1946 a 1964, no MDB progressista e nacionalista de 1974 a 1989 e no PT daquele ano em diante.
Mas uma parte dela também vota nos populistas de direita. Jânio Quadros, Fernando Collor e Jair Bolsonaro não venceram apenas com os votos da classe média e das elites do país. Eles tinham apoio popular.
Mas há uma nova direita que surgiu, não?
Sim. Essa direita que estamos vendo agora tem um elemento religioso, do fundamentalismo neopentecostal. E tem o elemento do liberalismo econômico, incorporado por setores das classes populares, que é anti-Estado, anti-imposto, e que o [Pablo] Marçal representa bem. Ele divide o bolsonarismo.
Divide e ameaça?
Eu estou assistindo de camarote [rindo]. Porque o Marçal é um problema muito maior para a extrema direita do que para nós.
Eles vão ficar divididos em 2026 porque a agenda dele não une a direita.
O Marçal vai correr por dentro. E o Bolsonaro tem uma liderança e um carisma muito forte também.
Mas, comparado ao Marçal, o Bolsonaro vira um bobo da corte.
Mas em que o Marçal, de fato, difere do bolsonarismo?
Ele é jovem. Ele veio da pobreza. Ele conhece quem vive na periferia.
O Bolsonaro não tem nada disso. O Bolsonaro era um sindicalista militar que defendia a agenda da ditadura. E que capturou uma agenda religiosa e da direita liberal, importando uma linguagem do conservadorismo de extrema direita, repetindo um pouco o trumpismo.
Já o Marçal é uma criação genuína do momento que estamos vivendo.
Ele vai ser candidato à Presidência da República. Mas vai ser uma liderança política sem partido? Ou vai ser adotado por alguma legenda? Neste sentido, ainda é uma incógnita. (…)
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