E então Caiado se transformou no guardião dos autistas

Atualizado em 13 de maio de 2015 às 22:24

 

Médico
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Num artigo recente, Demóstenes Torres definiu Ronaldo Caiado como “uma voz à procura de um cérebro”. Era difícil não lembrar dessa boa frase ao ver o senador do DEM na sabatina de Luiz Edson Fachin.

Sentado na primeira fileira, qual um CDF de um supletivo, ao lado de Aloysio Ferreira Nunes, a basta cabeleira grisalha, os óculos de aro preto, a gravidade empolada, Caiado desempenhou a contento o papel que se auto incumbiu.

Falou por 14 minutos quando o limite era 5, interrompeu colegas, fez o que se esperava dele. Parecia absorto com a montanha de papeis à sua frente. Volta e meia uma estafeta vinha lhe sussurrar alguma coisa importante ao ouvido. Acabou derrotado, dando um dos sete votos contra o sabatinado (o placar foi 20 a 7).

Por conta das chicanas, sua colega do PC do B do Amazonas, Vanessa Grazziotin chamou-o de “autista”. O plenário riu. Piada infeliz. No dia seguinte, Vanessa pediu desculpas. “Eu usei uma expressão inapropriada”, lamentou. “Então eu peço desculpas a esses familiares, peço desculpas ao Brasil por esse ato falho, porque afinal de contas nós somos seres humanos e sujeitos a qualquer falha”.

Caiado aproveitou a situação, porém, para operar uma metamorfose em si mesmo. “O debate sempre tem que ficar nas ideias e no respeito”, afirmou.

Nas redes sociais, ele brilhou. “A grosseria de Vanessa Graziottin é pra mim um elogio. Ela não tem sensibilidade nem respeito para compreender a inteligência dos autistas”, escreveu. “Reitero meu apoio, respeito, admiração e sensibilidade pelos autistas e seus familiares. Contem comigo”.

“Ajudei a aprovar a lei dos autistas. E, como médico, tenho respeito a todos eles e seus familiares. Bola fora da senadora Graziottin”. Caiado é ortopedista, tido como um ótimo cirurgião de coluna vertebral.

Essa enorme sensibilidade para com deficiências depende da hora e do freguês. Toda a compaixão não o impediu de sair nos protestos anti Dilma com uma camiseta amarela estampada com a imagem de uma mão com quatro dedos, manchada de petróleo. Uma alusão a Lula e à Petrobras, claro — mas sobretudo um monumento ao ódio e ao mau gosto, especialmente vindo de um médico.

“A única deficiência que Lula tem é de moral e de ética na política”, declarou RC sobre sua schadenfreude. A hipocrisia é uma homenagem que o vício presta à virtude.