Edição de ‘Frankenstein’ ilustrada por IA é desclassificada no Prêmio Jabuti

Atualizado em 10 de novembro de 2023 às 17:13
Edição de “Frankenstein” desclassificada por uso de IA. Foto: Reprodução

O Prêmio Jabuti desclassificou uma edição do livro “Frankenstein” que concorria na categoria Ilustração por ter imagens criadas por meio de inteligência artificial. A Câmara Brasileira do Livro (CBL), responsável pela premiação, divulgou um comunicado afirmando que o uso de ferramentas do tipo não está previsto nas regras.

“As regras da premiação estabelecem que casos não previstos no Regulamento sejam deliberados pela Curadoria, e a avaliação de obras que utilizam IA em sua produção não estava contemplada nessas regras”, afirma a CBL. A organização ainda prometeu debater a permissão do uso das ferramentas em próximas edições da premiação.

“A utilização de ferramentas de inteligência artificial tem sido objeto de discussão em todo o mundo, em razão dos princípios de defesa dos direitos autorais. Considerando a nova realidade de avanços dessas novas tecnologias, a organização do prêmio esclarece que a utilização dessas novas ferramentas será objeto de discussão para as próximas edições da premiação”, finaliza o comunicado.

Arte feita por inteligência artificial que ilustrava a edição do livro. Foto: Reprodução

André Dahmer, ilustrador e quadrinista, é um dos três jurados da categoria no Prêmio Jabuti e se manifestou sobre o assunto. Ele disse ter ficado surpreso com as “ilustrações primorosas” da edição do livro e relata que o livro creditava somente um ilustrador, Vicente Pêssoa, mas fazia referência ao Midjourney,  serviço de inteligência artificial que gera imagens a partir de descrições em linguagem natural.

“Não conheço os nomes de ferramentas de inteligência artificial, nem quero conhecer. A organização do prêmio, ao me enviar o livro, também desconhecia o nome desta ferramenta. Outro jurado, Baptistão, também não sabia que avaliava um trabalho híbrido”, diz Dahmer.

Ele defendeu o ilustrador e disse que não houve “má fé” no trabalho, já que citou o nome da ferramenta, mas apontou que “toda essa história carece de debate”. “Da minha parte, veria e julgaria o livro com outros olhos sabendo tratar-se de uma Obra híbrida, é claro”, prossegue.

Leia a avaliação de André Dahmer, feita antes da desclassificação da obra:

Fui um dos três jurados na categoria Ilustração do Prêmio Jabuti deste ano, que avaliava os semifinalistas. Frankenstein, ilustrado por Vicente Pessôa com auxílio de Inteligência Artificial, está agora entre os finalistas. Isso merece um fio.

Quando o Prêmio Jabuti me enviou 118 livros da categoria, saltou-me aos olhos ilustrações primorosas da luxuosa edição de Frankenstein.

Depois de avaliar todos os livros, em um trabalho de três meses, acreditei que o livro cumpria requisitos para estar entre os finalistas. Sei que ao menos um dos outros dois jurados, também.

Na CIP do livro, constava que a autoria da Obra era somente de Vicente Pêssoa. Foi nisso que me fiei para avaliar o trabalho. Porém, acima da CIP, havia referência da autoria creditada como “Vicente Pêssoa e Midjourney”.

Não conheço os nomes de ferramentas de inteligência artificial, nem quero conhecer. A organização do prêmio, ao me enviar o livro, também desconhecia o nome desta ferramenta. Outro jurado, Baptistão, também não sabia que avaliava um trabalho híbrido.

Toda essa história carece de debate. Sei dos limites éticos e jurídicos do uso de imagens que já existem para a produção de outras, “novas”. Em defesa do autor, no livro constava a coautoria de um robô. Então, não houve má fé no ato da inscrição.

É um problema complexo. Atualmente, galerias e museus já validam trabalhos feitos a partir de I.A. como genuínas Obras autorais.

Porém, como enxadrista, vi a discussão sobre o uso de I.A. na época em que máquinas começaram a derrotar Grandes Mestres, também a partir da memória de aberturas e jogos disputados por seres humanos anteriormente.

À época, ficou claro para todos que o xadrez seria jogado apenas entre seres humanos em torneios oficiais, salvo em eventos de mero entretenimento ou de teste das máquinas. Acho correto e justo.

Mais cedo, ao conversar com os organizadores para entender o ocorrido, citei a analogia com o xadrez, e recomendei que abram uma categoria de ilustração e literatura com auxílio de I.A. já no próximo ano.

Se o Prêmio Jabuti vai ou não desclassificar a Obra, isso saberemos em breve. Da minha parte, veria e julgaria o livro com outros olhos sabendo tratar-se de uma Obra híbrida, é claro.

Vamos aguardar a decisão dos organizadores. Para as torcidas contra e a favor, peço que debatam com serenidade aqui nos comentários. É uma discussão importante e muito pertinente para acabar em insultos. Um abraço para todos vocês.

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