Originalmente publicado no BLOG DO JEFERSON MIOLA
Por Jeferson Miola
Está claro que pelo menos até março, na melhor das hipóteses, o Brasil terá somente 10,8 milhões das 300 milhões doses de vacinas necessárias para imunizar o contingente da população brasileira a ser vacinado. Ou seja, apenas 3,6% do total necessário!
Em alguns dias, o ufanismo eufórico do último domingo [17/1] com a autorização das vacinas dará lugar a um choque de decepção e a uma revolta com a falta de vacinas.
O contraste do Brasil-pária com o mundo é gritante: hoje, governos de quase 60 países avançam de modo incremental na imunização das respectivas populações nacionais.
Está claro, também, que a desproteção vacinal da população brasileira – fato absolutamente inédito desde o histórico pré-SUS de enfrentamento de epidemias – é consequência direta dos desatinos, incompetências e insanidades sanitárias e diplomáticas do governo militar de Jair Bolsonaro.
Está fartamente documentado que o genocídio de Manaus não foi acidente ou tragédia, mas sim um crime derivado da escolha deliberada do general-ministro da morte que, mesmo conhecendo com suficiente antecedência o nível crítico do estoque de oxigênio medicinal, atuou macabramente e apenas contemplou o genocídio humano por asfixia.
Seria condescendência caracterizar esta postura criminosa “apenas” como evidência da incompetência e despreparo dos militares no exercício de funções tipicamente civis, porque há deliberada omissão e negligência diante de alertas prévios e pedidos de socorro.
É crescente, na percepção do senso comum, o nexo de responsabilidade do governo militar com o descalabro e com a hecatombe no país. Com um general-ministro do serviço ativo do Exército à frente do ministério da saúde, é incontornável a associação das Forças Armadas com os crimes contra humanidade em curso no Brasil.
Esta é a conjuntura mais desfavorável para Bolsonaro e seu governo militar. Além da brutal perda de legitimidade, aumenta seu isolamento na sociedade.
Bolsonaro e os militares reagem a isso com ameaças de escalada ditatorial, como ficou evidenciado na absurda declaração dele sobre o poder das Forças Armadas decidirem se o país terá democracia ou ditadura, e na carta-intimidação do Comandante do Exército a um veículo da Globo, que silenciou a respeito.
Menos de 24 horas depois destes dois episódios ocorridos na 2ª feira, 18/1, o Procurador-geral da República [PGR] Augusto Aras somou vozes à truculência oficial contra a Constituição e o Estado de Direito.
Farejando o “agravamento da crise sanitária nos próximos dias” e o consequente aprofundamento das dificuldades para o governo com a ameaça de impeachment, Aras ameaçou em nota oficial [19/1] que “o estado de calamidade pública é a antessala do estado de defesa”.
Não bastasse esta espantosa postura conspirativa e de intimidação com o estado de defesa, Aras pode ter cometido crime de responsabilidade ao se esquivar da obrigação legal e constitucional de investigar crimes cometidos por Bolsonaro e seus ministros.
O conflito político subiu de patamar e escalou muitos degraus nos últimos dias. O horizonte imediato é de aceleração da crise de legitimidade do Bolsonaro e dos militares. Cresce, por isso, a adesão à palavra-de-ordem “Fora Bolsonaro” e à campanha pelo impeachment do genocida.
Setores da oligarquia que derrubou Dilma, corrompeu o Estado de Direito e fraudou o sistema de justiça para eleger Bolsonaro, hoje começam a se insurgir contra a serpente que criou.
A luta pelo impeachment ganha força, amplitude e vigor. Para sobreviver ao impeachment, Bolsonaro, seus militares e seus capangas nas instituições abrem guerra contra a democracia e o Estado de Direito.
A luta pelo impeachment assume uma relevância ainda maior, e se combina com a luta contra o genocídio, pela vacina já e pela democracia.
A bandeira do impeachment precisa mobilizar dezenas de milhões de brasileiros, porque só a mobilização popular é capaz de impedir o aprofundamento do golpe e a evolução para uma ditadura no Brasil.