Publicado na Carta Maior
Boa noite a todos e a todas. Tivemos recentemente uma reunião com todos os governadores, na qual analisamos a situação em cada província e no país de uma forma geral. Vocês sabem que, nesta manhã, também tive uma reunião com o ministro da Saúde (Ginés González García), e outros colaboradores, o ministro do Interior (Eduardo de Pedro), o Chefe de Gabinete (Santiago Cafiero) e com a comunidade científica, um grupo de oito especialistas, que consulto habitualmente, me deram sua impressão de como a quarentena evoluía, e me plantearam o que achavam que deveríamos fazer.
Vocês sabem que estamos sendo muito ousados em nossas ações. Na verdade, somos um caso único no mundo que iniciou uma quarentena plena assim que foi decretada a pandemia. Nenhum outro país fez isso, então estamos experimentando essa situação, e vendo os resultados. Agora, a verdade é que os resultados iniciais são bem interessantes. São bons, e nos estimulam a seguir por este caminho.
Quando decidimos, há 10 dias, pela quarentena obrigatória – antes havíamos decretado a suspensão das aulas, e a diminuição do ritmo de trabalho no setor administrativo –, nos perguntávamos se os argentinos seriam capazes de ficar em suas casas, e a verdade é que quero dizer a todos e a todas que estou muito feliz sobre como nos portamos como sociedade. Mais de 90% dos argentinos cumpriram cabalmente com a quarentena que nós determinamos. Ficaram em suas casas e se protegeram. Protegeram seus filhos e também os idosos, que são, precisamente, os que correm mais riscos.
Houve uma parte da sociedade, que está no 10% restante, que foi trabalhar. Falamos de enfermeiras e enfermeiros, médicos e médicas, homens e mulheres das forças de segurança e das Forças Armadas, aqueles que transportam alimentos, os que transportam remédios, os que atendem em armazéns, em supermercados, em farmácias… e há um número muito baixo de gente que não cumpriu (com a quarentena).
E àqueles que não cumpriram, aconteceu aquilo que dissemos que iria acontecer. Nós dissemos que seríamos muito rigorosos com a quarentena, mas basicamente porque estamos preocupados com a saúde das pessoas, e não queremos que ninguém a ponha em risco e aumente esse risco de contágio das pessoas.
Por isso eu digo que, depois de 10 dias, devemos estar muito felizes como argentinos. Porque fomos capazes de ficar em nossas casas e cumprir o compromisso que eu pedi que cumpríssemos, que é o de nos cuidar. Porque se nos cuidamos, cada um de nós, também estamos cuidando cada um dos argentinos. Eu dizia que as forças federais e provinciais controlaram, nesta semana, entre 21 e 27 de março, cerca de 568 mil pessoas que estavam transitando, e a 218 mil veículos. Foram apreendidos 3778 veículos e 23111 infratores, que serão processados.
Vocês viram longas filas nos pedágios, e alguns talvez tiveram que suportar alguma demora por isso. Mas, o mais importante é que a imensa maioria das pessoas cumpriu com o que foi determinado, e somente um grupo reduzido de pessoas se achou mais vivo que outros, e agora vão pagar as consequências, privados de um automóvel que está apreendido e enfrentando um processo penal que ficará em seus antecedentes.
Nós, argentinos, não podemos colocar em risco a saúde, e devemos cumprir com a lei. Isso é tudo o que estamos fazendo. Não estamos sendo nem arbitrários nem ferozes. Estamos simplesmente explicando aos argentinos o que devemos enfrentar, e a necessidade de que nos cuidemos.
Está é uma pandemia realmente assustadora, por causa da velocidade com a que cresce. Nós, como eu disse desde o primeiro dia, decidimos por uma quarentena para que o crescimento fosse mais lento, para nos dar tempo para nos que nos preparemos, para quando chegue o pior momento, e enquanto isso, que nos ajude a nos prover de insumos para poder enfrentar a pandemia. E também para que nos permita esperar para ver se conseguimos um medicamento ou a vacine que termine com tudo isso, e nos ajude a vencer a batalha contra o coronavírus.
Vocês sabem que, por todas as medidas que nós tomamos, fomos escolhidos pela OMS (Organização Mundial da Saúde) como um dos 10 países que poderão provar experimentos medicinais, tratamentos para resolver o problema do coronavírus. Isso para nós é muito importante, porque mostram também que, como sociedade, nós nos adiantamos ao problema, assumimos o compromisso da quarentena, e isso nos deu a confiança da comunidade internacional científica, para que sejamos um dos 10 povos, das 10 sociedades que serão privilegiadas na busca da vacina ou da medicação mais importante.
Em todo este tempo de quarentena, não estivemos de braços cruzados. Na semana passada, tivemos uma comunicação com os líderes do mundo. Somos parte do G20. Lá, eu planteei minha preocupação pelo que está acontecendo. Disse esperar que isto sirva de lição para a humanidade. Espero que a humanidade deixe de ser tão miserável e tão egoísta. Que ponha seu foco em agir em favor dos muitos que passam necessidades, e que foram esquecidos pelo desenvolvimento. Me preocupei de estabelecer uma comunicação permanente com os líderes do mundo. Também com os líderes científicos, com a comunidade científica. Com os líderes da OMS.
Também tivemos reuniões com os setores que mais se envolvem em cuidar e proteger aqueles mais vulneráveis. Me reuni com padres das favelas, com a Igreja, com os padres das opções pelos pobres. Estou em permanente contato com as organizações sociais, e com os prefeitos da Grande Buenos Aires, aos quais eu agradeço imensamente pela forma com a qual se envolveram e fizeram com que a quarentena fosse cumprida, e cuidaram dos seus cidadãos dessa forma.
Agora, chegamos a este ponto, e enfrentamos uma decisão: o que fazemos? Então, tomei a decisão de prologar a quarentena até o fim da Semana Santa. Esta é a recomendação que os especialistas me fazem. O que vamos conseguir com isso? Seguir controlando a transmissão do vírus. Mas, além disso, vamos conseguir algo mais.
Vejam, todos os dados dizem que o vírus tem um período de incubação de entre 10 e 14 dias. Prolongando a quarentena, faremos com que o ciclo de desenvolvimento do vírus no corpo humano se complete duas vezes. Dois ciclos. Assim, teremos dados mais claros de como se incuba a doença e como podemos trabalhar sobre aqueles que efetivamente tiveram o vírus, incubaram a doença, e podemos atendê-los adequadamente.
Para mim, esta não é uma informação menos importante. É uma informação muito entusiasmante. Porque teremos tempo, também, para ver como se incuba a doença no corpo da nossa gente, e assim, poder atendê-la adequadamente.
Por isso, o isolamento social, preventivo e obrigatório que decretei há 10 dias será prolongado até o fim da Semana Santa. É um longo caminho, que teremos que enfrentar, como eu sempre digo. Isto é como uma guerra contra um exército invisível, que nos ataca em lugares onde às vezes não esperamos. Mas eu estou certo de que isto tem muito sentido. E também estou certo de que, se continuamos com esta estratégia, os resultados serão muito favoráveis.
Se vocês revisam como é a curva de crescimento na nossa quarentena, e a comparam com a curva de crescimento da doença naqueles países que iniciaram tardiamente a quarentena, perceberão o quanto nós ganhamos. Não foi o governo que ganhou, foi toda a sociedade argentina que ganhou. Por isso, eu espero que estejamos todos felizes e satisfeito daquilo que fomos capazes de alcançar. E que sigamos sendo capazes.
Também temos que atender a situação dos bairros mais pobres que existem na Argentina. Para isso, nós destinamos não somente recursos econômicos, para melhorar a situação daqueles que recebem auxílio do Estado, mas também recursos para garantir a chegada dos alimentos a todos esses lugares. Vamos seguir fazendo isso.
A todos eles eu peço duas coisas, a todos os companheiros, irmãos, que vivem em bairros humildes: peço a vocês que respeitem a quarentena, porque o risco também existe aí, e que cuidem muito dos seus idosos. Nós precisamos garantir que eles não se contagiem, os velhinhos que vivem nesses bairros. É um pedido que eu lhes faço, porque está nas suas mãos poder fazê-lo, respeitando a quarentena. A todos chegarão os recursos e os alimentos que sejam necessários enquanto durar a emergência. O Estado vai estar mais presente que nunca. Creio que todos já percebemos a importância do Estado nesta instância.
Estamos seguindo o plano tal qual foi o nosso propósito desde o começo. Primeiro, buscando que a curva de contágio seja lenta. Para que nós possamos nos preparar e, depois, poder atender todos os casos que se apresentarem. Segundo, deixando que os dias nos permitam ver a capacidade que necessitamos de equipamentos, de vestimentas, de capacitação para o pessoal médico e de enfermagem, para que tudo dê certo, e estamos ganhando tempo e aproveitando isso muito bem. Minha gratidão aos médicos e médicas, às enfermeiras e enfermeiros, insisto, aos homens e mulheres das Forças Armadas e das forças de segurança, que vem trabalhando com um empenho que realmente nos obriga a estar em dívida com eles. Portanto, obrigado por tudo isso.
Temos que enfrentar um problema que não é só da Argentina, senão do mundo inteiro. Hoje, falei com o presidente da Espanha, e me comentou que eles têm exatamente o mesmo problema que é o da escassez global para a aquisição de insumos críticos. Estamos trabalhando muito para conseguir o que nos faz falta, e estamos desenvolvendo uma solução para a questão dos respiradores artificiais construídos na Argentina, e algum projeto que nos pode ajudar a resolver esse problema também, com empresários do setor automotriz da Argentina. Temos confiança de que poderemos tornar isso possível.
Eu peço a todos que entendam que estamos vivendo um momento de exceção. E que, na verdade, não devemos cair no falso dilema de que é a saúde ou a economia. Uma vez eu tive que assumir um posto no governo junto com Néstor Kirchner e encarar um país que, no ano anterior, teve uma queda do PIB de mais de 11%. A partir daí nós trabalhamos e levantamos a economia. Uma economia que cai sempre se levanta, mas uma vida que termina não se levanta mais, e eu quero ter isso muito claro, mas preciso que todos entendam que não estamos descuidando a economia.
Estamos fazendo muitas coisas pela economia. Não somente garantindo o dinheiro para os setores mais empobrecidos, o que efetivamente o fazemos, e estamos orgulhosos de fazê-lo, porque eles precisam, mas também ajudando as pequenas e médias empresas. Nós tomamos uma série de medidas nesse sentido.
Criamos a renda familiar de emergência, isentamos muitas atividades de pagamento de impostos, criamos créditos de emergência para as pequenas e médias empresas. Nós garantimos, para todas as empresas, uma folha salaria inteira como crédito. E as empresas podem dispor desses recursos com uma taxa de 24%. Na verdade, esse é um esforço enorme do Estado nacional, e que acreditamos que é absolutamente necessário. Na reunião, os governadores me pediram mais flexibilidade com alguns créditos, e eu vou falar amanhã com o presidente do Banco Central (Miguel Ángel Pesce) para ver o que podemos fazer.
A verdade é que fizemos tudo o que era necessário para enfrentar também este momento econômico. Por isso, como fizemos um esforço muito grande, não é gratificante ver que alguém despede um empregado. Por isso, assim como serei muito duro com que rompe o acordo de preços, e os preços máximos, ou especula em qualquer armazém perdido da Argentina, tentando subir os preços e conseguir um lucro maior em um momento de extrema necessidade da sociedade argentina, serei duro com eles, e serei duro também com os que despedem pessoas. Por que se essa pandemia pode nos ensinar algo é a regra da solidariedade. Aqui, ninguém se salva sozinho. Disse isso outro dia no G20 e repito agora, e também repito com alegria porque é o pensamento do Papa (Francisco). Mas, na verdade, não é só o pensamento do Papa, ou o pensamento do Alberto Fernández, é uma regra moral que nós temos como sociedade.
Não podemos, em semelhante crise, desamparar alguém, deixando-o sem trabalho. E volto a repetir: o que se trata aqui, para muitos empresários, é de ganhar menos. Não de perder. Então, rapazes, chegou a hora de vocês ganharem menos. E isso eu vou fazer respeitar.
Assim, continuamos pensando em todos os argentinos. Congelamos aluguéis, suspendemos execuções hipotecárias e desocupações, congelamos as prestações de créditos hipotecários, colocamos um teto aos preços de produtos de primeira necessidade… estamos fazendo tudo o que temos que fazer. Não o governo, a sociedade argentina. Portanto, eu peço, com a alegria de que, nestes 10 dias, a estratégia está funcionando: sigam nesse caminho, com esta alegria, a alegria que dá saber que estamos fazendo as coisas bem, com esta mesma lógica, com esta mesma sensação, com esta mesma vontade, enfrentemos próximos dias de quarentena que temos pela frente. Estaremos fazendo algo a favor de nós mesmos, a favor dos que nós amamos e a favor da Argentina. Estaremos nos preservando como sociedade.
Eu os convido para que trabalhemos juntos, porque a Argentina é a nossa casa comum. E nós temos que cuidá-la muito. Agradeço a vocês todo o esforço que fizeram, e peço novamente para que façam o esforço que ainda falta. Recordem que este é um caminho que está começando. Ainda falta muito pela frente, e não temos nenhum resultado garantido. O que sabemos é que, se cumprimos com certas coisas, a dor será menor.
Muito obrigado a todas e a todos por seu tempo.
*Tradução de Victor Farinelli